Gestão de Pazuello no Ministério é um vexame

O governo Bolsonaro cancelou, em agosto de 2020, a compra de medicamentos que formam o chamado “kit intubação”. A informação consta em um relatório do Conselho Nacional de Saúde (CNS). Treze dos vinte e três itens solicitados foram cancelados por decisão do Ministério da Saúde.

Em julho de 2020, o Ministério da Saúde havia comprado de empresas uruguaias 54.867 medicamentos usados na intubação de pacientes de Covid-19 em UTIs. Com o apoio das Forças Armadas, os insumos foram distribuídos às secretarias de Saúde do Rio Grande do Sul e Santa Catarina, que estavam com os estoques de medicamentos baixos. A iniciativa foi chamada de “Operação Uruguai”. Nesta altura a indústria brasileira já não estava conseguindo atender ao aumento da demanda.

Em agosto do mesmo ano, porém, o governo federal cancelou a chamada “Operação Uruguai II”, que tinha como objetivo importar do país vizinho mais insumos médicos necessários para o tratamento e intubação de pacientes vítimas da Covid-19. Segundo representantes do Conselho Nacional de Saúde, não houve explicação do governo para o cancelamento da importação dos insumos necessários.

Agora, diante do agravamento da pandemia do coronavírus, hospitais do país inteiro estão alertando para a falta iminente dessas medicações que são vitais para o tratamento de pessoas com graves problemas respiratórios, como são os pacientes com Covid-19, assim como para a realização de qualquer tipo de anestesia. A situação é dramática. Pacientes morrerão sem ar por falta da medicação que permite sua colocação em ventilação mecânica.

Para a pesquisadora Claudia Garcia Serpa Osorio-de-Castro, da Escola Nacional de Saúde Pública da Fiocruz, a atual escassez é “indesculpável”, uma vez que, em agosto do ano passado, no pico da primeira onda da pandemia, o grande uso de tais medicamentos já sinalizava a importância em adquiri-los com antecedência. “Houve uma demora do poder público em agir e uma desmobilização depois da primeira onda, inclusive dos hospitais de campanha, mesmo quando já se previa uma segunda onda. Existe uma inércia muito preocupante”, diz ela.

O ex-governador Ciro Gomes (PDT) denunciou o descalabro na administração federal da pandemia. Ele falou sobre o cancelamento da compra das medicações para intubação em agosto do ano passado. “Para os ‘ricos’ entenderem: Bolsonaro e Pazuello suspenderam as compras dos medicamentos para intubação e agora requisitaram o que resta desses insumos dos hospitais privados, que irão ficar sem medicamentos depois de amanhã!”, disse Ciro, através de seu twitter.

O Conselho Federal de Farmácia confirmou em nota, na quinta-feira (18/3), que “informações de farmacêuticos que atuam em hospitais e outros serviços de saúde de diversos pontos do país, bem como manifestação pública dos secretários estaduais e municipais da saúde e da própria indústria farmacêutica, evidenciam o desabastecimento de bloqueadores neuromusculares, sedativos e outros medicamentos utilizados em terapia intensiva, como o midazolan, essenciais a uma intubação humanizada e segura”.

SEQUESTRO

A “providência” tomada pelo governo Bolsonaro diante da crise tem o DNA do ministro afastado Eduardo Pazuello, que ainda não deixou o cargo por causa dos “problemas administrativos” do novo titular da pasta.

Conhecido pela logística primorosa – que provocou a morte de 30 pessoas em Manaus por falta de oxigênio – ele determinou o confisco pelo governo de todos os kits produzidos no país. Ao invés de corrigir a decisão errada tomada em agosto e acelerar as compras e até a importação dos produtos, ele decide pelo confisco. Ou seja, quer despir um santo para cobrir outro.

A associação que representa os hospitais privados do Brasil reagiu à desastrada medida afirmando que a iniciativa do Ministério da Saúde de requisitar medicamentos da indústria usados para intubar pacientes e destiná-los ao SUS pode fazer com que eles acabem em até 48 horas em algumas instituições privadas. “Precisamos que o governo dialogue o quanto antes com o setor privado. Nossos estoques estão muito baixos e não estão sendo repostos pela indústria por conta das requisições administrativas que o ministério está fazendo nas fábricas”, afirma o diretor-executivo da Associação Nacional de Hospitais Privado (Anahp), Marco Aurélio Ferreira.

A recomendação feita pelo CNS e encaminhada à Anvisa, ao Ministério da Saúde, ao Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência, à Superintendência-Geral do Cade, ao Procon, Ministério Público, Defensoria Pública e entidades civis de defesa do consumidor, em seus respectivos Estados visava fazer com que o governo comprasse o mais rapidamente os produtos, inclusive com importação. O Tribunal de Contas da União (TCU) e os Conselhos Estaduais e Municipais de Saúde também foram informados.

CONASS

Em entrevista ao Jornal Nacional, Carlos Lula, Secretário de Saúde do Maranhão e presidente do Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass), explicou que a produção brasileira de medicamentos não deve atender a demanda crescente nos hospitais do país, que pode se estender por todo o mês de março até as duas primeiras semanas de abril. “Vai faltar kit intubação no país, vai faltar monitor, vai faltar bomba de infusão e o Ministério da Saúde tem que tentar prover isso”, disse Carlos Lula.

“O Ministério da Saúde terá que regular o uso e importar (medicamentos para intubação) o mais rápido possível, para eles não faltarem em um momento crítico”, afirmou Wilames Freire, presidente do Conselho Nacional de Secretarias Municipais da Saúde (Conasems). “Não temos desabastecimento ainda, mas sim uma baixa no estoque, por conta do aumento de leitos e de pacientes intubados ter aumentado o consumo de kits intubação”, afirmou ele.

Em entrevista à CNN, Jonas Donizette, presidente da Frente Nacional dos Prefeitos, afirmou que, desde o ano passado, alerta o Ministério da Saúde sobre a possível falta de medicamentos para a intubação de pacientes graves do novo coronavírus.

“Em julho e agosto já teve esse problema. Então fizemos o comunicado, no ano passado, quando teve o caso. Agora, com a situação de Manaus, nós reforçamos o pedido por uma coordenação nacional. E agora, mais recentemente, há cerca de 10 dias, mandamos um documento mais dramático, falando que se não houver uma medida do governo vamos ter perdas de vidas.”, explicou.