Rússia defende que EUA retorne ao acordo nuclear com o Irã
“Esperamos que seja possível preservar o Plano de Ação Integral Conjunto [Acordo Nuclear com o Irã] e que Washington retorne finalmente à aplicação plena da resolução correspondente da ONU”, declarou em Teerã o ministro russo das Relações Exteriores, Sergei Lavrov, ao lado do seu homólogo iraniano, Mohammad Javad Zarif, na terça-feira (13).
“Nossos parceiros em Teerã expressaram sua disposição de agir imediatamente nessa direção” se Washington voltar a cumprir o acordo que abandonou, enfatizou.
A visita de Lavrov à capital do Irã ocorreu na véspera da retomada em Viena das negociações pela restauração do acordo JCPOA. Segundo as agências de notícias, a negociação foi adiada porque um representante europeu pegou Covid-19.
As discussões de Viena reúnem os países signatários que permanecem no acordo (Alemanha, China, França, Reino Unido, Irã e Rússia), com a mediação da União Europeia. O governo dos EUA participa, mas sem contato direto com os iranianos.
Lavrov reiterou que o governo Biden precisa retirar as sanções impostas pelo então presidente Trump em 2018, quando retirou unilateralmente os EUA do acordo nuclear com o Irã (JCPOA) de 2015 e violou o acordo e as resoluções do Conselho de Segurança da ONU que, por unanimidade, o haviam respaldado.
Ataque a central nuclear do Irã
Zarif advertiu Washington que não conseguiria nenhuma vantagem nas discussões sobre a questão nuclear iraniana com “atos de sabotagem” – numa referência ao ataque de domingo à instalação nuclear iraniana em Natanz – ou “sanções”.
“Não temos nenhum problema em voltar aos nossos compromissos (…) mas os americanos têm que saber que nem as sanções, nem os atos de sabotagem darão um instrumento de negociação e que estas ações apenas complicarão ainda mais a situação para eles”, declarou. O Irã recuou passo a passo de várias cláusulas, fazendo uso do artigo 36, a partir de 2019, na busca de salvaguardar o acordo.
A propósito, Biden era vice-presidente no governo dos EUA que assinou o acordo JCPOA em 2015, pelo qual o Irã se submetia a uma inspeção muito rigorosa de seu programa nuclear civil, em troca do fim das drásticas sanções contra Teerã e da normalização das relações.
A política de Trump, ainda não alterada no essencial por Biden, tinha como meta matar de fome o Irã, proibindo a venda de seu petróleo e sancionando quem continuasse realizando transações com Teerã, no intuito de provocar descontentamento e a derrubada do legítimo governo iraniano.
“Mão direita e mão esquerda”
Lavrov também condenou enfaticamente as recém anunciadas sanções da União Europeia ao Irã, sob o pretexto de ‘defesa dos direitos humanos’. Essas sanções da UE, assinalou o ministro do exterior russo, deram origem a “uma enorme quantidade de perguntas”.
“Na UE não há nenhuma coordenação, a mão direita não sabe o que faz a esquerda. É lamentável”, apontou. “Se esta decisão foi tomada de maneira voluntária em plena negociação em Viena para salvar (o acordo sobre o programa nuclear iraniano), então é ainda mais lamentável. É um erro que seria pior que um crime”, completou.
O Irã anunciou na segunda-feira que suspende “qualquer diálogo sobre direitos humanos” e “cooperação” com o bloco europeu. Na segunda-feira, a UE sancionou oito funcionários do governo iraniano por sua suposta “participação na repressão aos protestos de 2019” – uma ingerência descabida nos assuntos internos do Irã.
O que os europeus diriam se Teerã resolvesse sancionar funcionários de Macron pela repressão às manifestações dos “coletes amarelos” na França quase na mesma época?
Ingerência ainda mais ofensiva e insustentável, quando um dos sancionados é o comandante-chefe do Corpo de Guardas da Revolução Islâmica (IRGC), general Hossein Salami, que substituiu o general Suleimani, assassinado pelo governo Trump quando estava em visita ao vizinho Iraque.
Estatura
Já Zarif rechaçou o comportamento europeu ao impor sanções ao Irã em vez de condenar o terrorismo econômico de Washington contra 82 milhões de iranianos e a sabotagem à instalação nuclear de Natanz.
“Este é um motivo para a Europa ter vergonha. É definitivamente uma ação destrutiva e definitivamente responderemos a esta ação”, disse o principal diplomata iraniano.
Ele aconselhou os europeus a “pensarem sobre sua dignidade. A Europa deve saber que não está numa posição moral superior. A Europa não pode pregar ao mundo. Uma Europa, onde a xenofobia e o anti-islamismo criaram condições terríveis para os muçulmanos, não tem moral nem posição para punir as autoridades iranianas”.
Sabotagem em Natanz
Teerã acusou Israel de ter sabotado no domingo a central de enriquecimento de urânio em Natanz, no centro do Irã, para prejudicar as negociações de Viena que tentam salvar o acordo JCPOA.
“Pensaram que o que fizeram em Natanz seria em desvantagem do Irã… Eu garanto que em um futuro próximo Natanz vai passar a centrífugas mais aperfeiçoadas”, afirmou Zarif. “Se pensavam que poderiam frear os esforços do Irã para obter a suspensão das sanções contra o povo iraniano, fizeram uma aposta muito ruim”, completou.
Na segunda-feira, em carta ao secretário-geral da ONU, Zarif denunciou a operação de sabotagem contra uma instalação nuclear monitorada pela Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA) como um “crime de guerra”. A partir desta quarta-feira, o teor de enriquecimento de urânio será elevado pelo Irã para 60%.