Reverendo foi autorizado pela Saúde a negociar vacina superfaturada
O diretor de Imunização e Doenças Transmissíveis do Ministério da Saúde, Laurício Monteiro Cruz, deu aval para que o reverendo Amilton Gomes de Paula e a Senah (Secretaria Nacional de Assuntos Humanitários), uma entidade religiosa comandada por ele, também negociassem a compra de 400 milhões de doses da vacina AstraZeneca por US$ 17,50 a dose com a empresa americana Davati Medical Supply.
O valor de US$ 17,50 por dose indicados pelo reverendo no e-mail à Davati representa 3 vezes mais do que os US$ 5,25 que o Ministério da Saúde pagou em cada dose da vacina AstraZeneca comprada em janeiro, de um laboratório na Índia.
A informação foi divulgada na edição de sábado (3) do Jornal Nacional. Segundo a reportagem, e-mails obtidos pela equipe do telejornal revelam que Laurício Monteiro Cruz enviou uma mensagem para o reverendo no dia 23 de fevereiro. O assunto: “lista de presença e carta de proposta de fornecimento”.
“Inicialmente agradecemos a disponibilidade da Senah, representada por sua pessoa (…). Na apresentação da proposta comercial para fornecimento de 400 milhões de doses da vacina Astrazeneca”, diz o texto do e-mail, que finaliza observando que “todos os processos de aquisição de vacinas no âmbito do Ministério da Saúde estão sendo direcionados pela Secretaria Executiva”.
A reportagem diz que dia 4 de março, o reverendo postou fotos de uma reunião no Ministério da Saúde. Laurício Monteiro Cruz, o diretor de imunização do ministério, está em uma delas. Na postagem, o reverendo escreveu: “Senah faz reunião no ministério para articulação mundial em busca de vacinas e para a consecução de uma grande quantidade dos imunizantes a ser disponibilizada no Brasil”.
Em 9 de março, Laurício Cruz envia outro e-mail, desta vez endereçado a Herman Cardenas, presidente da Davati nos Estados Unidos: “Informo que o Instituto Nacional de Assuntos Humanitários representados pelo seu presidente Amilton Gomes, esteve no Ministério da Saúde em agenda oficial da Secretaria de Vigilância em Saúde e no Departamento de Logística com a discussão sobre as tratativas sobre a vacina da ‘Astrazenica’ (sic) e que o mesmo foi encaminhado para a Secretaria Executiva do Ministério da Saúde”.
Em outro trecho, o diretor de imunização deixa claro que a Senah tinha o aval do Ministério da Saúde para negociar a compra de vacinas com a Davati: “Por fim, esperamos que os avanços de forma humanitária entre o ministério e ‘Astrazenica’ pelo Instituto Nacional de Assuntos Humanitários”.
No dia seguinte, o reverendo enviou um e-mail para o presidente da Davati nos Estados Unidos. Em inglês, Amilton Gomes escreve: “Eu cordialmente venho agradecer pela confiança depositada em nossa instituição em conduzir negociações com o Ministério da Saúde do Brasil. As negociações estão em estágio final e a expectativa é que o contrato seja assinado em 12 de março de 2021”.
O reverendo diz ainda: “Nós pedimos para que enviem os dados para preencher o contrato de aquisição das vacinas (…) e que seja fornecido o SGS para ser enviado ao ministro quando ele requisitar”. SGS é nome de uma empresa de certificação que atesta se determinado produto está em conformidade com as normas e regulamentações.
Por fim, o reverendo faz um pedido: “Nós solicitamos com urgência o FCO atualizado, com o valor de US$17,50 como acordado em 5 de março e com a data de entrega”. FCO é uma sigla em inglês que quer dizer oferta completa de venda. US$ 17,50, o valor que seria pago por dose.
O reverendo manda um novo e-mail um dia depois, com o seguinte teor: “A Senah, devidamente reconhecida como interlocutora na negociação referente à aquisição das vacinas Astrazeneca entre a companhia Davati e o Ministério da Saúde, vem através deste informar que em 12 de março, às dez da manhã no horário do Brasil, haverá um encontro com o secretário executivo do Ministério da Saúde, coronel Élcio Franco, para tratar de questões relacionadas à aquisição de vacinas da Astrazeneca via Davati, fortalecendo assim a confiabilidade dos laços para futuras aquisições”.
O reverendo diz que a presença dos representantes da Davati na reunião será extremamente importante para validar a proposta de preço.
O representante da Davati no Brasil, Cristiano Carvalho, confirmou que o encontro com Élcio Franco ocorreu dia 12 de março às 10h05.