Cientista Ricardo Galvão, ex-diretor do Inpe.

O ex-diretor do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), Ricardo Galvão, afirmou que ficou surpreso “com o grau tosco que esse governo alcançou”.
O cientista foi exonerado após divulgar dados sobre aumento do desmatamento na Amazônia.
Ricardo Galvão, que depois de deixar o Inpe voltou a fazer suas pesquisas no Instituto de Física da Universidade de São Paulo (IF-USP), disse não ter se decepcionado com o governo Bolsonaro “porque já achava que ia ser um mau governo pelos pronunciamentos dele no passado”. “Fiquei surpreso com o grau tosco que esse governo alcançou. É uma questão de falta total de civilidade republicana”, enfatizou.
Em agosto, o Inpe divulgou dados obtidos por satélites que apontavam o aumento do número de focos de incêndio na Amazônia. Jair Bolsonaro declarou ter “a convicção que os dados são mentirosos” e que Ricardo Galvão estava “a serviço de alguma ONG”. O ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, endossou a posição de Bolsonaro.
Em entrevista ao UOL, Ricardo Galvão disse que o ataque não era apenas pessoal, “era muito maior, era um ataque à ciência brasileira, demonstrando uma soberba autoritária fortíssima do governo. Infelizmente, uma soberba embasada na ignorância profunda”.

Para Galvão, Salles “não tem qualificação nenhuma” para chefiar o Ministério. “O ministro Ricardo Salles não só não é qualificado para o cargo como ele tem essa atitude negacionista”. “Ele não é ministro do Meio Ambiente. Parece ministro contra o meio ambiente”, afirmou.
“Temos o exemplo agora das manchas de óleo. É claro que a mancha de óleo não saiu por causa do governo Bolsonaro, mas ele demorou 41 dias para acionar o sistema de emergência. Eles são ineptos”, continuou o cientista.
“Por que demorar 41 dias e começar a atacar a Venezuela? Isso é uma infantilidade. Não tomaram as ações. Não tomaram a tempo as medidas que deveriam ter tomado”.
“Infelizmente existe um círculo em torno do presidente Bolsonaro que é muito negacionista em relação à ciência. As próprias declarações do chanceler Ernesto Araújo nos envergonham completamente [por] falar contra o aquecimento global usando argumentos ridículos”.
“O próprio presidente Bolsonaro, ao usar como guru esse senhor Olavo de Carvalho, que é a negação total da ciência, é muito preocupante. Ele e seus filhos”, afirmou Galvão.
Ricardo Galvão atribuiu “ao discurso do presidente Bolsonaro e de seu grupo próximo” o aumento das queimadas e do desmatamento.
Somado a isso, “o Ibama [Instituto Brasileiro do Meio Ambiente] foi todo desestruturado. Muitos especialistas muito importantes que atuavam no Ibama foram demitidos, muitos deles formados no próprio Inpe. Várias chefias regionais do Ibama foram retiradas e não foram trocadas”, argumentou.
“Além daquele discurso muito intenso do ministro Ricardo Salles de que o desenvolvimento econômico se contrapõe à preservação da Amazônia”.
Para Galvão, Bolsonaro mente ao dizer que a educação é prioridade em seu governo. “É só da boca para fora. Não tem sido prioridade de jeito nenhum. A educação, inclusive, nós vemos pelos ministros indicados… Melhor nem comentar. Uma coisa terrível o que tem sido feito”.
O pesquisador também denunciou o desmonte que o Inpe tem sofrido. “O Inpe há dez, doze anos tinha cerca 1.300 servidores. Quando saí, tinha da ordem de 780, [sendo que] 250 já com o abono permanência, quer dizer, eles recebem mais para não se aposentar. Mas, se quiserem aposentar amanhã, podem fazê-lo”.
“Se esses 250 se aposentarem, agora pararia [de funcionar]”, disse.
Galvão afirmou que o ministro da Ciência e Tecnologia, Marcos Pontes, “é muito débil quando trata com o governo. Ele devia ter um enfrentamento muito mais forte, muito mais assertivo com o governo na questão da ciência e tecnologia”.