PF: Bolsonaro e seus auxiliares maquinaram contra urnas eletrônicas
Jair Bolsonaro não está nem aí para os problemas do país, como inflação, desemprego e aumento da miséria. O que se vê em sua atuação são ataques diários às urnas e ameaças às eleições. Esta ideia fixa de tumultuar o processo eleitoral de outubro está causando incômodo tanto na população, como em seu partido, o PL, e também nas Forças Armadas.
Conforme a colunista Malu Gaspar, de O Globo, a ideia de auditar as eleições chegou a ser discutida com a cúpula do PL, mas lideranças e alguns membros da campanha a consideram inoportuna. “Se Bolsonaro fizer questão, vamos contratar. Mas o PL é um partido da política. Não queremos de jeito nenhum essa briga com o TSE”, afirmou um integrante da direção do partido.
Na última quinta-feira, em mais um arroubo golpista, ele anunciou – sem combinar com os russos – que o PL contrataria uma empresa privada para fazer auditoria nas urnas. Foi imediatamente rebatido pelo TSE e pelo presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, que disse que o país não aceita bravatas e que quem conduz a eleição é o STF (Tribunal Superior Eleitoral). Pacheco enfatizou também que o papel dos candidatos é apresentarem propostas e não tentarem interferir na condução do processo eleitoral.
Para ministros do TSE, não há nenhum problema em Bolsonaro querer auditar as eleições. “Se ele contratou uma empresa para auditar, é porque reconheceu que o processo de votação eletrônica é auditável. Já é um avanço”, afirmou um ministro do TSE.
Agora, vem à tona a informação de um inquérito do Polícia Federal em que Bolsonaro aciona a ABIN (Agência Brasileira de Inteligência) e os generais Luiz Eduardo Ramos e Augusto Heleno na busca de dados contra o sistema eleitoral. E, mesmo com o TSE respondendo publicamente a todas as dúvidas levantadas pelo representante das Forças Armadas na comissão eleitoral da corte, ele as empurra para fazerem questionamentos intermináveis ao TSE.
O ministro Fachin, presidente do TSE, tornou públicas ontem (segunda-feira 9) todas as respostas já elaboradas pelo órgão, tanto para as Forças Armadas quanto para as demais instituições que colaboram para a lisura das eleições. O tribunal eleitoral mostrou em detalhes quais foram aceitas e incorporadas ao processo e quais foram rejeitadas. Além disso, apesar de atender fora do prazo a um segundo pedido do representante do Exército, e responder aos questionamentos , Fachin alertou que, por lei, o prazo para novas mudanças para a atual eleição já se encerrou.
Jair Bolsonaro vem atacando sem provas a segurança das urnas eletrônicas. Desde 2021, o TSE rebate as afirmações de Bolsonaro. Na época, o órgão deu prazo para apresentar provas sobre as supostas fragilidades do sistema eleitoral. Um pouco antes de terminar o prazo, em sua live de 29 de julho de 2021, ele voltou a atacar as urnas eletrônicas. Na live de 29 de julho, atacou diretamente o sistema eleitoral e levantou sem provas a suspeita de fraude na eleição de 2014.
Para sustentar sua acusação de que houve fraude em 2014, Bolsonaro utilizou como prova uma análise simplória sobre o suposto padrão nos números da apuração dos votos que deu a vitória para Dilma Rousseff. O material, uma planilha com os números de votos, foi elaborado pelo técnico em eletrônica Marcelo Abrieli.
Chamado para depor no inquérito aberto pela PF, Abrieli relatou como foi procurado ainda no primeiro ano de governo, em 2019, pelo general Luiz Eduardo Ramos, atual ministro da Secretaria-Geral da Presidência, para convidá-lo a participar de uma reunião com Bolsonaro no Planalto.
“No final de 2019, o general Ramos entrou em contato, por telefone, com o declarante para agendar uma reunião no Palácio do Planalto com o presidente Bolsonaro. Que a reunião teria como tema indícios de fraude nas urnas eletrônicas e que o declarante falaria sobre as informações descobertas em 2014 sobre as eleições”, disse Abrieli no depoimento.
Abrieli afirmou que, além do general Ramos e Bolsonaro, participaram da reunião de aproximadamente uma hora de duração cerca de oito pessoas. Ele disse à PF que relatou suas descobertas sobre a possível fraude no pleito de 2014 e que as outras pessoas também apresentaram informações sobre possíveis falhas nas urnas.
Questionado pela PF sobre quais informações seriam essas, Abrieli disse não se recordar do conteúdo das apresentações, mas afirmou “saber informar que tudo girava sobre o mesmo tema, ou seja, possível fraude das urnas eletrônicas”. Ainda em seu depoimento, ele afirmou que, entre junho e julho de 2021, foi novamente procurado pelo general Ramos. Segundo ele, o contato foi feito quando Bolsonaro estava junto com o general e a ligação foi colocada no viva voz.
“Durante essa conversa foi avisado que estavam reunindo várias informações sobre possível fraude nas urnas eletrônicas. O general Ramos pediu para o declarante falar um pouco sobre as informações que descobriu”, disse Abrieli à PF. Logo após a conversa, segundo Abrieli, outro militar, o coronel Eduardo Gomes da Silva, responsável por apresentar as suspeitas de fraudes na live, entrou em contato com o argumento de que estava trabalhando com Ramos “na coletânea das informações” sobre as urnas.
No mesmo inquérito, o perito criminal da PF, Ivo Peixinho, especialista em crimes cibernéticos e responsável por testes nas urnas eletrônicas, disse que, entre 2019 e 2020, o governo federal, por meio da Abin, buscou informações sobre a segurança no sistema eleitoral brasileiro.
O perito conta que “em 2019 ou 2020” a Abin, sob o comando de Alexandre Ramagem, amigo da família Bolsonaro e chefiado por Heleno, enviou uma consulta “sobre informações sobre ocorrências ou atividades envolvendo urnas eletrônicas nas eleições”. Segundo ele, nessa ocasião, produziu um informe com todas as atividades da PF sobre o tema e os relatórios de análise no código fonte das urnas e testes públicos do TSE.
Na avaliação do ex-ministro da Justiça, Miguel Reale Jr., as revelações do inquérito produzido pela PF que mostram um planejamento do governo Bolsonaro (PL) para prejudicar o processo eleitoral constituem crime de responsabilidade. “Isso sem dúvida se constitui como crime de responsabilidade. Não vejo enquadramento fora dessa lei dos crimes contra Estado Democrático de Direito, a não ser por violação de sigilo”, disse o jurista, durante o UOL News desta terça-feira (10).