A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado aprovou na quarta-feira (4) a Proposta
de Emenda à Constituição (PEC) 187/2019 que prevê a extinção de fundos públicos e permite
que seus recursos sejam utilizados para pagamento da dívida pública.
A PEC 187/2019 propõe a extinção dos fundos públicos da União, dos estados, do Distrito
Federal e dos municípios criados até 31 de dezembro de 2016, caso não sejam ratificados por
meio de lei complementar específica, até o fim de 2022, prazo em que o Legislativo poderá
avaliar quais fundos são de fato relevantes e essenciais para a realização de políticas públicas.
Hoje existem 281 fundos públicos em todo o país que acumulam quase R$ 220 bilhões. Desse
total, 248 são infraconstitucionais, ou seja, não estão previstos nominalmente na Constituição
e, por isso, podem ser modificados.
O relatório aprovado, do senador Otto Alencar (PSD-BA), traz mudanças em relação ao texto
original. Uma delas busca resguardar fundos que foram criados por lei, mas que têm
obrigações constitucionais, ou seja, que foram criados para operacionalizar vinculações de
receitas estabelecidas pelas Constituições ou pelas Leis Orgânicas dos entes federativos.
Um exemplo é o Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT), destinado ao custeio do seguro-
desemprego e do abono salarial, que poderia ser extinto sem a mudança feita pelo relator.
Também estão na mesma situação os fundos de financiamento do Norte (FNO), do Nordeste
(FNE) e do Centro-Oeste (FCO), criados por lei para regulamentar a Constituição e contribuir
para o desenvolvimento econômico e social.
ACORDO
Após acordo entre os membros da CCJ, o texto final do relator, senador Otto Alencar (PSD/BA),
trouxe uma importante vitória para a comunidade científica e acadêmica, ao retirar da PEC o
Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT), preservando a principal
fonte de financiamento à Ciência, Tecnologia e Inovação (CT&I) do País.
O texto foi aprovado por votação simbólica, sem registro dos nomes, após acordo de
lideranças. Além do FNDCT, foram excluídos da proposta os fundos de Segurança Pública,
Antidrogas e o de Defesa da Economia Cafeeira (Funcafé).
No acordo, o Fundo Nacional de Cultura não foi mantido no texto que irá para plenário, mas o
senador Rogério Carvalho disse que fará emendas de plenário para garantir o FNC e o Fundo
Setorial do Audiovisual (FSA), que hoje sustenta boa parte da atividade audiovisual.
A negociação entre os líderes foi motivada após o voto em separado do senador Rogério
Carvalho (PT-SE), que apresentou dados demonstrando que vários fundos estratégicos, entre
eles o FNDCT, são investidos no desenvolvimento do País.
Ele destacou que os recursos dos fundos ficam parados por decisão política do governo, para
fazer superávit primário, e não por uma ineficiência de execução dos recursos. “Os recursos
não ficam parados no fundo em razão da vinculação das receitas, mas em função das regras de
gastos, especialmente metas de superávit primário, que exige contingenciamento de receitas e
teto de gastos, que limita a despesa, mesmo se houve arrecadação”, disse o senador.

Carvalho mostrou que o Fundo Nacional de Cultura (FNC) e o FSA, possuem uma execução
orçamentária satisfatória, contrariando as criticas sobre a não utilização de recursos.
O parlamentar apresentou dados que mostram que entre 2010 e 2019, o FNC teve um
empenho de 57% do valor previsto na Lei Orçamentária Anual (LOA). O FSA é mantido
sobretudo pela Condecine, que por ser uma contribuição (CIDE) não deixaria de ser cobrada,
mas não seria mais canalizada para um fundo de destinação específica.
O senador ainda defendeu a aprovação de um projeto idealizado pelo senador José Serra
(PSDB-SP) criando lei complementar que contivesse normas gerais para regulamentar o
funcionamento desses fundos, dando prazo para que o Legislativo avalie seus custos e
benefícios. Assim, os [fundos] prioritários continuariam existindo com um desenho operacional
adaptado as novas regras.
A tese recebeu apoio dos senadores Izalci Lucas (PSDB/DF), Alessandro Vieira (PSB/SE),
Jorginho Mello (PL/SC), Antonio Anastasia (PSB/MG), Eduardo Braga (MDB/AM), Veneziano
Vital do Rêgo (PSB/PB), Rogério Carvalho (PT/SE), Major Olímpio (PSL/SP), Randolfe Rodrigues
(Rede/AC), Fabiano Contarato (Rede/ES), Weverton (PDT/MA), Humberto Costa (PT/PE) e José
Serra (PSDB/SP).
FNDCT
Para o presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), Ildeu de Castro
Moreira, a extinção do FNDCT traria graves consequências ao desenvolvimento da ciência
brasileira. “Foi uma vitória significativa da comunidade científica e acadêmica brasileira”,
comemorou o presidente.
Segundo ele, a tramitação da PEC 187 deixou evidente a necessidade de união da comunidade
científica e acadêmica. “A lição principal que tiramos é que se a comunidade estiver unida,
conversar com outros setores, tiver uma posição clara e firme nos princípios de defesa da
ciência e tecnologia, do desenvolvimento mais amplo do País, podemos reverter
posicionamentos contrários, contando, inclusive com senadores da base do governo”.
Gianna Sagazio, diretora de Inovação da Confederação Nacional da Indústria (CNI) e
coordenadora da Mobilização Empresarial pela Inovação (MEI), destacou que o FNDCT é
fundamental para o desenvolvimento do País.
“O FNDCT foi fundamental para o desenvolvimento de projetos de ciência, tecnologia e
inovação estratégicos para o País. Nós tivemos o projeto Sirius, o Reator Multipropósito do
CNPEM, o laboratório de sequenciamento de DNA, os processos industriais do SENAI CIMATEC.
Nós acreditamos que o FNDCT é fundamental para o desenvolvimento do País”.
Segundo aponta a SBPC, entre 1994 e 2019, a Finep – gestora do FNDCT – desembolsou R$
79,09 bilhões para o financiamento de 11 mil projetos. Entre eles, estão os que colocaram a
ciência brasileira na vanguarda mundial, como o Laboratório de Sequenciamento Genômico, o
Navio Polar da Marinha Brasileira, laboratórios da Coppe e ICTs que levaram ao Pré-Sal e o
acelerador de partículas do tipo síncrotron Sirius, o mais avançado da América Latina.