“Não estamos mais interessados em conversas que não tragam nada para nós”, afirmou o ex-vice-ministro das Relações Exteriores, Kim Kye Gwan

A Coreia do Norte declarou que não está interessada em conversas sem sentido com os Estados Unidos, para que o presidente Donald Trump tenha algo a se vangloriar, e exigiu o fim da “política de hostilidade”, se os Estados Unidos quiserem dialogar.

“Não estamos mais interessados em conversas que não tragam nada para nós”, afirmou o ex-vice-ministro das Relações Exteriores, Kim Kye Gwan, segundo a agência de notícias estatal KCNA. A declaração seguiu-se a tuitada de Trump no sábado sinalizando outra cúpula.

“Como não temos nada em troca, não ofereceremos mais ao presidente dos EUA algo de que possa se vangloriar” como um feito de seu governo, assinalou o diplomata.

Em sua mensagem no Twitter, Trump pedia a Kim Jong Un que “fizesse o acordo” e concluiu com um “até breve!”. A postagem veio horas depois que Washington e Seul anunciaram o adiamento das manobras aéreas militares conjuntas Vigilant Ace programadas para o final do mês, após fortes protestos de Pyongyang, que as consideram “provocação” e ensaio de invasão.

Neste mês, a Coreia do Norte disse que recusou uma oferta dos EUA para mais negociações, dizendo que não estava interessada se elas visavam “nos apaziguar” antes do prazo derradeiro para que as negociações desempaquem, estabelecido em abril pelo presidente Kim Jong Un – até o final do ano.

As negociações entre a Coreia Popular (Norte) e os EUA estão em impasse em razão da recusa sistemática de Washington em cumprir sua parte no protocolo de intenções assinado na primeira cúpula entre o líder coreano, Kim Jong Un, e Trump, em Singapura, cujo princípio era a criação de uma atmosfera de confiança, através de concessões mútuas passo a passo, para abrir caminho para a assinatura definitiva de um acordo de paz (o armistício está em vigor desde 1953), normalização das relações e desnuclearização de toda a península coreana.

A Coreia Popular está submetida a sanções draconianas, que visam matar seu povo de fome, devastar a economia e fazer o país cair de joelhos.

Após as sucessivas demonstrações de parte de Pyongyang de compromisso com a paz e o entendimento, Rússia e China têm defendido no Conselho de Segurança da ONU o abrandamento das sanções, especialmente as que mais recaem sobre a população civil, mas os EUA se recusam terminantemente a qualquer concessão.

A Coreia Popular suspendeu os testes nucleares e de mísseis de longo alcance há um ano e meio, desmantelou um local de testes nucleares e restaurou, no que dependeu de si, os laços intercoreanos, em troca da suspensão das manobras militares norte-americanas e da abertura de negociações diretas.

A cúpula de Singapura interrompeu a ameaça iminente de guerra, mas a arrogância de Washington que quer que a Coreia seja desarmada nuclearmente primeiro, e só depois se suspendam as sanções, é que está gerando esse impasse, que nem a demissão do hidrófobo de guerra John Bolton mudou. Bolton até mesmo sugeriu uma “desnuclearização à moda da Líbia”.

Quem é que vai se desarmar, se o regime Trump não respeita os acordos que já estão assinados – imagine-se os que sequer saíram do papel?

A Coreia foi para a cúpula de fevereiro no Vietnã acreditando que um acordo razoável sairia dali, mas Washington não estava disposto. Em julho, Kim aceitou ir se encontrar inesperadamente com Trump, na zona desmilitarizada, na busca de manter um terreno comum, cujo mínimo é o abrandamento das sanções e a declaração de paz definitiva.

As negociações em nível de trabalho entre os dois lados em outubro, na Suécia, terminaram com o enviado norte-coreano acusando os americanos de virem à mesa de mãos vazias.

“Oferecemos ao lado americano uma maneira clara de resolver problemas, então o destino do diálogo entre coreanos e americanos depende da posição dos Estados Unidos, e o prazo é até o final deste ano”, reiterou o Ministério das Relações Exteriores da Coreia do Norte em comunicado após a suspensão dessas negociações preliminares. O comunicado também chamava Washington a tomar “medidas práticas para abandonar completa e irreversivelmente a política hostil em relação à RPDC”.

No Conselho de Segurança da ONU, Rússia e China – que sempre defenderam a política de concessões mútuas até a paz – têm defendido o abrandamento das sanções, mas os EUA seguem se recusando terminantemente.

Também irritou particularmente Pyongyang uma resolução à Assembleia Geral da ONU, patrocinada por Washington, sobre a “violação dos direitos humanos” na Coreia Popular – ainda mais cínica no momento em que regimes satélites dos EUA no mundo inteiro andam reprimindo e matando manifestantes, picotando jornalistas ou bombardeando vizinhos. Observadores também questionam a capacidade do governo de Trump, ameaçado de até de impeachment, de efetivamente fechar qualquer compromisso com Pyongyang, a menos de um ano da eleição.