Em plena pandemia, o ministro da Economia, Paulo Guedes, quer transferir mais de R$ 400 bilhões de lucros do Banco Central (BC) com operações cambiais das reservas para o Tesouro Nacional pagar aos bancos.

Pela lei 13.820 de iniciativa do governo Bolsonaro, aprovada em 3 de maio de 2019, com uma exceção, esse lucro com operações cambiais, que antes era obrigado a ser repassado ao Tesouro, passou a ser alocado em um fundo de reserva, para situações onde o banco realize prejuízos.

A exceção que a lei prevê no Artigo 5º, é que em condições de “severas restrições nas condições de liquidez afetarem de forma significativa o seu refinanciamento”, o Conselho Monetário Nacional (CMN) pode autorizar a transferência do lucro cambial para o pagamento da Dívida Pública Mobiliária Federal interna (DPMFi). O ministro, então, quer se valer desse artigo para transferir esses polpudos bilhões para o rentismo.

Há dentro do governo e do Congresso Nacional vários políticos que entendem que esses recursos deveriam ser destinados para reforçar o caixa do governo no combate à pandemia da Covid-19 e à atividade econômica, inclusive através de investimentos, especialmente, em obras de infraestrutura que estão paralisadas. Certamente não faltaria apoio a uma leia que autorizasse esta destinação.

Pegar o lucro do BC e pagar juros ou amortizar dívida, como quer Guedes, em plena crise sanitária e com o país em recessão, não teria o menor sentido, seria um escárnio. Não há lógica em transformar os bancos e outros rentistas em beneficiários desses recursos, enquanto as desgraças são impostas pela pandemia à maioria da nossa sociedade. A pandemia já tirou a vida de mais de 109 mil brasileiros.

Seria um presente, pagando juros e amortizando dívidas, deixando os bancos, no melhor dos mundos. Juros recebidos, amortização substancial da dívida, ou seja, sairiam da crise com mais lucros realizados, melhor do que quando entraram.

O setor cujos lucros são enormes há décadas, inclusive na depressão da economia em 2015 e 2106, que pouco contribuiu para o enfrentamento da crise, não reduziu em nada suas taxas de juros reais, sairia com vantagem descabida sobre a tragédia da sociedade.

O lucro do BC, de mais de R$ 400 bilhões no primeiro semestre, foi resultado, em mais de 90% dele, da valorização do dólar em relação ao real.

Por exemplo, o dólar custa R$ 1,00 e o banco tem 100 dólares, então o banco tem R$ 100,00. O preço do dólar subiu para R$ 1,20. Se o banco vender seus dólares no mercado ele arrecada R$ 120,00, terá um lucro de R$ 20,00. Essa é a mesma conta feita a partir dos mais de R$ 320 bilhões de dólares de reservas cambiais que o Brasil tem.

Há outras operações, como as de hedge para os exportadores, que também impactam no lucro ou prejuízo do BC, mas de repercussão mínima no último semestre.