Moon Jae-in (à direita, Coreia do Sul) e Kim Jong Un (RPDC), vêm realizando esforços para retomar relações

As Coreias – do Sul e do Norte – anunciaram na terça-feira (27) o restabelecimento de todas as linhas de comunicação intercoreanas, após mais de um ano de interrupção e estagnação de relações.

“Segundo o acordo entre os governantes, o Norte e o Sul tomaram a medida de reabrir todas as linhas de comunicação intercoreanas” a partir desta terça-feira, informou a agência de notícias oficial norte-coreana KCNA.

A agência acrescentou que “os dois governantes também concordaram em restaurar a confiança mútua entre as duas Coreias o mais rápido possível e em avançar com o relacionamento novamente”.

O impasse havia surgido em junho do ano passado, após provocações realizadas por grupos pró-americanos e anticomunistas, enviando panfletos por balões através da fronteira, com ofensas à liderança norte-coreana, e diante da inação de Seul a respeito.

Desde abril, através de cartas pessoais, os líderes das duas partes da Coreia, Moon Jae-in (Sul) e Kim Jong Un (Norte), vêm realizando esforços para retomada das relações intercoreanas. Segundo comunicado da Casa Azul – a sede do governo de Seul -, as duas partes concordaram em retomar as linhas de emergência como um primeiro passo nesse sentido. Desde 2018, eles se reuniram por três vezes, fazendo avançar a reconciliação intercoreana e abrindo caminhos para a reunificação da nação dividida pela ocupação norte-americana.

No terceiro aniversário da Declaração de Panmunjom em abril, o presidente Moon afirmara que “o tempo para reiniciar o diálogo está próximo”. “É hora de nos prepararmos para fazer o relógio da paz girar novamente com base nas lições que aprendemos com todas essas dificuldades”. Ele enfatizou a necessidade de “prosseguir em direção à paz permanente com base na Declaração de Panmunjom”.

O que estagnou, sob as pressões de Washington que, apesar das cenas de Trump sobre uma nova relação dos EUA com a Coreia do Norte, manteve a política do então conselheiro de segurança nacional John Bolton de matar de fome os norte-coreanos com as sanções, sem admitir qualquer alívio, até arrancar a desnuclearização do Norte. Sendo que o desenvolvimento do arsenal nuclear só foi realizado, a duras penas, sob as ameaças de W. Bush contra a Coreia do Norte, apontada como parte do ‘Eixo do Mal’.

O alívio das sanções, especialmente as que atingem a população civil, vem sendo defendido pela Rússia e pela China, como uma forma de reconhecer os esforços feitos por Pyongyang e para criar um processo positivo de convergência.

Mais: na condição atual de pandemia, o não alívio das sanções é simplesmente um crime contra a Humanidade.

Agosto

Em maio, o presidente sul-coreano foi recebido por Joe Biden na Casa Branca. Em junho, na celebração de 21 anos da Declaração Conjunta Sul-Norte pela reconciliação e paz, dois ex-ministros sul-coreanos da Unificação, pasta que no sul é responsável pelas relações intercoreanas, salientaram que a questão central para a melhoria das relações intercoreanas é a suspensão dos exercícios militares conjuntos EUA-Seul programados agora para agosto, conforme registrou o jornal sul-coreano Hankyoreh.

“Precisamos fazer uma declaração definitiva de que suspenderemos os exercícios militares conjuntos Coreia do Sul-EUA programados para agosto”, enfatizou o ex-Ministro da Unificação, e atual vice-presidente do Conselho Consultivo da Unificação Nacional, Jeong Se-hyun.

“O presidente Moon Jae-in precisa dar instruções claras ao Ministro da Defesa, instruindo-o a manter discussões com os EUA para não prosseguir com os exercícios”, assinalou.

“Se suspendermos os exercícios militares conjuntos, podemos criar outra situação como a primavera de 2018 [quando houve rápido progresso nas relações intercoreanas e entre a Coreia do Norte e EUA], ao passo que, se prosseguirmos

com os exercícios, a situação continuará a do jeito que está agora [sem sair do impasse atual]”, destacou. “Isso requer uma decisão do presidente [Moon]”, acrescentou.

“Precisamos fazer uma determinação estratégica sobre o que é mais urgente, exercícios militares conjuntos com os EUA ou desnuclearização, e agir de acordo”, concordou o também ex-ministro Lee Jong-seok. Também, para o ex-ministro da Unificação Lim Dong-won, os exercícios militares conjuntos precisam ser suspensos caso se pretenda que o processo de paz da Península Coreana seja novamente colocado em movimento.

Em paralelo, a “A Plataforma de Reconciliação e Paz Coreia-Japão” (Plataforma KJ), formada por grupos religiosos e pacifistas sul-coreanos e japoneses, enviou uma carta ao presidente Biden em que se manifestam pelo avanço do processo de paz na península coreana, rechaçam a inclusão da Coreia na aliança QUAD, a qual, denunciam, “reforçará o novo sistema da Guerra Fria no Nordeste da Ásia e fortalecerá o sistema de divisão na Península Coreana”. O QUAD é aquela aliança que os EUA estão buscando montar, para conter e pressionar a China, e no atual desenho inclui EUA, Japão, Austrália e Índia.

A declaração reitera, ainda, que um acordo destinado a encerrar a Guerra da Coreia não pode ser uma carta impondo a desnuclearização unilateral da RPDC, o que só reeditaria “a desastrosa história de guerra e divisão na Península Coreana”.

O jornal Hankyoreh também se referiu, em dois artigos, à prática dos EUA de sabotar qualquer iniciativa de Pyongyang visando desanuviar a situação no nordeste asiático. O jornal registra como tentativas de Tóquio e Pyongyang de resolverem antigas pendências e normalizarem relações, em duas ocasiões, 1990 e 2002, foram torpedeadas por Washington, que pressionou o Japão até inviabilizar qualquer entendimento.

Nos últimos tempos, uma comissão conjunta Seul-EUA supostamente criada para facilitar as coisas sob o quadro das sanções, na prática funcionou para tornar quase impossível qualquer relacionamento intercoreano.

Como “impedir que repórteres sul-coreanos levassem laptops para um evento intercoreano no Monte Kumgang; cancelar um programa que deveria fornecer à Coreia do Norte Tamiflu, um tratamento antiviral para gripe; e impedir empresários sul-coreanos de visitar o Complexo Industrial Kaesong para verificar suas propriedades lá”.

Washington e Seul acabam de anunciar a “reformulação do mecanismo”, que Pyongyang considera uma “armadilha armada por bajuladores pró-americanos”.

Agora, diante do anúncio da retomada dos canais de comunicação Seul-Pyongyang, um porta-voz de Washington disse que se trata de “um passo em boa direção. A diplomacia e o diálogo são essenciais para estabelecer uma paz duradoura e a desnuclearização da península coreana”.

Durante a 3ª Sessão Plenária do 8º Comitê Central do Partido do Trabalho da Coreia, o líder Kim Jong Un disse que o país deve estar “preparado para o diálogo e o confronto”, observação considerada como “interessante” pelo conselheiro de segurança nacional da Casa Branca, Jake Sullivan.

Em junho, o principal diplomata norte-americano a cargo da Coreia do Norte, Sung Kim, dissera que Washington estava “pronto” para se reunir com Pyongyang “sem condições”. O oferecimento foi descartado publicamente por Kim Yo Jong, irmã e conselheira de Kim Jong Un, sinalizando que o Norte – sob sanções draconianas – não se dispõe a perder tempo para ouvir ultimatos e tergiversações e aguarda compromissos mutuamente proveitosos.

Por sua vez, conforme o presidente sul-coreano, “ainda consigo ver a paisagem da ponte para pedestres”. O que ele disse recentemente, se referindo à ponte Panmunjom, por onde ele e Kim Jong Un caminharam em 2018, reiterando a reconciliação intercoreana.