Reinfecção não deve ter maiores consequências para a pandemia
Um homem foi reinfectado com coronavírus após a recuperação – o que isso significa para a imunidade? Muitas perguntas já existiam sobre essa possibilidade, desde o início da pandemia. Mas, de acordo com o infectologista Marcos Boulos, este não é um problema muito importante, servindo mais como curiosidade.
“Este é um fato isolado, pois é raro acontecer, por isso, são poucas as consequências importantes”, disse o médico, em entrevista exclusiva, referindo-se ao caso do homem de 33 anos, que teve uma segunda infecção por Sars-CoV2 cerca de quatro meses e meio depois de ser diagnosticado com a primeira, da qual se recuperou. O homem, que não apresentou sintomas, foi diagnosticado quando retornou a Hong Kong após uma viagem à Espanha.
Não há nenhum relatório publicado de revisão por pares sobre este homem – apenas um comunicado de imprensa da Universidade de Hong Kong – embora relatórios digam que o trabalho será publicado na revista Clinical Infectious Diseases.
Boulos, que faz parte do Grupo de Contingência da Covid-19 do Governo do Estado de São Paulo, diz que a importância deste caso está no fato de a reinfecção estar ocorrendo bem antes do prazo que se imaginava. Mas ele reafirmou que este é um caso raro.
Sintomas e imunidade
É possível obter a Covid-19 duas vezes? Boulos considera que, como o caso descoberto foi assintomático, mostra que pode ter, mas com muito pouca viremia, a ponto de praticamente não haver infecção. O homem não estava sofrendo de nenhum dos sintomas característicos de Covid-19, o que pode significar que ele tinha algum grau de imunidade protetora à segunda infecção porque não parecia doente.
A imunidade aos coronavírus endêmicos – aqueles que causam sintomas do resfriado comum – é de vida relativamente curta, com reinfecções ocorrendo mesmo na mesma estação. Portanto, não é totalmente surpreendente que a reinfecção com o Sars-CoV2, o vírus que causa a Covid-19, seja possível.
A imunidade é complexa e envolve vários mecanismos no corpo. Isso inclui a geração de anticorpos – por meio do que é conhecido como resposta imune adaptativa – e por meio das ações das células T, que podem ajudar a educar o sistema imunológico e eliminar especificamente as células infectadas por vírus.
No entanto, pesquisadores ao redor do mundo ainda estão aprendendo sobre a imunidade a esse vírus. Portanto, como diz o doutor Boulos, não se pode dizer com certeza, com base neste único caso, se a reinfecção será um motivo de grande preocupação.
Vacinação
Por outro lado, também não deve haver consequências para os estudos da vacina, porque o caso ocorreu com cepas diferentes do vírus. “Isso até ameniza os riscos para a vacina”, diz o infectologista. Tanto a raridade do caso, como a diferença de cepas do vírus, se devem ao fato do paciente ter tido contato com cepas chinesas e espanholas, devido à viagem.
Se o vírus fosse uma mutação da mesma cepa a reinfectar o paciente, as especulações sobre a eficácia da vacina seriam maiores. Já se observou que o Sars-Cov2 tem menos mutações que o Influenza, o vírus da gripe comum. A quantidade de mutações implica na necessidade de vacinações periódicas devido à baixa capacidade de imunização da vacina.
Freqüentemente, uma “cepa” diferente é um vírus que se comporta de maneira diferente de alguma forma. O coronavírus que infectou este homem na Europa provavelmente não é uma cepa nova. Um artigo da Stat News relata que a composição genética do vírus sequenciado da segunda infecção do paciente tinha 24 nucleotídeos – blocos de construção do genoma de RNA do vírus – que diferiam do Sars-CoV2 isolado que o infectou na primeira vez.
Assim, o Sars-CoV2 tem um genoma composto por cerca de 30.000 nucleotídeos, então o vírus da segunda infecção do homem era cerca de 0,08% diferente do original na sequência do genoma. Isso mostra que o vírus que causou a segunda infecção era novo; não é uma recorrência do primeiro vírus.
As pessoas que se recuperaram do Covid-19 ainda devem usar máscara?Como ainda estamos aprendendo sobre como os humanos desenvolvem imunidade ao Sars-CoV2 após a infecção, a recomendação do infectologista continua sendo para mascaramento contínuo, higiene das mãos e práticas de distanciamento, mesmo após a recuperação da Covid-19, para proteger contra o potencial de reinfecção.
(por Cezar Xavier)