Para confirmar o ditado de que mentira tem perna curta, apenas dois dias depois de corrigir para 50 o total de soldados feridos na retaliação iraniana do início do mês, o Pentágono reviu esse número para “64”, conforme repercutiram a CNN e o New York Times.

Recapitulando: no dia da retaliação iraniana contra duas bases aéreas dos EUA no Iraque, após o assassinato ali, pelos EUA, de seu principal líder militar, Trump asseverou que houvera “zero” de baixas. “Nenhum ferido”. “Todos os nossos soldados estão seguros e apenas danos mínimos em nossas bases militares”.

Na semana seguinte, o Pentágono fez primeiro remendo, anunciando “11 feridos” e expondo a mentira do louro e bilionário presidente.

Total que, dias depois, aumentou para “34” e, decorrido menos de uma semana, para “50”.

Antes do próximo retoque na contagem das baixas, vamos registrar que, conforme o Pentágono, dos 64, quase a metade está bastante estropiada: 29.

Oito, depois de uma escala na Alemanha, já foram levados de volta aos EUA, para aquele hospital militar que ficou famoso nos filmes de Hollywood pelas cenas de mutilados, depois que W. Bush resolveu assaltar o petróleo iraquiano, o Walter Reed. Outros 21 estão em Landstuhl, Alemanha, no maior hospital militar norte-americano fora dos EUA.

Há, ainda, o relato de um jornal do Kuwait de 16 soldados levados para o hospital militar de Camp Arjfifan, na base aérea Ahmed Al Jaber, com queimaduras graves ou ferimentos de estilhaços, e tendo que ir para a UTI.

Outra fonte sobre a questão da dimensão das baixas sofridas pelos norte-americanos na retaliação é a entrevista mostrada na TV dinamarquesa 2 de soldados dinamarqueses que estavam na base atingida, Ain al Assad, na província ocidental de Anbar.

Um sargento apenas identificado como “John”, que estava em um bunker, relatou que “os danos haviam sido muito maiores” do que as autoridades norte-americanas admitiram, contando ter visto logo em seguida “metades de helicópteros e buracos tão grandes que você poderia estacionar uma van dentro”.

“De repente, a primeira onda [de mísseis] veio, nove foguetes de quase uma tonelada. Não dá para descrever. Nunca senti nada parecido e espero nunca mais voltar a fazê-lo”. Um míssil caíra a “300 jardas” de seu bunker.

No dia seguinte do ataque de retaliação, o Irã afirmara que nove voos de aviões cargueiros C130 transportaram os feridos mais graves para fora do Iraque e, os menos graves, haviam sido levados de helicóptero para Bagdá e para o Kuwait, onde existe um hospital militar norte-americano.

Na avaliação do resultado do ataque, Teerã estimara em “80 feridos ou mortos” as baixas norte-americanas. De remendo em remendo, o Pentágono já chegou a 64 – todos por “lesões cerebrais traumáticas” ou “concussões”.

No começo, Trump tentou desmentir os desmentidos, dizendo ser só “dor de cabeça”, coisa passageira, como se um míssil explodir em cima de alguém num buraco numa base dos EUA em terra alheia fosse refresco.

O Pentágono precisou remendar, de novo, agora dizendo que “levava muito a sério” as “lesões cerebrais traumáticas”. As associações de veteranos de guerra também se indignaram.

Depois da chuva de críticas a Trump por seus comentários sobre “dores de cabeça”, o chefe do Pentágono, Mark Esper, e o presidente do Estado-Maior Conjunto, Mark Milley, disseram na quinta-feira que os militares levavam esses tipos de lesões “muito a sério”. Esper insistiu em que Trump se preocupa “muito” com a “saúde e bem-estar” dos militares norte-americanos, particularmente os que estavam servindo no Iraque.

NÚMERO CRESCENTE

“O número de feridos está crescendo”, acrescentou Milley, explicando que é preciso “tempo” para diagnosticar e rastrear os soldados presentes na área no momento do ataque.

Segundo o Pentágono, as lesões cerebrais traumáticas nas tropas são frequentemente causadas pela sobrepressão intensa e rápida que se segue a uma explosão nas proximidades. Nos últimos anos, o comando norte-americano fez um esforço “considerável” para entender as lesões cerebrais e seus efeitos duradouros, que às vezes trazem deficiências físicas ou mentais a longo prazo, de acordo com o New York Times.

Não teria havido qualquer tentativa de ocultar informação sobre os feridos, diz o Pentágono, asseverando só ter sido informado dias depois, em função da ausência de feridas visíveis. Segundo o Pentágono, os sintomas de concussões e lesões cerebrais traumáticas geralmente levam “dias ou semanas para aparecer”.

Comentário que sugere que outras levas de soldados em pandarecos estejam a caminho dos próximos comunicados.

Mas a redução das baixas a “lesões cerebrais traumáticas” começa a ser contestado, por militares iranianos, como um encobrimento das baixas reais, inclusive mortes.

“Concluímos que o que os Estados Unidos anunciam estar relacionado a lesões cerebrais causadas pelo ataque a Ain Al Assad é uma metáfora para tropas mortas dos EUA”, afirmou porta-voz da Guarda Revolucionária Iraniana, brigadeiro-general Ramezan Sharif, no jornal iraniano Vatan-e-Emrooz, conforme o portal PressTV.

“Acredito que o termo ‘trauma cerebral’, leve, moderado ou grave, reflita o número de mortos, que eles hesitam em anunciar formalmente”, ressaltou. Para o porta-voz, “lesões cerebrais” é uma expressão incomum e vaga em termos militares, em que todas as tropas feridas, mesmo as leves, são classificadas como “feridas”.

Sharif observou que sua avaliação sobre o número de vítimas norte-americanas se baseou nas informações obtidas – independentemente do fato de que 13 grandes impactos de mísseis iranianos causem “baixas consideráveis” entre as tropas norte-americanas.