Quantos atentados foram cometidos por apoiadores de Bolsonaro?
por Cézar Xavier
Apesar da escalada de ataques, agressões e até assassinatos a militantes e políticos de esquerda, são poucas as respostas contundentes da polícia, da justiça e até da mídia, garantindo a impunidade. Contam-se dezenas de incidentes ocorridos ainda antes da campanha de Bolsonaro, em 2018. É possível reunir pelo menos 64 casos mais simbólicos e tornados públicos na imprensa, envolvendo apoiadores do presidente em agressão a opositores.
O assassinato do dirigente petista Marcelo Arruda neste fim de semana em Foz Iguaçu (PR) é mais um, que mostra a parcialidade da abordagem do crime pela imprensa e pela polícia, assim como pelos políticos bolsonaristas que se omitem em mais um episódio de violência política estimulada pela extrema direita.
As declarações de Bolsonaro incentivando a ofensiva violenta contra a esquerda revelam uma tática fascista para tumultuar o processo democrático e enfraquecer as instituições.
O relatório “Violência Política e Eleitoral no Brasil (2020)” elaborado pela Terra de Direitos e Justiça Global, mapeou 436 casos de violência política entre janeiro de 2016 e novembro de 2020. Foram registrados 205 assassinatos e atentados, 85 ameaças, 62 agressões, 59 ofensas, 21 invasões e quatro casos de prisão ou tentativa de detenção de agentes políticos, pré-candidatos, candidatos ou eleitos.
De acordo com a pesquisa, o aumento dos atos violentos contra a vida nos últimos anos saltou de 19 assassinatos e atentados mapeados em 2017, para 32 em 2019 e 107 casos de assassinatos e atentados contra agentes políticos até 29 de novembro, um número cinco vezes maior do que o quantitativo de 2017. Apesar de nem todos estarem relacionadas diretamente ao bolsonarismo, estes casos coletados confirmam que o ambiente político tornou-se mais violento com o estímulo verbal de Bolsonaro, e a facilitação de acesso a armas de fogo.
A pesquisa “A Violência Política Contra as Mulheres Negras (2020)”, elaborada pelo Instituto Marielle Franco, Justiça Global e Terra de Direitos, entrevistou mulheres negras que foram candidatas e mostrou que, entre as participantes, 42% relataram ter sofrido algum tipo de violência. Entre elas, 13,3% receberam ameaças de morte durante o período de pré-campanha ou campanha eleitoral.
Relembre alguns casos significativos da escalada de violência bolsonarista nos últimos anos:
14 de março de 2018 – Vereadora e motorista mortos a tiros no Rio
A vereadora Marielle Franco (Psol) foi morta com quatro tiros na cabeça dentro de um carro no Estácio, região central do Rio. O motorista do veículo, Anderson Pedro Gomes, também foi baleado e morreu. Uma outra assessora foi atingida por estilhaços. O crime foi considerado uma execução, mas não foi resolvido depois de quatro anos.
As investigações sofreram interferência federal, devido a irregularidades ocorridas no âmbito da polícia civil, com várias trocas de comando. Houve depoimento falso de miliciano para confundir a investigação, um policial preso por sumir com as armas do crime, desistência de duas promotoras que conheciam muito bem o caso e a morte de um miliciano que tinha relações com o gabinete do senador Flávio Bolsonaro (PL). Dois ex-policiais foram presos pelo assassinato, sendo que um deles entrou no condomínio onde mora Bolsonaro, pouco antes do crime.
Logo após o assassinato, começaram a ser disseminadas fake news sobre Marielle, acusando-a de ter relações suspeitas com o crime organizado. O contexto todo revela envolvimento político na execução da vereadora, sem ter-se chegado ao mandante do crime.
27 de março de 2018 – Tiros contra a caravana de Lula no Paraná
Dois ônibus da caravana do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva foram alvo de três tiros. Ninguém saiu ferido e o ônibus do ex-presidente não foi atingido. De acordo com passageiros, os veículos foram alvejados logo depois de deixarem a cidade de Quedas do Iguaçu (PR), na mesma região onde, agora, Marcelo Arruda foi morto. Antes disso, os ônibus já haviam sido alvejados por pedras, paus, bombas e ovos em outras localidades.
A Secretaria de Segurança Pública do Paraná se omitiu e fez afirmações falsas sobre o incidente. A imprensa criou dubiedades sobre o episódio, criticando o MST na região.
3 de setembro de 2018 – “Vamos fuzilar a petralhada”, comanda Bolsonaro em Rio Branco (AC)
Em campanha eleitoral na cidade de Rio Branco, no Acre, o então candidato Jair Bolsonaro fez gesto de arma, imitando um fuzilamento, enquanto discursava em cima de um carro de som.
“Vamos fuzilar a petralhada aqui do Acre, hein? Vamos botar esses picaretas para correr do Acre. Já que eles gostam tanto da Venezuela, essa turma tem de ir pra lá. Só que lá não tem nem mortadela, hein, galera. Vão ter de comer é capim mesmo”, disse enquanto imitava tiros.
A assessoria do candidato afirmou à imprensa que o ato “foi uma brincadeira como sempre”. Na época, houve representação criminal do PT, PCdoB e Pros por injúria eleitoral e incitação ao crime.
7 de outubro de 2018 – Primeiro turno da eleição registra dezenas de atentados
No dia do primeiro turno das eleições, bolsonaristas atropelam o cineasta Guilherme Daldin, em Curitiba; e a cantora trans Juliana Iguaçu foi agredida na cabeça, assim como várias outras agressões LGBTfóbicas são relatadas pelo país. Três dias antes das eleições, viralizou nas redes sociais um vídeo em que um grupo de homens entoava um grito de guerra homofóbico no metrô de São Paulo: “Ô bicharada, toma cuidado, o Bolsonaro vai matar veado”.
Pelo menos 50 casos de violência política promovida por bolsonaristas foram registrados nos dez dias anteriores em todo o país.
“Eu não tenho controle sobre milhões e milhões de pessoas que me apoiam”, disse Bolsonaro. Há vítimas que relatam desistir da denúncia após verem material de campanha de Bolsonaro nas delegacias e mesas dos policiais. Em outros casos, os policiais ainda gritam “Aqui é Bolsonaro” para as vítimas ou mesmo as agridem.
Um caso famoso desse período é da cozinheira Luisa Alencar, na periferia de São Paulo, que, depois de muitas agressões teve que ficar nua numa cela e dizer “Ele sim”, enquanto policiais riam. A Secretaria de Segurança Pública de São Paulo emitiu nota na qual afirma que “não há indícios de irregularidade na ação dos PMs e da delegada responsável pelo registro da ocorrência” e acusou a manifestantes de posse de droga.
8 de outubro de 2018 – Bolsonarista assassinou com 12 facadas o Mestre Moa do Katendê em Salvador
O mestre capoeirista Moa do Katende foi morto com 12 facadas nas costas em um bar em Salvador, após dizer que tinha votado em Fernando Haddad (PT) para presidente.
O autor do crime, que começou a discussão, manifestou aos gritos seu apoio a Jair Bolsonaro, ao chegar ao bar, de acordo com informação oficial da assessoria de imprensa da Secretaria da Segurança Pública do Estado da Bahia (SSP-BA).
“Quem levou a facada fui eu, pô. O cara lá que tem uma camisa minha e comete um excesso, o que é que eu tenho a ver com isso?”, declarou Bolsonaro no episódio. Ele também disse que o clima “não está tão bélico assim” e que os casos ocorridos até agora são isolados. Espera que não ocorram mais. “Agora, a violência vem do outro lado. Eu sou a prova viva disso daí”.
10 de outubro de 2018 – Dez bolsonaristas armados atacam a Casa do Estudante na UFPR, em Curitiba
Um estudante recém-formado foi agredido na Universidade Federal do Paraná (UFPR), em Curitiba, por usar um boné do MST. A vítima, que estava reunida com amigos em uma praça do campus, foi espancada sob gritos de “Aqui é Bolsonaro”, segundo testemunhas. “Eram uns 10 homens. Eles chegaram a quebrar garrafas na cabeça do rapaz”, conta M.H.O., presidente do Diretório Central de Estudantes, que presenciou a agressão e fez a denúncia. Os agressores também teriam depredado a Casa do Estudante da universidade, cujas janelas foram quebradas.
28 de novembro de 2019 – Bolsonarista assassina idoso a socos e pontapés em Balneário Camboriú (SC)
Apoiador de Jair Bolsonaro, Fábio Leandro Schwindlein, de 44 anos, matou o idoso Antônio Carlos Rodrigues Furtado, de 61 anos, após agressão com socos e pontapés por discussão política. O crime ocorreu na região central de Balneário Camboriú, Santa Catarina (SC).
“F.L.S iniciou com as agressões. Após o ato, a vítima caiu no chão, e o autor continuou a agredí-lo. Em ato contínuo, a vítima levantou-se e pediu para cessar com a agressão, pedido este ignorado pelo autor do fato. Neste momento, a vítima caiu novamente no chão, desta vez, desacordado”, diz o boletim de ocorrência. Rodrigues teve uma parada cardíaca no local e morreu.
7 de setembro de 2021 – Grupo de bolsonaristas armados tenta invadir acampamento indígena em Brasília
Na madrugada, defensores do presidente Bolsonaro tentaram invadir o acampamento indígena Luta pela vida, em frente à Funarte. Por volta das 3h, cerca de 10 manifestantes pró governo provocaram e mostraram armas aos indígenas que faziam a segurança do local.
“Vieram pelo banheiro. Eles fizeram questão de mostrar armas e defenderam muito o Bolsonaro. Não temos apoio da polícia, somos só nós. Mas não vamos ficar de braços cruzados se vierem de novo”, afirmou Anderson, do povo Krenak de Minas Gerais (MG).
“Passaram o tempo zoando. Eu acho que vieram testar, ver como a gente está”, disse o segurança do acampamento Pablo, do povo Puri do Amazonas (AM).
15 de outubro de 2021 – Bolsonarista armado ameaça radialista em Campinas
O radialista Jerry de Oliveira sofreu várias ameaças de um bolsonarista que mora no seu bairro, chamado Lourival Bento. Além de intimidações verbais, o filho de Lourival chegou a se dirigir a ele com uma arma na mão dizendo que “ninguém mais falaria mal do Bolsonaro”.
O bolsonarista gravou vídeo reafirmando as ameaças e disse que a polícia queria matar o radialista, também. “Ele deu a entender que estaria sendo acobertado ou ajudado pela polícia. E realmente, quando fomos à delegacia, os policiais sequer queriam nos ouvir ou ver o vídeo com as ameaças. Não quiseram ir ao local em que fui fechado e ameaçado com a arma para pegar vídeos de segurança do comércio local com as imagens do crime”, relatou.
13 de dezembro de 2021 – Equipe da TV Bahia é agredida por bolsonaristas em Salvador
Os repórteres da TV Bahia e da TV Aratu, afiliadas da Globo e do SBT, tentaram se aproximar para entrevistar Bolsonaro, mas a equipe de segurança agiu para impedir. Um dos seguranças deu mata-leão na repórter Camila Marinho. A pochete da repórter também foi arrancada por apoiador de Bolsonaro. Outro segurança tentou impedir que os jornalistas erguessem os microfones em direção a Bolsonaro. Os jornalistas da TV Aratu, Xico Lopes e Dário Cerqueira, também tinham sido agredidos.
A comitiva presidencial seguiu para dentro de uma escola. As equipes de reportagem não acompanharam, para evitar novas confusões. Somente então a assessoria de imprensa da Presidência chamou os repórteres dos dois veículos para dentro do local.
27 de janeiro de 2022 – Relatório da Fenaj aponta Bolsonaro como autor ou incentivador de 175 ataques contra jornalistas
A Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj) divulgou no Relatório da Violência contra Jornalistas e Liberdade de Imprensa no Brasil – 2020 que houve um aumento de 105,77% nas violências sofridas pelos profissionais da área no último ano. O presidente Jair Bolsonaro (PL) é o principal agressor.
Sozinho, Bolsonaro é responsável por 175 dos registros de violência, ou seja, 40,89% do total de 428 casos computados pela federação. Foram 145 ataques genéricos, direcionados a veículos de comunicação e a jornalistas, 26 casos de agressões verbais, um de ameaça direta aos profissionais, uma ameaça à Globo e dois ataques à Fenaj.
17 de maio de 2022 – Deputado bolsonarista agride vereadora trans no Rio de Janeiro
O Ministério Público Eleitoral denunciou o deputado estadual bolsonarista Rodrigo Amorim (PTB) pelo crime de violência política de gênero contra a vereadora trans Benny Briolly (PSOL), do município de Niterói. Amorim se referiu à parlamentar como “aberração da natureza” e “boizebu” durante um debate sobre políticas de inclusão para a população LGBT+. Amorim é o mesmo deputado que quebrou a placa em homenagem à vereadora Marielle Franco.
Na semana anterior, a Justiça do Rio condenara o vereador bolsonarista Douglas Gomes (PL) pelo crime de transfobia contra Benny. Ele se referia à vereadora insistentemente no masculino.
14 de junho de 2022 – Deputado bolsonarista ameaça deputada do PSOL em Pernambuco
O efeito das chuvas em Pernambuco foi tema de um debate acalorado entre a codeputada estadual Jô Cavalcanti, do mandato coletivo Juntas (PSOL) e o também deputado estadual Alberto Feitosa (PL), em uma sessão da Assembleia Legislativa de Pernambuco (Alepe).
“Com relação à arma, a arma está aqui para ser usada contra quem tentar violar a minha integridade física, a da minha família ou a minha residência. A senhora entendeu? Arma foi feita para isso. Não foi feita para ser guardada, não; arma foi feita para as pessoas se defender. E arma não mata, arma foi feita para se defender. Quem mata são as pessoas e a gente assiste aí as pessoas morrerem de pedrada, de cassetete. Então, deputada, não tenha ojeriza à arma não, muito pior faz algumas pessoas que envenenam”, disse o deputado na plenária. O caso gerou bastante repercussão após as imagens da sessão terem sido transmitidas pelo canal da TV Alepe.
15 de junho de 2022 – Drone pilotado por bolsonaristas lança veneno sobre o público que aguardava ato com Lula em Uberlândia.
Um drone atirou fezes e urina em parte do público que aguardava um evento com Lula e Alexandre Kalil (PSD), em Uberlândia (MG). Um suspeito de ser o dono do drone foi preso e a placa do carro foi identificada.
5 a 7 de julho de 2022 – Três episódios de violência política em sequência
Em Brasília, estrume, terra e ovos no carro do juiz Renato Borelli, que acatou um pedido da Polícia Federal para prender o ex-ministro da Educação Milton Ribeiro e os dois pastores trambiqueiros que agiam no MEC por orientação de Bolsonaro. No Rio, explode uma bomba de cocô próxima a um ato de campanha do ex-presidente Lula. Em São Paulo, um tiro numa vidraça da Folha de S.Paulo não fere ninguém, mas causa perplexidade.
7 e 8 de julho de 2022 – Em pronunciamentos, Bolsonaro volta a incitar apoiadores a ações violentas contra a esquerda
Bolsonaro engrossou o discurso em prol da violência e dos atos extremistas contra o principal opositor, Lula envolvendo os militares. Em ato oficial no interior paulista, ele disse que o contingente fardado tem o compromisso de se preparar para a possibilidade de agressões internas, destacando que não se pode comungar com uma “traição”.
“Nós militares, todos, vocês jovens cadetes que receberam o espadim há pouco, nós todos fizemos um juramento, dar a vida por nossa pátria, se preciso for. E esse dar a vida não é por possíveis agressões de fora, em especial, por agressões internas. Temos esse compromisso, temos de nos preparar dia a dia para essa possibilidade”, afirmou o presidente.
Na noite anterior, em transmissão ao vivo pelas redes sociais, Bolsonaro também enviou uma mensagem cifrada a seus apoiadores para que estes passem a tumultuar o processo eleitoral, antes da eleição deste ano. Em sua fala na qual incitou a violência, Bolsonaro chegou a mencionar a invasão ao Capitólio, nos Estados Unidos, quando o ex-presidente Donald Trump, ao ser derrotado nas urnas, provocou seus apoiadores a atacarem os parlamentares para garantir a continuação de seu governo.
“Se o pessoal do Comando de Defesa Cibernética do Exército detectar fraude não vai valer de nada esse trabalho porque o senhor (ministro Edson) Fachin já declarou que isso não muda o resultado das eleições. Não preciso aqui dizer o que estou pensando, o que você está pensando. Você sabe o que está em jogo, e você sabe como deve se preparar, não para um novo Capitólio, ninguém quer invadir nada, mas nós sabemos o que temos que fazer antes das eleições”, adiantou Bolsonaro.
10 de julho de 2022 – Bolsonarista invade festa de aniversário assassina dirigente petista em Foz do Iguaçu (PR)