A relatora especial da ONU Agnès Callamard ao lado da noiva de Khashoggi, o jornalista executado

O escritório de direitos humanos da ONU confirmou na quarta-feira (24) a veracidade de comentários recentes da relatora especial Agnès Callamard, que investigou o caso, de que recebeu ameaças de morte, feitas por um alto funcionário da Arábia Saudita, por suas descobertas contundentes sobre o assassinato do jornalista dissidente Jamal Khashoggi dentro do consulado do reino em Istambul em 2018.

“Confirmamos que os detalhes da história do Guardian sobre a ameaça dirigida a Agnès Callamard são precisos”, disse o porta-voz de direitos humanos da ONU, Rupert Colville, em resposta por e-mail à Reuters. Coube a Callamard encabeçar a investigação, por ser a Relatora especial da ONU para execuções extrajudiciais, sumárias ou arbitrárias.

Callamard disse ao jornal britânico The Guardian que um colega da ONU a advertiu em janeiro de 2020 que um alto funcionário saudita havia feito ameaças duas vezes contra ela em uma reunião de alto nível com outros altos funcionários da ONU em Genebra naquele mês.

Durante esse encontro, autoridades sauditas repudiaram o relatório e suas conclusões, e ainda insinuaram que a especialista teria recebido dinheiro do Catar.

Quando funcionários da ONU expressaram alarme, outros sauditas presentes procuraram tranquilizá-los de que o comentário não deveria ser levado a sério. O grupo saudita então deixou a sala, mas o alto funcionário saudita visitante ficou para trás e repetiu a ameaça aos demais funcionários da ONU na sala. Especificamente, o funcionário saudita disse que conhecia pessoas que se ofereceram para “cuidar do problema se você não o fizer”.

O porta-voz Coville acrescentou que o escritório de direitos humanos das Nações Unidas informou na época Callamard sobre a ameaça, bem como as autoridades da ONU. Callamard assumirá este mês seu novo cargo como secretária-geral da Anistia Internacional.

O relatório de 100 páginas de Callamard, publicado em junho de 2019, concluiu que havia “evidências confiáveis” de que o príncipe saudita Mohammed bin Salman e outros altos funcionários estavam por trás do assassinato de Khashoggi e chamou o assassinato de um “crime internacional”.

Khashoggi, então jornalista do Washington Post, foi brutalmente assassinado em 2 de outubro de 2018, depois que entrou no consulado em Istambul para obter documentos para seu casamento planejado com sua noiva turca Hatice Cengiz, que ficou na porta do prédio aguardando sua volta. De acordo com autoridades turcas, Khashoggi foi morto e seu corpo foi cortado em pedaços por um esquadrão saudita de 15 homens dentro do consulado.

Após a repercussão da denúncia de ameaças de morte, Awad Alawad, chefe da Comissão de Direitos Humanos da Arábia Saudita alegou que “nunca quis ameaçar alguém designado pela ONU, ou qualquer outra pessoa, apesar de não lembrar minhas palavras exatas”.

“Rejeito esta insinuação nos termos mais enérgicos”, acrescentou Alawad, se dizendo “abatido porque qualquer coisa que disser pode ser interpretada como uma ameaça”. Ou, ainda pior, se disser alguma coisa que torne o remendo pior que o soneto, e desagrade o príncipe MBS.