O secretário interino da Marinha, Thomas Modly, apresentou sua renúncia na terça-feira (7), em meio ao clamor crescente por sua demissão, tanto no Congresso dos EUA quanto nos meios militares.

O repúdio geral – com exceção do presidente Trump – à exoneração do capitão Brett Crozier do comando do porta-aviões nuclear USS Theodore Roosevel, por alertar sobre o surto da Covid-19 a bordo e pedir medidas urgentes e apropriadas para isolar e tratar da tripulação, só aumentou após Modly ir até a embarcação após sua saída para chamá-lo de “estúpido demais” ou “ingênuo” e o acusar de “trair” a Marinha.

“Esta manhã, aceitei a demissão do senhor Modly”, tuitou o secretário do Pentágono, Mark Esper. “Nomeio o vice-secretário do Exército, Jim McPherson, como secretário interino da Marinha”, acrescentou.

Modly, um ex-consultor altamente pago da PriceWaterhouseCoopers, se tornara Secretário da Marinha interino em novembro passado, após Trump anular uma ordem do então Secretário, Richard Spencer, de expulsar o suboficial da força especial Seal, Edward Gallagher, acusado por seus próprios homens de torturar e matar um adolescente e atirar em civis aleatoriamente no Iraque em 2017. Spencer acabou se demitindo.

Como registrou a Newsweek na segunda-feira, mais de 250 mil pessoas assinaram uma petição do Change.org pedindo à Marinha dos EUA que restabelecesse Crozier no comando do porta-aviões.

Na manhã de terça-feira, já eram 230 os marinheiros do porta-aviões que haviam testado positivo para o coronavírus – incluse o próprio Crozier.

A tripulação acolheu Modly com os gritos de “vá para o inferno” e “Ele [Crozier] estava tentando nos ajudar”. Na véspera, Crozier foi calorosamente aplaudido e teve seu nome cantado pela tripulação em massa ao deixar o porta-aviões.

O discurso de Modly foi gravado por um ou mais marinheiros e vazou para a imprensa. Na segunda-feira, o interino inicialmente defendeu seu discurso, mas no final do dia ele havia emitido um suposto “pedido de desculpas” a Crozier, sem deixar de voltar a insinuar que o capitão “enviou seu e-mail alarmante” com a intenção de colocá-lo “em domínio público”.

Vários oficiais militares da reserva, incluindo o ex-chefe do Estado Maior Conjunto sob George W. Bush e Barack Obama, almirante Mike Mullen, contestaram publicamente o afastamento de Crozier.

“Estou chocado com o conteúdo do discurso de [Modly] à tripulação”, disse Mullen ao New York Times . Ele basicamente minou completamente, durante toda a situação do TR [Theodore Roosevelt], a liderança uniformizada da Marinha e a liderança militar em geral”.

O general do Exército (R), Barry McCaffrey, tuitou que “o Secretário da Marinha interino deve se demitir”. E acrescentou: “Este é o pior julgamento possível por um oficial de defesa. Sinal terrível para os marinheiros”.

No Congresso, da presidente da Câmara, Nancy Pelosi, ao presidente da Comissão de Serviços Armados, Adam Smith, foram muitas as declarações de repúdio a Modly. O ex-vice-presidente Joe Biden, provável candidato democrata a presidente, também rechaçou o ataque a Crozier, bem como o senador Richard Blumenthal.

Os jornais Wall Street Journal e New York Times desmentiram as acusações – inclusive de Trump – de que a decisão de fazer a escala no Vietnã fora do capitão Crozier, afirmando que foi tomada nos mais altos escalões, dentro da política de aprofundar alianças na região para conter a China. O surto começara após essa escala em Da Nang.

Na carta que acabou vazada pelo jornal San Francisco Chronicle,  o capitão Crozier advertiu que o plano de seus superiores imediatos eram ‘insuficientes” para “alcançar a erradicação do vírus em qualquer linha do tempo” e que em um navio de guerra não existe a possibilidade de “atender às normas de quarentena”.

“Não estamos em guerra. Marinheiros não precisam morrer. Se não agirmos agora, não conseguiremos cuidar adequadamente de nosso bem mais confiável: nossos marinheiros”, enfatizou.

O chefe de operações navais, almirante Michael Gilday, e chefe do Estado Maior Conjunto, general Mark Milley, que buscavam compor a situação por meio de uma investigação formal sobre a questão, acabaram sendo informados da “notícia de última hora” por Modly: “Trump quer que ele seja demitido”.

Enquanto isso, a pandemia segue se espraiando entre os militares norte-americanos. Na terça-feira, 1.521 militares haviam testado positivo. Já aconteceu a primeira morte: um soldado da Guarda Nacional, de Nova Jersey.

A Marinha foi a força mais atingida, com 460 casos até terça-feira. O Exército tem 361 casos, a Força Aérea 322 e o Corpo de Fuzileiros Navais 78. Na Guarda Nacional, 314 testaram positivo para a Covid-19. O Exército anunciou segunda-feira que está suspendendo por duas semanas todos os deslocamentos de recrutas para treinamento básico.