Disparidades sociais no acesso à saúde se revelaram com mais intensidade na pandemia

A expectativa de vida nos Estados Unidos caiu em um ano no primeiro semestre de 2020 – a maior queda desde a 2ª Guerra Mundial – e retrocedeu ao patamar de 2006, de acordo com estimativas divulgadas pelos Centros de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) na quinta-feira.

Foi a maior queda desde a Segunda Guerra Mundial, quando a expectativa de vida caiu 2,9 anos entre 1942 e 1943, registrou Elizabeth Arias, uma das autoras do relatório.

“O declínio na expectativa de vida no primeiro semestre de 2020 é uma aberração das mudanças na expectativa de vida de ano para ano durante as últimas duas décadas”, acrescentou a pesquisadora.

Essa tendência, exacerbada durante a pandemia, já vinha se pronunciando muito antes e está relacionada com a falta de acesso pleno ao sistema de saúde. Mary T. Bassett, ex-comissária de saúde da cidade de Nova York e professora de Saúde e Direitos Humanos na Universidade Harvard, disse que, a menos que o país resolva melhor a desigualdade, “podemos ver a expectativa de vida nos Estados Unidos estagnar ou declinar por algum tempo”.

Segundo Bassett, o índice nos Estados Unidos começou a ficar atrás dos de outros países desenvolvidos a partir da década de 1980, uma divergência que intrigou os pesquisadores.

Uma teoria para isso é que as crescentes disparidades econômicas também afetaram a saúde dos americanos. As condições de vida que levaram a piores taxas da Covid-19, como moradias superlotadas e proteção antivírus inadequada para trabalhadores de baixa renda, só vão agravar essa decorrência, explica a professora.

As estatísticas demonstram que negros e pessoas de origem hispânica estão contraindo o vírus em proporções muito mais elevadas que outros norte-americanos, uma vez que a pandemia tem exacerbado as desigualdades já anteriormente inerentes ao sistema de saúde norte-americano, com poucos recursos investidos em saúde pública.

“Elas reafirmam questões há muito colocadas em torno das disparidades atingindo populações vulneráveis”, afirmou a administradora do Medicare, Seema Verma, acrescentando que “raça e etnia estão longe de serem os únicos fatores nesta história”.

Em outas palavras, além da confirmação pela análise do Medicare de que os negros e latinos arcam com o maior peso em termos da devastação da pandemias, há mais detalhes a acrescentar. “O grupo coberto pelo Medicare – ou seja os norte-americanos mais pobres, particularmente os mais idosos, os acima de 65 anos – são considerados os mais vulneráveis ao coronavírus”.

Embora as estimativas sejam provisórias e não reflitam todos os efeitos da pandemia Covid-19, o CDC disse que estava publicando dados provisórios pela primeira vez para avaliar o efeito do excesso de mortes em 2020. O excesso de mortes é a diferença entre o número de mortes esperadas e o número real.

Segundo o CDC, as disparidades raciais e étnicas nas taxas de mortalidade pioraram durante o período, disse o CDC. As estimativas representam o número médio de anos que um bebê viverá com base nas taxas de mortalidade do período especificado, entre janeiro a junho, neste caso.

A média de vida dos norte-americanos caiu de 78,8 anos em 2019, para 77,8 anos em 2020. Entre a população negra, a expectativa de vida caiu 2,7 anos, para 72 anos, o maior declínio de qualquer grupo. Na população de norte-americanos de origem hispânica, o recuo foi de 1,9 anos.

Números que por si só falam do impacto da desigualdade social e por cor de dele e etnia sobre a expectativa de vida nos EUA. Na população branca, esse parâmetro caiu menos de um ano, para 78 anos.

A vantagem na expectativa de vida dos brancos em comparação com a dos negros aumentou 46%, de 4,1 anos para seis anos – revertendo uma tendência de queda na lacuna entre os dois grupos observada desde 1993.

Já a diferença na expectativa de vida entre a população hispânica e a branca diminuiu 37%, de três anos para 1,9 ano, de acordo com a pesquisa.

Especialistas acreditam que o impacto da Covid-19 sobre a expectativa de vida nos EUA pode ser ainda mais pronunciado à medida que os dados do segundo semestre de 2020 forem computados.