Os resultados deste ano revelam uma significativa radicalização entre os jovens norte-americanos, particularmente nas chamadas Geração do Milênio

A quarta pesquisa anual sobre “Atitudes dos EUA em relação ao socialismo, comunismo e coletivismo”, encomendado por uma certa ‘Fundação Memorial Vítimas do Comunismo’ – nome que por si só dispensa apresentações – e conduzido por YouGov, registrou um forte crescimento no interesse pelo socialismo entre os jovens nos EUA no ano passado. Como assinalou o portal Axios, se referindo à pesquisa, “os jovens americanos continuam a perder a fé no capitalismo e a abraçar o socialismo”.

O estudo, realizado anualmente desde 2016, baseia-se em entrevistas com 2.100 pessoas e margem de erro de + – 2,4%.

Os resultados deste ano revelam uma significativa radicalização entre os jovens norte-americanos, particularmente nas chamadas Geração do Milênio (entre 23 e 38 anos) e Geração Z (entre 16 e 22 anos).

Possivelmente a mais importante conclusão da pesquisa foi que 70% dos milenares disseram que poderiam votar num “candidato a presidente socialista”, sendo que a porcentagem dos que se disseram “extremamente propensos” a votarem em um dobrou de 10% em 2018 para 20% este ano.

Como se sabe, ao contrário da Europa, nos EUA, depois da caça às bruxas macarthista, ‘socialismo’ era considerado quase um palavrão e até supostamente ‘anti-norte-americano’.

Continua sendo nas gerações mais velhas, mas entre as mais novas, que nasceram após o fim do bloco socialista e chegaram à idade adulta em pleno crash de 2008 – passando pelas guerras do Iraque e Afeganistão, mais escândalo do grampo em massa e a impunidade dos banksters – a lavagem cerebral parece estar perdendo a eficácia.

Obviamente, a pesquisa mostra um espaço enorme para a campanha a presidente de Bernie Sanders, com suas propostas de estender a todos o Medicare que já atende aos aposentados e a gratuidade do ensino universitário.

39% DIZEM “SABER MUITO”

Na pesquisa, 39% dos ‘milenares’ disseram “saber muito” sobre o socialismo, o que vai a 83% quando incluídos os que consideram pelo menos “saber um pouco”. 50% dos ‘milenares’ e 51% da Geração Z têm uma visão “um tanto ou muito desfavorável” ao capitalismo, o que é uma piora respectivamente de 8 e 6 pontos percentuais em relação ao ano passado.

Muitos jovens têm menos expectativas de crescimento para suas vidas, do que as tiveram seus pais. Muitos têm que se virar em mais de um emprego. Muitos tiveram de voltar a morar com os pais. Alguns chegarão à idade de aposentadoria ainda devendo aos bancos a universidade. A desindustrialização levou embora muitos dos empregos melhor pagos.

Depois de dez anos de bail out dos bancos, especulação desenfreada que resultou na ‘Bolha de Tudo’ e brutal concentração de renda e desigualdade, começa a se espraiar nos EUA a intuição de que o individualismo levou a um beco sem saída, que só os magnatas se saíram bem, que Washington é um pântano fétido e o que é urgente é resgatar a busca de um futuro compartilhado e do bem comum.

Assim, uma pesquisa anticomunista acaba virando um tiro no pé e registrando que quase metade dos ‘milenares’ acha que o governo deve oferecer um emprego a todos que desejam trabalhar, mas não conseguem encontrá-lo.

45 % dos norte-americanos jovens (16-38 anos) acham que o ensino superior deve ser gratuito. No conjunto da população, o resultado é bem próximo: 40%.

Quase metade dos entrevistados entre 16-38 anos disse sentir que o sistema econômico dos EUA – como salientou o Axios – “trabalha contra eles”, o que reflete o agravamento da desigualdade.

Dos norte-americanos que pensam que os mais bem pagos não estão pagando sua parte justa – são 65% dos entrevistados – um pouco mais da metade (54%) pensa que o aumento de impostos faz parte da resposta, enquanto 47% acham que é necessária uma mudança completa do sistema econômico. Na faixa etária 23-38 anos, 37% – mais de um terço – concluiu que os EUA são uma das sociedades mais desiguais do mundo.

Para mais de um quarto dos entrevistados de todas as gerações, é Donald Trump que é a maior ameaça à paz mundial. E – o que deve ter deixado em pé o cabelo do pessoal da fundação – quase um em cada cinco ‘milenares’ considera que a sociedade seria melhor se toda a propriedade privada fosse abolida, enquanto 7 em cada 10 acham que a divisão entre ricos e pobres é “um problema sério”.

O resumo da pesquisa incluiu entre os destaques dos resultados que “o comunismo é visto favoravelmente por mais de 1 em cada 3 ‘milenares’ (36%), um aumento de 8 pontos em relação a 2018”. Ainda, que “15% dos ‘milenares’ acham que o mundo estaria melhor se a União Soviética ainda existisse”. O que levou a diretora-executiva da Fundação VOC, Marion Smith, a advertir sobre a “amnésia histórica” e a necessidade de “educar os jovens”.

Em resposta à paranoia de madame Smith, um internauta observou que “a geração do milênio atingiu a maioridade durante uma época em que o capitalismo sub-regulamentado quase destruiu a economia global” e que os magnatas envolvidos “foram resgatados e ninguém foi preso”. Segundo Oliver Willis, citado pelo Common Dreams”, a surpresa é que “o apoio ao socialismo não seja maior”.

Há quem diga que o quesito “há um espião de Putin debaixo de sua cama” acabou não sendo incluído, mas, provavelmente, quase foi.

O site ‘alt-right’ Daily Caller chamou a atenção para uma das perguntas feitas pela VOC – e, conforme a própria pesquisa, a pergunta existiu. Era sobre quem garante melhor a ‘liberdade e a desigualdade (sic)”, se “a Declaração de Independência” ou o “Manifesto Comunista”. Nos ‘milenares’ o Manifesto perdeu para a Declaração por 19% a 57%. Com um resultado desses, é recomendável olhar de novo debaixo da cama. Nunca se sabe.