“Há um contingente substancial de gente que grilou a terra e vai obter benefício do governo”, afirma o doutor em ecologia e pesquisador do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia, Paulo Moutinho.
Jair Bolsonaro editou, em dezembro, a Medida Provisória 910, que ficou conhecida como MP da Grilagem. A Medida estende de 2011 para o fim de 2018 o período no qual terras públicas que foram griladas poderão ser regularizadas, perdoando a invasão e a ocupação criminosa.
Terras de até 2,5 mil hectares (equivalente a 2,5 mil campos de futebol) serão entregues para os invasores desde que seguidas algumas regras básicas. Bolsonaro também ampliou de 4 (entre 20 ha e 440 ha, dependendo do município) para 15 (entre 75 ha e 1.650 ha) módulos fiscais o mínimo exigido para que o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) faça vistoria prévia para a regularização do imóvel.
O pesquisador Paulo Moutinho explica que as terras não foram ocupadas por pequenos produtores, mas por grandes especuladores e pecuaristas.
“Certamente há muitos pequenos produtores na Amazônia passíveis de regularização, mas há um contingente substancial de gente que grilou a terra e vai obter benefício do governo”, comentou em entrevista para a BBC Brasil.
Grande parte das terras na Amazônia são griladas por “especuladores”, que limpam a terra e a vende para pecuaristas com “uma lucratividade astronômica”.
A advogada do Instituto Socioambiental, Juliana Batista, alerta que há ainda o risco de grileiros se apossarem de áreas reivindicadas por comunidades tradicionais nos casos em que as demandas dos grupos não estejam registradas na Ouvidoria Agrária Nacional.
“A partir do momento em que o governo começa a regularizar terras sem considerar outras demandas, isso vai gerar um conflito enorme”, afirmou Juliana à BBC News Brasil.
O procurador da República, Marco Antônio Delfino, afirmou que “nunca houve nada tão escandaloso, nada que fizesse tão jus ao mantra de que o crime compensa do que a MP 910”.
“Imagine a seguinte situação: em dezembro de 2018, no sul do Amazonas, uma pessoa adquire 1.500 hectares a R$ 1.000 o hectare. Na mesma data, o grileiro expulsa populações tradicionais, constrói residências na área e terá, via de regra, regularizada por R$ 600 mil. Ou seja, o cidadão honesto paga R$ 1,5 milhão e o grileiro paga R$ 600 mil”.