Avião da empresa Ryanair, da qual uma aeronave pousou no aeroporto de Minsk

A porta-voz do Ministério das Relações Exteriores da Rússia, afirmou que Moscou estava “acompanhando de perto o desenvolvimento dos eventos em torno do pouso de emergência no aeroporto de Minsk em 23 de maio de uma aeronave da Ryanair de Atenas para Vilnius”.

Ela acrescentou que “segundo os relatórios oficiais do lado bielorrusso, o pouso ocorreu de acordo com as regras de segurança da aviação por decisão do comandante da tripulação devido à ameaça de um ato terrorista”.

“As ações das autoridades da aviação bielorrussas estão em conformidade com as normas internacionais”, frisou a porta-voz russa. “Um caça da Força Aérea da Bielorrússia foi designado para dar assistência no pouso, se necessário, especialmente levando em consideração a localização da usina nuclear bielorrussa nas proximidades”.

Zakharova registrou ainda, que a Rússia “tomou nota da detenção pelos serviços de segurança bielorrussos de um dos fundadores do canal Telegram NEXTA, Roman Protasevich, que estava a bordo e faz parte da lista de pessoas envolvidas em atividades extremistas. Consideramos que esta questão é um assunto interno da Bielorrússia”.

Ela também se referiu a “um cidadão russo detido” e esclareceu que a Embaixada da Rússia em Minsk já entrara em contato com seus parentes e com as autoridades bielorrussas para prestar assistência consular. Fontes da mídia identificaram-na como a namorada de Protasevich.

Zakharova repeliu a “reação coordenada” a estes eventos por representantes de vários países ocidentais e organizações internacionais, incluindo a UE, a OTAN, que classificou de “surpreendente”.

UE e Otan acusam Bielorrússia por atitude igual à que já tomaram

“Eles exigem a libertação do detido R. Protasevich e introduzem sanções adicionais mais severas contra a Bielorrússia e a companhia aérea Belavia. Gostaria de lembrar que eles reagiram de forma diferente a eventos semelhantes que ocorreram anteriormente em outros países”, assinalou.

“Em 2013, a pedido dos serviços especiais dos EUA, à caça de Edward Snowden, o avião do Presidente da Bolívia [Evo Morales], que voava de Moscou, foi forçado a pousar em Viena e inspecionado”

“Houve muitos desses exemplos”, afirmou Zakharova. “Em 2013, a pedido dos serviços especiais dos EUA, à caça do ex-funcionário da CIA, Edward Snowden, o avião do Presidente da Bolívia [Evo Morales], que voava de Moscou, foi forçado a pousar em Viena e inspecionado. Em 2004, os Estados Unidos forçaram o avião pessoal do ex-primeiro vice-Ministro das Finanças da Rússia e, posteriormente, senador A.P. Vavilov, na rota Moscou-Barbados-Aspen, a pousar no Aeroporto de Palm Beach, onde foi interrogado por muitas horas. Em 2012, a Turquia fez pousar um avião Moscou-Damasco com a ajuda de caças, tendo revistado o avião e apreendido sua carga”.

“Aviões comerciais bielorrussos também se tornaram objetos de pousos forçados. Em 2016, o avião Belavia, que decolou do aeroporto de Kiev, 50 km antes de entrar no espaço aéreo bielorrusso, foi forçado, a pedido do controlador ucraniano, que ameaçava mobilizar caças, a retornar ao aeroporto de partida para remover o ativista Anti-Maidan A. Martirosyan. De acordo com um cenário semelhante, os serviços especiais ucranianos planejaram apreender os “wagneritas” em 2019 por meio de um pouso de emergência em Kiev de um avião de Minsk para Istambul. Felizmente, essa operação SBU falhou”, destacou a porta-voz russa.

“É característico que todas essas ações foram cometidas intencionalmente, em violação do direito internacional. Praticamente não houve reação ocidental a elas, nenhum dos culpados foi punido”, enfatizou Zakharova.

Ela chamou a atenção “para a declaração do representante oficial do Ministério das Relações Exteriores da Bielorrússia, que expressou a prontidão de Minsk para a máxima transparência neste assunto, incluindo o fornecimento de materiais e a admissão de especialistas internacionais”.

Para concluir, Zakharova reiterou que a Rússia se dirige aos “nossos parceiros ocidentais para que se abstenham de aplicar ‘padrões duplos’ e tomem medidas para avaliar a situação com sobriedade, sem comoção, com base em todos os materiais disponíveis e em cooperação com as autoridades da aviação bielorrussa, demonstrando abertura e prontidão para a interação”.

“Escandaloso”

Antes disso, pelas redes sociais, Zakharova havia chamado de “escandalosa” a reação do Ocidente à aterrissagem na Bielorrússia de um avião da Ryanair no domingo (23), sobre o qual havia uma suspeita de bomba a bordo que não se confirmou.

Como a porta-voz russa registrou em sua rede social, “É escandaloso que o Ocidente considere o incidente no espaço aéreo bielorrusso escandaloso … ou deveria se escandalizar com tudo – desde pousos forçados na Áustria do avião do presidente da Bolívia a pedido dos Estados Unidos e na Ucrânia após 11 minutos da decolagem do avião de passageiros bielorrusso [em 2016] com um ativista anti-Maidan, ou não deveria se escandalizar pelo mesmo comportamento de parte de outros”.

O ministro das Relações Exteriores da Rússia, Sergei Lavrov, durante uma coletiva de imprensa com seu homólogo grego Nikos Dendias, pediu uma avaliação do incidente “não com pressa, com raiva, mas com base em todas as informações disponíveis”, e registrou a declaração detalhada das autoridades bielorrussas sobre a questão. Uma agência da ONU, a Organização da Aviação Civil Internacional (ICAO), é a responsável por esse tipo de investigação.

Ameaça de bomba

Convenientemente, o incidente ocorreu na véspera de uma cúpula europeia. A Bielorrússia afirmou que recebeu uma ameaça de bomba a bordo do voo FR4978 da Ryanair (Atenas-Vilnius), assinada por “soldados do Hamas”, e tomou as providências que são tomadas nesses casos.

Segundo o chefe do Departamento de aviação do Ministério dos Transportes da Bielorrússia, Artyom Sikorsky, “não houve pressão sobre a tripulação da Ryanair para fazer um pouso de emergência no Aeroporto Nacional de Minsk por parte dos controladores de tráfego aéreo da Bielorrússia”. O que – diga-se – é o comportamento padrão dos pilotos nesses casos, ninguém ‘paga para ver’.

A mensagem de ameaça exigia um “cessar fogo” na Faixa de Gaza e o fim do apoio da União Europeia a Israel, dizia saber que estavam a bordo do voo participantes de um simpósio econômico (Fórum Delphi) e concluía dizendo que “se não cumprirem nossas demandas, a bomba explodirá em 23 de maio”.

Conforme as autoridades bielorrussas, “nenhum explosivo foi encontrado durante a inspeção da aeronave” e uma investigação foi aberta sobre o caso.

Porta-voz do Hamas posteriormente esclareceu que “não recorremos a esses métodos” e atribuiu a ameaça “a partes suspeitas” que visam “desqualificar o Hamas e minar a simpatia mundial pelo povo palestino e sua legítima resistência”.

Bielorrússia cumpriu obrigações

O porta-voz do Ministério das Relações Exteriores da Bielorrússia, Anatoly Glaz, repudiou a “politização” do episódio.

“A questão está sendo claramente amplificada e deliberadamente politizada. Acusações sem fundamento são lançadas e rótulos, impingidos. Não há vontade aparente de entender objetivamente o que ocorreu. Imediatamente ressoaram os chamados por sanções. Exortamos aqueles que sucumbiram a esta prática viciosa a lembrar as regras e a segurança dos passageiros, a analisar tudo com calma, a aguardar as conclusões de especialistas competentes. Afinal, é somente com base nisso que se pode tirar conclusões dignas de nota”, disse Glaz.

“As regras de segurança da aviação são uma prioridade absoluta, aliás, em todos os lugares e para todos”, destacou. “O lado bielorrusso sempre abordou sua observância de forma responsável, o que é reconhecido pelos reguladores relevantes no setor de aviação. Podemos garantir total transparência, se necessário, aceitar especialistas e demonstrar todos os materiais de forma a excluir insinuações”.

Entre as represálias já anunciadas pela União Europeia, está a proibição do espaço aéreo europeu à estatal bielorrussa de aviação Belavia, assim como a “recomendação” às companhias de avião europeias para suspenderem os voos através do espaço aéreo bielorrusso. EUA e alguns países europeus pediram a suspensão prévia da Bielorrússia da ICAO: primeiro a condenação, depois a investigação.

Quem é Roman Protasevich

Durante a inspeção do avião, as autoridades bielorrussas se depararam com Roman Protasevich, procurado no país desde novembro do ano passado por atos de extremismo e decretaram sua prisão. Ele tem sido apresentado na mídia como ex-editor-chefe do canal Nexta do Telegram.

O Nexta [‘Alguém’, em bielorrusso] é uma fachada da operação de revolução colorida em curso no país, e que tem como programa a privatização das estatais, que são o cerne da economia do país, e implantação de um regime russófobo, neoliberal e corrupto, à semelhança do existente na Ucrânia, à guisa de ‘integrar-se à Europa civilizada’ [e à Otan…].

Um comentarista de um portal ucraniano pró-americano, ao mesmo tempo em que clamava contra a prisão de Protasevich, prestou um favor à coletividade revelando que o bom moço, antes dos serviços de agora na Bielorrússia, trabalhou como assessor de imprensa do Batalhão Azov, a nata dos neonazis ucranianos que tentam barbarizar o Donbass.

Os holofotes serviram, também, para mostrar vínculos do ‘Nexta’ – que opera a partir da Polônia – com organismos ligados ao Departamento de Estado/CIA, como o ‘Atlantic Council’. O co-editor Stepan Svetlov rememorou os “bons tempos” em que ele e Roman eram “bolsistas da Rádio Free Europe”, a emissora orgulho da CIA, há oito anos.

Blinken “chocado”

Por sua vez o atual secretário de Estado Antony Blinken, que como braço direito do vice Biden deve ter vivido de perto a caçada a Snowden e o pouso forçado do avião do presidente Evo Morales e também o esforço norte-americano de assassinato de reputação e captura de Julian Assange, se esmerou em cinismo, ao condenar “este movimento chocante do regime de Lukashenko” e a “detenção arbitrária de jornalistas”.

Quanto à ‘repulsa’ de governos europeus pela suposta ‘pirataria aérea’ cometida pelo governo de Minsk, como enfatizou o articulista da Sputnik Finian Cunningham, eles deveriam estar “muito mais preocupados com o abuso sistemático de seu espaço aéreo pela CIA americana e seu programa de ‘rendição extraordinária’”. “Incontáveis ’suspeitos de terrorismo’ sequestrados ilegalmente por forças militares americanas em operação ilegalmente em todo o mundo foram transitados secretamente por aeroportos europeus em seu caminho para a Baía de Guantánamo ou algum local negro para tortura”, denunciou.