Governadores se reuniram com o ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, nesta terça-feira (8),e cobraram uma ação mais efetiva e clara do governo federal para garantir a vacinação contra a Covid-19. Seis chefes de Executivos estaduais se reuniram, em Brasília, com Pazuello e outros 10 participam de forma remota.

Os governadores criticaram a falta de coordenação do governo federal e cobraram a compra de vacinas e um plano nacional de imunização para o país. O governador do Maranhão, Flavio Dino (PCdoB), também pressiona o governo Bolsonaro por outra frente: ele entrou com uma ação no Supremo Tribunal Federal (STF) para obter autorização para comprar imunizantes aprovados em outros países e fazer um plano estadual, com recursos do governo federal.

Os governadores que foram à Brasília para reunião com Pazuello foram: Wellington Dias (PT), do Piauí; Fátima Bezerra (PT), do Rio Grande do Norte; Paulo Câmara (PSB), de Pernambuco; Gladson Cameli (PP), do Acre; Helder Barbalho (MDB), do Pará; e Ronaldo Caiado (DEM), de Goiás.

O governador de São Paulo, João Doria (PSDB), participou de forma remota e protagonizou o momento mais tenso da reunião com o ministro da Saúde. Os dois discutiram após Doria cobrar o apoio financeiro do governo federal à CoronaVac, que é produzida pela farmacêutica chinesa Sinovac em parceria com o Instituto Butantan.

“O que difere, ministro, a condição e a sua gestão de privilegiar duas vacinas em detrimento de outra? É uma razão de ordem ideológica e política ou é uma razão de falta de interesse de disponibilizar de disponibilizar mais vacinas?”, questionou Doria, que na segunda-feira anunciou a primeira fase do plano de vacinação de São Paulo para o dia 25 de janeiro.

Doria quis saber por que o governo federal assinou Medidas Provisórias bilionárias para comprar os imunizantes produzidos pela Universidade de Oxford com o laboratório AstraZeneca, que no Brasil é desenvolvida em conjunto com a Fundação Oswaldo Cruz (FioCruz) e as do consórcio Covax e ignora a CoronaVac. “Elas também não foram aprovadas pela Anvisa. “Por que excluir se o procedimento é exatamente igual?”, indagou o governador de São Paulo.

“Ministro, eu sempre lhe tratei de forma educada, de forma gentil e de forma fluída, o senhor é testemunha disso. Para a vacina Covax Facility (consórcio internacional coordenado pela OMS), o governo federal lançou um investimento de R$ 2,5 bilhões dos quais o seu ministério já destinou e pagou R$ 830 milhões. As vacinas do consórcio, o senhor inclusive enumerou e nomeou todas elas, não foram aprovadas pela Anvisa. O Ministério da Saúde também, junto à AstraZeneca, anunciou um investimento de R$ 1,284 bilhão e já fez o pagamento de R$ 1,284 pela vacina da AstraZeneca que, igualmente, ainda não foi aprovada pela Anvisa. A vacina do Coronavac não teve nenhum investimento do governo federal. A vacina também não foi aprovada pela Anvisa”, disse Doria.

“Eu só precisava atender a suas demandas paralelas que estavam acontecendo, mas vou bater ponto a ponto. Número 1: com relação à Covax, ela não é uma compra. Nós não compramos R$ 2,5 bilhões de vacinas. Nós aderimos ao desenvolvimento de nove vacinas e demos R$ 800 milhões, conforme o senhor colocou. E o restante dos recursos, que é a compra dos 40 milhões de vacinas, está reservado para comprar a primeira vacina que tiver registrada em condições de compra por aqui. Então, diferente de como o senhor colocou, nós não compramos vacina Covax Facility. Nós entramos num consórcio e só pagamos a parte do desenvolvimento da vacina”, disse o ministro da Saúde.

Pazuello ficou incomodado com os questionamentos de Doria e reagiu dizendo que a vacina do Butantan “não é do Estado de São Paulo”. “Não sei por que o senhor fala tanto como se fosse do estado”, comentou. Para por um ponto final na discussão, o ministro declarou que “havendo demanda e preço, todas as condições serão alvo de nossa compra”.

Doria ainda lembrou o ministro sobre o protocolo de intenções que ele havia assinado para a aquisição de 46 milhões de doses da vacina do Butantan. “Infelizmente, o presidente desautorizou o senhor, foi deselegante com o senhor e em menos de 24 horas impediu que a sua palavra fosse mantida perante os governadores”, disse o governador.

Estratégia Nacional de Imunização

Até o momento, o governo federal divulgou uma estratégia preliminar, dividida em quatro etapas para a imunização contra a Covid-19. Em cada etapa, vai ser vacinada uma parcela diferente de categorias consideradas mais vulneráveis ou expostas ao coronavírus. Mas até o momento o Plano Nacional de Imunização (PNI) voltado para o novo coronavírus não foi divulgado oficialmente. O Ministério da Saúde informou que a expectativa é imunizar 109,5 milhões de pessoas em 2021.

Wellington Dias, governador do Piauí e presidente do Consórcio Nordeste, que representa os estados da região, disse que a posição dos governadores é “colocar a vida em primeiro lugar” e é obrigação “a união de todos” para um plano nacional.

Após a reunião, o governador Paulo Câmara falou sobre a legislação aprovada no Congresso no início da pandemia com regras para agilizar o combate à Covid-19 que prevê a possibilidade de se usarem vacinas que já tenham sido aprovadas por agências internacionais, mesmo antes do aval da Anvisa.

Ontem, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, disse que o Legislativo aprovará um projeto que traça diretrizes para a imunização.

“Tem que avaliar caso a caso, e a própria legislação aprovada este ano já prevê essas cooperações entre as agências reguladoras no mundo tudo”, disse Câmara. “Onde tiver vacina que tenha eficácia, que tenha registro, verifique se esse registro está adequado com a normas brasileiras e vamos vacinar a população. É isso que a gente vai pedir aqui hoje ao ministro”, acrescentou.

Wellington Dias também defendeu que o Congresso aprove a liberação de recursos para vacina e também um plano estratégico. “Não temos restrição a nenhuma vacina. A vacina está autorizada, segura, tem eficiência, essa é a vacina boa para os brasileiros. Segundo, um plano nacional de imunização, comprada com dinheiro do povo brasileiro para todo o Brasil. Terceiro, garantir um cronograma. O que entrega em dezembro, em janeiro, em fevereiro, em março? O ideal é se a gente tiver todos os laboratórios produzindo vacina para o Brasil para que possamos o mais rapidamente sair da crise”, afirmou o presidente do Consórcio Nordeste.

“Se um estado começar isoladamente a fazer vacinação, o Brasil inteiro vai correr para lá. Vai ter uma situação gravíssima. Ou seja, tem que pensar em um plano nacional. O Butantan (parceiro na fabricação da SinoVac) é de São Paulo, mas o Butantan é do Brasil. Há necessidade de que a gente garanta as condições de ter um calendário de vacinação único no Brasil”, disse Welligton Dias.

“Todos recordamos o que houve no Brasil no início da pandemia, com a falta de coordenação nacional do enfrentamento ao coronavírus. Estados e municípios disputando no mercado nacional e internacional insumos, medicamentos e, sobretudo, os respiradores para equipar os hospitais. Isso não pode acontecer de novo com relação às vacinas”, avaliou Paulo Câmara, governador de Pernambuco.

As cobranças também vêm dos prefeitos. A Confederação Nacional de Municípios (CNM) e outras entidades que representam municípios divulgaram uma nota, nesta terça-feira, pedindo para o governo federal comprar e distribuir “todas as vacinas reconhecidas como eficazes e seguras contra a Covid-19”.

Pazuello não se comprometeu a incluir a CoronaVac no PNI e nem a antecipar a vacinação nacional, inicialmente prevista para março. “O PNI (Plano Nacional de Imunização) é nacional. Não pode ser paralelo. A gente tem que falar a mesma linguagem. Nós só temos um inimigo: o vírus. Temos que nos unir”, disse o ministro.

“Todas as vacinas que tiverem sua eficácia e registros da maneira correta na Anvisa, se houver necessidade, vão ser adquiridas. O presidente Jair Bolsonaro já deixou isso de forma clara”, afirmou Pazuello.

Durante a reunião Pazuello disse que até agora já estão asseguradas 300 milhões de doses, que poderiam ser usadas em 150 milhões de pessoas, já que cada indivíduo precisa receber duas doses da vacina.

O problema é que no Brasil vivem mais de 200 milhões de pessoas. Logo, como não haveria necessidade da CoronaVac?

Ignorando a CoronaVac, após a reunião, Pazuello confirmou a compra de 70 milhões de doses da vacina Pfizer que, assim como a do Instituto Butantan, ainda não tem registro na Anvisa. “O governo brasileiro e a Pfizer avançam nas tratativas na intenção de compra de 70 milhões de doses da vacina da Pfizer e BioNTech contra a COVID-19, a ser fornecido em 2021. Os termos já estão bem avançados e devem ser finalizados ainda no início desta semana com a assinatura do memorando de intenção”, afirmou o Ministério da Saúde, em nota.

Mesmo com críticas a Doria, os governadores saíram da reunião ainda preocupados com a data de início da vacinação e buscam com o governo de São Paulo a compra de doses da CoronaVac.

Após a reunião, Camilo Santana afirmou: “A informação do Ministério é da distribuição de 100 milhões de doses da AstraZeneca até junho, com início da vacinação a partir de 3 de março; e mais 160 milhões no segundo semestre. Haveria também negociação de mais 112 milhões de doses de outros laboratórios. Além de buscar parceria com o Governo Federal, estamos tratando da aquisição também com o Governo de São Paulo, através do Instituto Butantan, além de contatos com outros laboratórios, para tentar antecipar esse processo aqui no Ceará”, disse o governador do Ceará.