Raul Velloso

O economista e ex-secretário de Assuntos Econômicos do Ministério do Planejamento (85-89), Raul Velloso, defendeu a emissão de moeda para fazer frente à situação excepcional por conta da pandemia e da depressão econômica.

“O problema não é falta de dinheiro. Dinheiro, se precisar, basta o governo ter coragem e emitir moeda”, declarou em Live do Valor Econômico, na terça-feira (17). “A emissão de moeda é uma dívida que não paga juros e pode se dar sem impacto inflacionário”.

“Do mesmo jeito que a situação é excepcional para gente conviver com déficit público bastante elevado, seja para um programa como o de renda emergencial, ou para investimentos compensatórios dessa situação de depressão que nós tivemos de enfrentar, seja por uma razão ou por outra, na verdade o mesmo ocorre com a questão do financiamento deste déficit. Não tem por que sair tentando colocar papéis do jeito que normalmente se faz, colocando papéis com certo prazo e pagando taxa de juro mais alta, se a emissão de moeda é a dívida que não paga juros e ela pode se dar sem impacto inflacionário. Numa situação excepcional como essa que nós estamos vivendo, como que eu não vou emitir moeda?”

Para Velloso, diante da pandemia “seria uma grande besteira, se comportar numa crise desta dimensão como se ela não existisse, como se nós estivéssemos em uma situação normal”.
Ele acrescentou que “o mundo está pensando sobre essa questão do efeito da emissão de moeda sobre a inflação de uma maneira crescentemente diferente mesmo sem a pandemia.

Imagina com a pandemia, que traz situações completamente excepcionais e onde o impacto que se imagina que a emissão de moeda teria não tem como acontecer”.
Para Velloso, o que o governo tem feito aos “trancos e barrancos” foi empurrado pelo Congresso e pela sociedade.

“A sensação que eu tenho é que este governo está sempre atrás do seu tempo e portanto é difícil dar certo, a gente tem que estar no tempo que está vivendo. O tempo que eu estou falando é a pandemia e o pós-pandemia. O mundo mudou, o Brasil mudou, nós temos de raciocinar nesse outro mundo pandemia e pós-pandemia, o que vigorava atrás tem que entrar com um elemento para gente raciocinar, mas não é ele que é decisivo. O que é decisivo é o que nós estamos vivendo e o que nós vamos viver a partir do momento que a pandemia se for. Este é um novo tempo e nós temos de pensar também assim: a pandemia é algo especial excepcional no mau sentido, mas é. Ela tem que ser tratada dessa forma, depois a gente muda o tratamento quando a gente achar que ela terminou”, defendeu Velloso.

Segundo ele, o pós-pandemia “será um novo regime”. “Vamos dizer assim, a herança do que se fez em caráter excepcional durante a pandemia vai ficar. É muito difícil fazer o que tem que ser feito? Não. É fácil, só que tem que ter coragem de fazer, encontrar o caminho político para fazer.

Em parte está sendo feito aos trancos e barrancos, empurrado pelo Congresso e pela sociedade o governo acaba fazendo, mas tem formas mais rápidas e mais fáceis sim de fazer o que é certo”.

INVESTIMENTOS PÚBLICOS

“Numa situação dessas o investimento privado naturalmente se retrai e nós precisamos fazer a economia crescer, não há mágica nisso, tem de investir para voltar a crescer. Se o privado naturalmente se retrai, isso faz parte da sua forma de funcionar, o público tem de entrar, o investimento público é fundamental. E por que que a gente precisa crescer, além daquilo que é óbvio para gerar emprego e etc.,? É porque nós vamos ter de aumentar a dívida pública, e a única maneira de administrar um aumento forte da dívida, como nós vamos ter, é através do crescimento da economia; no momento que aquele aumento excepcional parar de acontecer, tem de crescer porque aí a dívida cresce o PIB cresce e os dois se entrarem em uma trajetória, que chamam de equilibrante, tudo bem, tudo está sob controle e nós vamos partir para outra empreitada no nosso país, na verdade no mundo, porque todo mundo está passando pelo mesmo problema”, frisou o economista.

TETO DE GASTOS

Velloso também fez críticas aos que defendem a manutenção do teto de gastos. O teto de gastos “nasceu morto”, declarou ele, ao afirmar que o teto virou ícone de “certo segmento de economistas” e do mercado financeiro, que defendem que “ou temos o teto ou estamos perdidos”. “Isso é uma grande bobagem”, disse.

“Lá atrás quando ele nasceu, ele já nasceu morto. Não era para durar muito porque na hora em que se fixa um teto de crescimento do gasto geral, e aí ele não vale para sei lá para 90% ou mais dos itens do orçamento, como é que ele pode durar? os outros 90% vão crescer acima dele, e aí de novo o nosso velho investimento paga a conta porque ele é o único com mais gastos de custeio discricionários, que na verdade acabam sendo um risco, porque não há como você cortar muito deste discricionário. Então, ele duraria pouco. Ele não tinha uma vida longa, mas como ele virou o ícone de um certo segmento dos colegas economistas e dos mercados financeiros, virou um negócio ou fica valendo o teto ou nós estamos perdidos. Que é isso gente? Isso é uma grande bobagem, Deus do céu como é que nós caímos nessa armadilha de ter de arranjar um jeito de cumprir um teto que nasceu morto?”, questionou Raul Velloso.