Nancy Pelosi exige que Trump “cesse imediatamente su agressão aos Correios e deixe que a eleição de 2020 prossiga sem sabotagem”.

A presidente da Câmara, Nancy Pelosi, convocou os deputados de volta a Washington, em meio ao recesso de verão e às convenções virtuais de democratas e republicanos, para barrar o esquema de sabotagem dos Correios em curso, com que o presidente Donald Trump vem buscando impedir que milhões, sob a pandemia, usem o mecanismo, que existe nos EUA, de voto enviado pelo correio.

A Câmara irá votar no sábado projeto para garantir aos Correios US$ 25 bilhões, para que possa dar conta desse aumento de voto pelo correio.

Para Pelosi, as manobras de Trump para pôr em dúvida a votação por correio – que ele diz que terá uma “gigantesca fraude” – equivalem a um “ataque interno à nossa Constituição”.

Senadores democratas estão exigindo do líder da maioria republicano, Mitch McConnell, que faça o mesmo em relação ao Senado. Entidades pró-direitos civis classificaram essa ação do governo Trump de “tentativa de supressão do voto”. Manifestações estão marcadas para o sábado, junto às agências de Correio, em todo o país.

A nova legislação deverá impedir que o chefe-geral dos Correios, escolhido a dedo por Trump, o megadoador de campanhas republicanas Louis DeJoy, reduza ainda mais o serviço de entrega ou retire mais máquinas de classificação postal.

DeJoy foi convocado pelo comitê de Supervisão da Câmara para testemunhar em 24 de agosto sobre suas “mudanças operacionais e organizacionais radicais no serviço postal” que causaram atrasos generalizados de correspondência no país inteiro.

Sob DeJoy, empresário do setor de logística e integrante do conselho de uma empresa que presta serviços aos Correios, foi diminuída a velocidade de entrega, foram cortadas as horas extras, trabalhadores postais foram forçados a deixar correspondências não entregues se amontoando nas docas de carregamento das agências, o horário de funcionamento foi reduzido em vários estados, foi cortada a comissão dos classificadores de correspondência de alto desempenho e os estados foram comunicados que os envelopes de cédulas eleitorais não serão mais transferidos automaticamente como correio prioritário.

Conforme denúncias, 671 dessas máquinas de classificação, que lidam com envelopes maiores e planos, como os usados para entregar e devolver cédulas de voto, já foram retiradas de operação e colocadas em algum depósito.

Outra forma de sabotagem é a remoção de caixas de coleta de correio das ruas, especialmente nas comunidades de maioria negra ou latina.

DeJoy também comunicou a 46 estados e ao DC (Distrito de Columbia, a capital Washington), que os Correios não têm como garantir a entrega e devolução das cédulas de votação a tempo de serem contadas.

Todas essas questões estão levando seis procuradores-gerais estaduais a prepararem processos contra DeJoy. O Sindicato do pessoal dos Correios teme uma privatização.

Dois deputados democratas pediram ao FBI que investigue a gestão de DeJoy nos Correios, a quem acusam de “precarizar o sistema postal para fins próprios, entre eles a limitação do acesso ao voto por correspondência nas eleições de novembro, para ajudar na reeleição de Trump”.

Como efeito colateral desses atrasos no serviço postal induzidos pela Casa Branca, também está sendo prejudicada a entrega de remédios, cheques de aposentadoria, pagamentos de aluguel e hipotecas e pacotes. Algumas correspondências levam até um mês para serem entregues, mesmo quando os remetentes pagam pelo serviço rápido.

Como a estratégia de Trump – que repete 2016 – é ganhar no colégio eleitoral por pequena margem que seja -, caso muita gente vote, o que na pandemia implica em aumentar o voto pelo correio, a possibilidade de reeleição do presidente bilionário fica bastante rarefeita.

Ainda mais sob recessão: nenhum presidente no último século foi reeleito quando a economia estava no fundo do poço.

Nas pesquisas de intenção de voto, Trump está atrás do democrata Joe Biden, cuja candidatura à presidência será oficializada nesta terça-feira (18), por entre quatro e uma dezena de pontos percentuais.

Ele também está perdendo em estados decisivos, como New Hampshire, Flórida, Pensilvânia, Michigan e Wisconsin – os famosos estados campo de batalha, que em última instância decidem a eleição no colégio eleitoral.

E mesmo em estados que tradicionalmente favorecem os republicanos (“vermelhos”, no jargão político norte-americano), como o Alasca e Texas, está dando empate.

Com esse quadro, mais o desastre completo que foi sua incúria e obscurantismo diante da pandemia, passou a ser fundamental para Trump dificultar que as pessoas votem pelo correio.

Como denunciou o jornal progressista People’s World (Mundo dos Povos), o objetivo de Trump e seus comparsas é impedir que “um tsunami de cédulas anti-Trump enviadas pelo correio por trabalhadores, mulheres, negros e até mesmo veteranos o afogue e enterre suas chances de reeleição”. Temor que é compartilhado por outros líderes republicanos.

Trump também ameaça vetar a dotação de US$ 3,6 bilhões, já aprovada pela Câmara, para que os estados possam arcar com os custos da intensificação do uso do voto pelo correio nessa situação de Covid-19.

Na semana passada, Trump admitiu quase explicitamente que estava se recusando a liberar os recursos necessários para essa votação pelo correio mais volumosa, decorrente da pandemia.

Ameaças que levaram o ex-presidente Barack Obama a reagir, exortando congressistas e cidadãos a tomar medidas para “proteger a integridade” das eleições de novembro. Em entrevista ao podcast de David Plouffe, seu ex-gerente de campanha, Obama classificou tais ameaças de “únicas na história moderna”.

“O que nunca vimos antes é um presidente dizendo: ‘Vou tentar ativamente fraudar os Correios e ser explícito sobre por que estou fazendo isso.’ E não tivemos eleições no meio de uma pandemia que ainda é mortal e está matando muitas pessoas”, sublinhou.

Ainda sobre a questão do voto pelo correio, merece menção o fato de Trump e sua esposa já terem solicitado – adivinhe o quê … o voto pelo correio!

Cinismo que levou a presidente da Câmara Pelosi e o líder da minoria no Senado, Chuck Schumer, a solicitarem ao presidente reality-show que “dê ao povo americano a mesma oportunidade que ele e a primeira-dama solicitaram esta semana para votar por voto ausente”.

Como assinalaram, essa ameaça de Trump de privar ainda mais os Correios dos fundos de que necessita para entregar os votos de ausentes implica em colocar as pessoas diante de “escolher entre a sua saúde e o seu voto neste outono” . Eles exigiram ainda que Trump “cesse imediatamente seu ataque aos Correios e deixe que a eleição de 2020 prossiga sem suas táticas de sabotagem”.