Kim Song, embaixador da Coreia Popular na ONU, anunciou suspensão da desnuclearização no diálogo com os EUA.

O embaixador da Coreia Popular (Norte, socialista) na ONU, Kim Thae Song, anunciou em comunicado no sábado (7) que seu país retirou a desnuclearização da pauta de negociações com os EUA e que agora não faz sentido “longas conversas” com Washington, cujo governo “está concentrado em sua agenda política interna nas eleições presidenciais de 2020” – além, claro, embora o diplomata haja deixado de citar, do processo de impeachment.

Desde abril, após o fracasso da segunda cúpula Kim Jong Un-Donald Trump, no Vietnã, o líder norte-coreano definira o final do ano como prazo limite para romper o impasse causado pela intransigência norte-americana – cujos principais pontos consistem na absoluta recusa de aliviar as sanções, especialmente as que atingem drasticamente a população civil, e na exigência de desarmamento unilateral nuclear de Pyongyang.

Prazo que foi reiterado em outubro em Estocolmo, quando os negociadores norte-americanos chegaram de novo de mãos vazias. Em um gesto de boa vontade, em julho Kim havia se reunido na zona desmilitarizada com Trump.

A declaração – que o jornal El País considerou “um soco na mesa” – ocorre também em meio a um tiroteio verbal, cuja iniciativa partiu de Donald Trump, na já célebre cúpula da Otan em que virou alvo de chacota dos parceiros de aliança.

Questionado por jornalistas sobre o impasse com Pyongyang, Trump voltou ao tempo em que tentara apelidar – como é seu hábito, em relação a qualquer oponente – o presidente Kim de “homem foguete”, acrescentando ainda que os EUA poderiam usar “força militar” contra a Coreia do Norte.

A pergunta tinha como referência a advertência, feita nesse mesmo dia pelo vice-ministro da Relações Exteriores norte-coreano, Ri Thae Song, de que “caberia inteiramente aos EUA que presente de Natal escolherá”.

O troco de Pyongyang ao “rocket man” não tardou, com a agência de notícias norte-coreana retomando a qualificação de Trump, dada em 2017, como “dotard”, um termo do inglês arcaico, cuja tradução aproximada é “velho gagá” ou “senil”. Agora, com Pyongyang assinalando “a recaída na senilidade do senil”.

Na declaração deste sábado, o embaixador Kim destacou que o “diálogo sustentado e substancial” que os Estados Unidos estão pedindo é um mero “truque para ganhar tempo”, enquanto se concentra em sua agenda política interna nas eleições presidenciais de 2020.

“Diálogo sustentado e substancial” alardeado como remendo ao estrago já feito, e com a atenuação da crise na península coreana e o diálogo com Kim sendo praticamente o único ponto positivo, para a campanha à reeleição no próximo ano, de uma política externa caracterizada por rasgar tratados cruciais e desencadear sanções, intervenções e guerra comercial.

A intransigência quanto a aliviar parcialmente as sanções draconianas tem o significado claro de que Washington ainda não desistiu de sua estratégia genocida de matar de fome o povo coreano, devastar a economia e fazer o país cair de joelhos.

Passado um ano e meio, Washington segue sem cumprir sua parte no protocolo de intenções assinado na primeira cúpula entre Kim e Trump, em Singapura, cujo princípio era a criação de uma atmosfera de confiança, através de concessões mútuas, passo a passo, para abrir caminho para a assinatura definitiva de um acordo de paz (o armistício está em vigor desde 1953), normalização das relações e desnuclearização de toda a península coreana.

Desde o início, Pyongyang descartou qualquer desarmamento nuclear unilateral e rechaçou prontamente provocações, como a do então conselheiro-chefe de Segurança Nacional, o maníaco de guerra John Bolton, de “desarmamento nuclear pelo modelo líbio”.

A duras penas, vem sendo mantida a moratória de lançamento de mísseis de longo alcance e de testes nucleares, pela Coreia Popular, e de grandes manobras militares no sul, pelos EUA.

Da sua parte, a Coreia Popular suspendeu testes e destruiu instalações de teste, além de avançar muito na reconciliação intercoreana. Rússia e China apoiam, no Conselho de Segurança da ONU, o alívio das sanções.

Na semana passada, tuitada de Trump sinalizando outra cúpula já merecera um aviso de Pyongyang: “não estamos mais interessados em conversas que não tragam nada para nós”. “Como não temos nada em troca, não ofereceremos mais ao presidente dos EUA algo de que possa se vangloriar” como um feito de seu governo, assinalou o ex-vice-ministro das Relações Exteriores, Kim Kye Gwan.

Washington só no último minuto manteve em dezembro a moratória de exercícios militares no sul (Vigilant Ace), após fortes protestos de Pyongyang, que os consideram “provocação” e ensaio de invasão.

Respondendo à declaração de Song, Trump disse “vamos ver” e acrescentou que “ficaria surpreso se a Coreia do Norte agisse hostilmente” – numa total inversão de onde é a fonte de “hostilidade”.

Na quinta-feira, durante a visita do chanceler chinês Wang Yi a Seul, o presidente do Sul, Moon Jae-In, pediu a ajuda de Pequim para o estabelecimento de uma era de paz duradoura e desnuclearização completa na península coreana, processo que, apontou, está numa “encruzilhada”. Ele defendeu os três princípios de paz e desnuclearização na península coreana – “guerra inaceitável, segurança mútua e prosperidade compartilhada” – e pediu apoio dos chineses para a proposta de transformar a DMZ em uma zona de paz internacional.