Em entrevista ao jornal Pioneiro, a jovem vereadora do PCdoB de Caxias do Sul (RS), Andressa Campanher Marques — que assume o mandato por 15 dias devido ao afastamento, por motivos de saúde, do titular Renato Oliveira (PCdoB) — fala sobre o atual cenário nacional e local, sobre representatividade nos espaços de poder e seus objetivos na política e no período em que estará no legislativo municipal. “Quando olhamos para espaços de poder, como um todo, nos sentimos muito distantes porque a maioria da sociedade não é representada. Temos ainda espaços muito conservadores, atrasados, representam na maioria as pessoas que têm poder aquisitivo. Mas a maioria que trabalha, a juventude, as mulheres, esses setores quase não têm representados ou voz”, diz Andressa.

Confira a íntegra da entrevista:

Andressa Campanher Marques (PCdoB) tem 25 anos, mas, de certa forma, se envolve com política há 11, desde quando assumiu presidência do grêmio estudantil da Escola Província de Mendoza. De 2013 a 2015, foi coordenadora geral do Diretório dos Estudantes (DCE) da Universidade de Caxias do Sul (UCS) e desde 2014 é presidente da União da Juventude Socialista (UJS/Caxias do Sul). Andressa se candidatou para vereadora pela primeira vez em 2016. Em 2020, tentou novamente e totalizou 1.360 votos, ficando na primeira suplência do Partido Comunista do Brasil (PCdoB). Já no primeiro ano da atual legislatura, Andressa assume a vaga do partido na Câmara, após Renato Oliveira (PCdoB) se licenciar por motivos de saúde. No Legislativo, ela quer causar boa impressão, mesmo que o “mandato” seja de apenas 15 dias. Andressa reiterou ao Pioneiro a prioridade em propor suas pautas no curto período que ficará como líder da bancada do PCdoB, especialmente as que envolve juventude e mulheres. Confira trechos da entrevista:

Como surgiu o interesse pela política?

Sempre tive ideia de participar para conseguir contribuir de alguma forma para a sociedade, com uma escola melhor, mais oportunidades para jovens que nem eu, que são filhos de trabalhadores, que não nascem em berço de ouro e temos de correr atrás. Por isso devem existir políticas públicas. Além disso, quando fui presidente do DCE pude também participar de debates externos, do Conselho de Trânsito, de outras discussões municipais que fizeram abrir horizontes do que poderia existir de ações dos governos e discussões mais amplas pela cidade.

Recorde de representatividade feminina na Câmara (seis mulheres, com ela). Também representa a pauta jovem. Como vê essas responsabilidades?

Quando olhamos para espaços de poder, como um todo, nos sentimos muito distantes porque a maioria da sociedade não é representada. Temos ainda espaços muito conservadores, atrasados, representam na maioria as pessoas que têm poder aquisitivo. Mas a maioria que trabalha, a juventude, as mulheres, esses setores quase não têm representados ou voz. Basta ver as discussões que são feitas para percebermos que os principais temas da sociedade muitas vezes não estão presentes. Temos política brasileira voltada para beneficiar pequenos grupos. Se pegarmos governo municipal, são sempre ações e medidas pensando como agradar ou beneficiar o grande empresariado, as pessoas comuns são esquecidas. Por isso, precisamos sempre estar participando, colocando nossa voz, jovens, mulheres. Mas não basta ser jovem, depende das ideias que defende. Posso ter uma jovem que defende ideias atrasadas.

A questão da pauta jovem, muitas vezes não é abordada por parecer “limitada”. Mas não é só o jovem que se beneficia por políticas muitas vezes voltadas a esse público.

Com certeza. Quando a gente fala de “jovem” estamos falando de toda a sociedade. Hoje mesmo as crianças, os adolescentes olham para a realidade e não enxergam perspectiva de futuro, isso quer dizer que há algo errado. Quando formos adultos e idosos, a situação não vai se resolver naturalmente. Uma pesquisa  recente me chamou atenção, demonstrava que quase metade da juventude brasileira quer sair do Brasil. Por quê? Porque não se oferece oportunidade de primeiro emprego, de emprego decente. A gurizada tem de se submeter a coisas desumanas para poder ter oportunidade. Muitos jovens têm de abrir mão de estudar e não falo nem do ensino superior. E o acesso à universidade em momentos de crise e de desemprego obviamente vai ser mais difícil. É muito ruim ser jovem num momento como esse, pois não se enxerga perspectiva.

Quinze dias é um período muito curto. Qual é o seu plano?

A minha ideia é conhecer o funcionamento da Câmara, ter esse diálogo com os vereadores. Pretendemos apresentar indicações, moções e projetos que tenham a ver justamente com a temática de geração de emprego e renda, da juventude e mulheres. Queremos discutir transporte público, habitação, Maesa, arte e cultura.

A ideia é causar boa impressão?

Claro, é também colocar opiniões que podem ser polêmicas, mas precisam ser ditas, como a questão do Bolsonaro, que passamos por momento grave e o governo federal vem sendo alvo de denúncias e a Câmara resolve homenagear o presidente. Acho muito ruim.

Qual a sua opinião a respeito do presidente Jair Bolsonaro?

Ele vem representando um projeto de destruição do Brasil. Para nós, para mim e para os movimentos que eu me aproximo, desde 2018 sabíamos que a eleição dele causaria muitos problemas para o Brasil. Não sabíamos que haveria uma pandemia que acabaria agravando e significaria perda de milhares de vidas e que infelizmente esse governo irresponsável contribuiu para o agravamento da perda dessas vidas. Penso que ele precisa sair da presidência, precisamos tirar o Bolsonaro do governo. E precisamos da vacina, nada além da vacina, não tem nenhum remédio, não existem milagres, precisamos da vacina.

O que pensa do Governo Adiló?

É um governo que não vem mostrando abertura para os movimentos sociais e para a população num geral. É muito fechado, não abre diálogo e que, sempre atende muito interesse dos empresários, da CIC, que são setores majoritários dentro do governo.  Já as questões mais populares, como habitação, transporte público, renda, geração de emprego, não vemos ações efetivas que se preocupem com as demandas mais urgentes da população. Governo Adiló é muito elitizado, atende muito o interesse de uma pequena parcela da população e não olha para Caxias como ela é, com todas as necessidades que existem.

Menciona “projetos”, o que pretende especificamente?

Um deles é relacionado à regularização fundiária e à questão habitacional. Outro tem a ver com acesso ao transporte público para os desempregados. Também estamos discutindo alguma coisa relacionada às mulheres, geração de emprego e renda. São essas as temáticas que pretendemos apresentar e abordar, seja através de projetos ou indicações e moções.

Você defende a pauta do transporte coletivo. O que achou da renovação da concessão com a Visate?

O transporte público é um assunto que não se dá muita atenção e não existe abertura para se discutir com os segmentos interessados. Eu utilizo ônibus quase que diariamente. As demandas que percebemos é desde o fato de os ônibus terem diminuído muito, as pessoas esperam demais. E o valor da tarifa faz com que muitas pessoas escolham transporte por aplicativo. Deveríamos pensar num plano de mobilidade urbana, que também não existe discussão aberta na cidade. Sabemos que mobilidade não é só transporte público, mas transporte público em Caxias tem muita relevância. E não vejo governo municipal querendo resolver ou preocupado com a questão da tarifa ou a qualidade do transporte público.

Boa parte das decisões é de uma maioria que não é usuária?

Sem dúvida, não são usuários, não querem e não se importam com quem é. Não vejo preocupação com querer melhorar ou resolver problemas do transporte público, parece que temos de resolver tudo individualmente, que não é um problema público, uma questão social, parece uma questão individual, mas não é. E se fala muito em uma Caxias grande, desenvolvida, valorização do comércio, turismo, mas como vai se fazer isso se dentro da cidade mesmo não se consegue transitar?

 

(PL)