Rússia apresenta a EUA/Otan proposta de um amplo acordo por segurança
As propostas de segurança apresentadas aos EUA e à Otan pela Rússia nesta semana representam um amplo acordo necessário para acalmar as tensões crescentes entre Moscou e o bloco militar, assinalou o vice-ministro das Relações Exteriores, Sergei Ryabkov, após declarações de Bruxelas e da Casa Branca a respeito.
“Esses dois textos não são um menu a partir do qual se pode escolher isto ou aquilo. Eles são complementares e devem ser considerados como um todo”, disse Ryabkov a jornalistas.
Dois documentos foram entregues na quarta-feira a Karen Donfried, secretária de Estado assistente para Assuntos Europeus e Eurasiáticos do Departamento de Estado dos Estados Unidos. Eles delineiam a posição da Rússia sobre o que pode ser feito para reduzir as tensões com a Otan e com Washington, que vêm aumentando há vários anos.
A decisão de obter garantias de segurança jurídicas firmes de seus ‘parceiros ocidentais’ já havia sido exposta pelo presidente russo Vladimir Putin ao seu homólogo norte-americano Joe Biden, na cúpula virtual realizada há pouco mais de uma semana.
A resposta imediata da Otan foi reiterar suas acusações contra Moscou, após reconhecer a existência das propostas. Segundo o comunicado, é a Rússia que está conduzindo um aumento militar “substancial, não provocado e injustificado” ao longo de sua fronteira com a Ucrânia e está fazendo “falsas … alegações de provocações ucranianas e da Otan”.
O que levou Ryabkov a advertir que a recusa da Otan em reconhecer as legítimas preocupações de segurança da Rússia só pode levar a uma escalada perigosa.
“Fazemos propostas e recebemos em troca ultimatos. E sob a cobertura desses ultimatos, as atividades perigosas, que impactam diretamente nossos interesses de segurança nacional, continuam. Não podemos mais tolerar isso”, ressaltou Ryabkov.
O diplomata russo sugeriu que os EUA e a Otan deveriam abandonar a postura acusatória e começar a tratar as últimas propostas de Moscou “da maneira mais séria”, registrou a RT. Ele insistiu que cabia ao lado ocidental agir agora.
“Os aliados de Washington e da Otan devem interromper as atividades hostis dirigidas contra nossa nação, incluindo exercícios militares não anunciados, abordagens e manobras perigosas de navios de guerra e aviões de guerra, e interromper o desenvolvimento militar do território ucraniano”, disse ele.
Ryabkov reiterou que a hipotética integração da Ucrânia na OTAN – que o governo russo acredita que poderia abrir a porta para o lançamento de sistemas de mísseis de ataque ocidentais em território ucraniano – era uma linha vermelha para a Rússia. O que, aliás, já foi dito e repetido com todas as letras por Putin.
Ryabkov assinalou que a relação atual entre a Rússia e o Ocidente é caracterizada por “uma quase total falta de confiança mútua”. Garantias e acordos dados a Moscou por vários políticos americanos e europeus na década de 1990 foram quebrados, e a única maneira de resolver o problema é por meio de contratos legalmente vinculativos.
“Como grandes potências nucleares, a Rússia e os Estados Unidos têm uma responsabilidade especial pela segurança na Europa. O preço da guerra é bem conhecido em nosso país” , afirmou. “Portanto, estamos extremamente interessados na paz e estabilidade no continente europeu.”
A atual escalada de tensão se segue a provocações da Otan no Mar Negro e no Báltico, e deslocamento de metade do exército ucraniano para a linha de separação de forças no Donbass, mais drones de ataque, em violação aos protocolos de pacificação de Minsk.
Sobre as manobras militares dentro de seu próprio território, a Rússia disse que são de natureza defensiva e que a única maneira de uma ação militar começar na Ucrânia seria se Kiev a desencadeasse com alguma provocação deliberada.
Putin já advertiu que seria inadmissível uma limpeza étnica de falantes de russo no Donbass levada a cabo pelos herdeiros dos colaboracionistas neonazis.
A secretária de imprensa da Casa Branca, Jen Psaki, após comentar que “estamos discutindo [as propostas russas] com nossos aliados e parceiros europeus”, disse que os EUA “não farão concessões” na expansão da Otan.
“Não iremos comprometer os princípios-chave sobre os quais a segurança europeia é construída, incluindo que todos os países têm o direito de decidir o seu próprio futuro e formular políticas livres de interferências externas”, disse ela.
Para um país que invadiu tantos países em um tempo de existência relativamente tão exíguo, além dos golpes de estado que patrocinou, a referência a “livres de interferências” soa como alucinada.
É difícil pensar que governantes europeus possam achar que, se Moscou estiver a cinco minutos de voo de míssil nuclear desde a Ucrânia, haverá qualquer segurança em Bruxelas e outros quintais.
E como os russos já lembraram, retomando o princípio da segurança coletiva indivisível de Helsinki, assim como a liberdade, a segurança de uns acaba onde começa a dos outros.
Com a diferença que, ainda por algum tempo, os mísseis russos, que são hipersônicos, chegam mais rápido.
E os supremacistas norte-americanos não podem alegar que não há precedentes para um bom acordo.
Em 1955, foi possível, na Áustria que continua neutra, e bem, até os dias de hoje. Na Crise do Caribe, ou dos mísseis em Cuba, de 1962, o bom senso prevaleceu, evitando o pior.
A Rússia quer a paz e segurança. Garantias jurídicas firmes. Moratória do posicionamento de mísseis nucleares intermediários na Europa. Não é demais.
Quem desrespeitou o compromisso assumido durante o processo de reunificação alemã foram os EUA – suas bases militares é que se aproximaram das fronteiras russas, não o contrário.
Sobre a mesa
Como registrou a RT, os documentos preliminares, que foram entregues à Secretária de Estado Adjunta dos Estados Unidos, Karen Donfried na quarta-feira e revelados ao público na sexta-feira, incluem um pedido de uma ampla gama de garantias, tanto da Otan quanto de Washington, para aumentar a segurança de todas as partes envolvidas.
As propostas surgem em meio a tensões cada vez maiores entre a Rússia e os EUA. As divergências, que existem desde o ataque da Otan à Iugoslávia e da invasão do Iraque, pioraram na última década, com a intervenção Otan/EUA na Líbia e na Síria, e o golpe CIA-neonazis na Ucrânia.
Desde então, seguiram-se sanções econômicas e expulsões diplomáticas respondidas de forma espelhada pela Rússia. Além de reiteradas provocações, como nos últimos exercícios em larga escala da Otan, em que ensaiaram por dez vezes um ataque nuclear à Rússia, desde 20 quilômetros da fronteira.
No início deste ano, o ministro das Relações Exteriores da Rússia, Sergei Lavrov, descreveu a relação entre Moscou e o bloco como inexistente. O relacionamento de Moscou com a Otan não pode ser descrito como ‘catastrófico’ porque simplesmente não existe NADA, disse Lavrov.
Regras de conduta
A Rússia redigiu dois documentos separados, um para a OTAN e outro apenas para os americanos. Ambos assumem a forma de um contrato, incluindo promessas juridicamente vinculativas sobre a conduta futura de todas as partes.
O texto entregue ao bloco de 30 membros concentra-se principalmente na movimentação de pessoal e material militar, incluindo a promessa de que todos os signatários não estacionarão suas forças em Estados europeus que não eram membros da OTAN em 1997. Isso excluiria ex-membros do Pacto de Varsóvia .
Outro artigo no texto inclui uma chamada para não colocar mísseis terrestres de médio e curto alcance nas proximidades do território um do outro.
O documento também exige que a Otan resista a novas ampliações do bloco militar, incluindo a adesão da Ucrânia, que há muito é uma linha vermelha para Moscou.
O texto também inclui uma cláusula de que os atuais membros da Otan renunciem a qualquer atividade militar no território da Ucrânia, bem como em outros Estados do Leste Europeu, Transcaucásia e Ásia Central.
A proposta aos EUA inclui muitas garantias semelhantes, como um artigo de que tanto a Rússia quanto os EUA não usarão o território de outros estados para preparar ou executar um ataque armado um ao outro. Além disso, o texto exorta os americanos a se comprometerem a descartar a expansão da OTAN em países que foram repúblicas da União Soviética.
Além disso, a Rússia está procurando um compromisso segundo o qual ambas as partes não implantem armas nucleares em outros países e tomem de volta as que já estão no exterior.