Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom-ABr

O governo anunciou na quarta-feira, 24, por meio de medida provisória (MP 889), a liberação de saques do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS).
Entre as medidas incluídas no projeto está a criação da regra “saque-aniversário”, segundo a qual o trabalhador poderá optar, a partir de abril do ano que vem, por fazer retiradas anuais no mês do seu aniversário da conta do Fundo de Garantia.
No entanto, o trabalhador que optar por essa modalidade perderá o direito ao “saque-rescisão”, nome atribuído ao saldo ao qual o trabalhador tem direito em caso de demissão sem justa causa.
Atualmente, quem é demitido sem justa causa tem direito a sacar integralmente todos os valores depositados em sua conta. É o que garante estabilidade ao trabalhador pelo tempo que está sem emprego.
Com as mudanças, o trabalhador pode perder esse direito se preferir realizar os saques anuais. A medida, anunciada em um cenário de crise aguda em que há 13 milhões de desempregados, previsões para o Produto Interno Bruto (PIB) abaixo de 1% este ano, e 63,4% das famílias endividadas – serve apenas para ludibriar os trabalhadores.
Isso porque passa a ideia de que a liberação do saque irá desapertar a corda do pescoço em que se encontram milhões de pessoas, quando na verdade visa deixar o trabalhador ainda mais no sufoco no momento em que perde o seu emprego.
“Você fica anos empregado e no momento que mais precisa, quando fica sem salário, o valor fica preso? A medida também é muito ruim a longo prazo, porque vai tirar do mercado valores bem altos em troca de pequenos saques anuais”, analisa o advogado trabalhista Jorge Mansur.
O trabalhador que entrar nessa modalidade poderá voltar atrás de acordo com as regras. Mas, terá que cumprir uma carência de dois anos. Ou seja, o trabalhador só terá direito a sacar o saldo dos valores depositados na conta do FGTS a partir do 25º mês.
Além do “saque-aniversário”, o governo liberou o saque de até R$ 500, a partir de setembro, e até março de 2020, permitido a todos os trabalhadores com contas ativas ou inativas do FGTS.
Na opinião de sindicalistas e especialistas, além de que pouco ou nada vai interferir na melhora do quadro econômico, a medida vai dilapidar uma reserva que é do próprio trabalhador e esvaziar recursos do financiamento da habitação, saneamento básico e obras de infraestrutura, que têm investimentos do FGTS.
“Se liberar recursos de contas ativas, o saldo do Fundo vai cair e, no caso de demissão, o trabalhador terá menos a receber”, afirma o presidente do Sindicato dos Trabalhadores da Indústria da Construção Civil, Antonio de Souza Ramalho, o Ramalho da Construção, em entrevista à Agência Sindical.
Segundo o sindicalista, se os recursos do Fundo fossem usados no financiamento de habitação popular, por exemplo, aí sim, haveria geração de empregos e impactos na economia.
“A liberação correta do FGTS reduziria em torno de 12% o déficit habitacional no país. Além de gerar empregos formais, esse resultado alimentaria o próprio Fundo de Garantia, através dos recolhimentos mensais”, diz.
Como afirma o presidente do Sindicato da Indústria da Construção Civil do Ceará (SindusCon-CE), André Montenegro, “hoje, o maior financiador da construção civil é o FGTS, mas se o Fundo é usado para impulsionar o consumo, a medida acaba com a construção civil”.
Para ele, “o setor da construção civil movimenta o Brasil, gerando empregos de forma dinâmica e rápida. Impulsionar o consumo traz um impacto apenas pontual”.
Para o economista André Paiva, integrante do grupo de pesquisa em Desenvolvimento Econômico e Política Econômica da PUC-SP, “com a conjuntura atual de elevado desemprego e endividamento em que as famílias estão, os recursos que serão sacados vão ser destinados, em grande parte, para quitar dívidas e para consumo”.
“Isso vai ter um impacto para a economia, mas é um impacto localizado, pontual. Muito aquém do que precisamos para reativar a atividade econômica”, afirma.
O economista lembra que Temer, em 2017, liberou as contas inativas do FGTS e que praticamente nada mudou.
“Não foi suficiente para rearticular cadeias produtivas, fazer com que as empresas retomassem projetos de investimentos e que realmente tivessem uma retomada de nível de atividades consistentes”, diz.