Para desembargadora, “há fundamentos concretos” contra Crivella
A desembargadora Rosa Helena Penna Macedo Guita, do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJ-RJ), afirmou que há “indícios mais do que suficientes [para a prisão de Crivella]”.
“As facilidades obtidas junto à Prefeitura jamais teriam sido alcançadas se não houvesse a expressa conivência do sr. prefeito”, afirmou a desembargadora no ofício de 11 páginas que foi encaminhado ao Superior Tribunal de Justiça (STJ), com o objetivo de esclarecer a sua decisão de determinar a prisão do prefeito afastado do Rio, Marcelo Crivella (Republicanos).
Crivella é também pastor da Igreja Universal do Reino de Deus.
A desembargadora argumentou que há “provas abundantes” que colocam Crivella na condição de chefe da organização criminosa montada para desviar recursos públicos.
“E como se não bastasse, há prova nos autos de que o sr. prefeito, pessoalmente, determinou a um secretário que realizasse um pagamento irregular, já que este hesitava a fazê-lo. Nos autos ainda constam diversas trocas de mensagens (…) sobre partilha de propina e exigência, junto ao próprio prefeito, de obtenção de retorno financeiro do investimento que nele havia sido feito, em franca alusão ao dinheiro gasto na sua campanha eleitoral”, escreveu Rosa Helena.
A manifestação Rosa Helena sobre o caso se deu após o presidente do STJ, Humberto Martins, cobrar explicações sobre a prisão de Crivella. A magistrada foi responsável por determinar a prisão de Crivella, na última terça-feira (23), sob acusação dele chefiar o “QG da Propina” na Prefeitura da capital fluminense.
No entanto, o bispo da Igreja Universal do Reino de Deus foi colocado no mesmo dia em prisão domiciliar, com tornozeleira eletrônica, por decisão do presidente do STJ.
No documento, a desembargadora afirma que o argumento de que a soltura de Crivella não colocaria em risco a ordem pública é o mesmo que “querer fechar os olhos à realidade dos chamados crimes do ‘colarinho branco’”.
Rosa Helena também afirmou que o doleiro Sérgio Mizrahy, em sua delação premiada, narrou com “riqueza de detalhes” o esquema criminoso comandado por Crivella, que envolvia, além de operadores, membros da administração municipal, empresários e pessoas físicas e jurídicas que atuavam no esquema como “laranjas”.
No documento, Rosa Helena Macedo resumiu todas as provas existentes contra Crivella. “As estreitas ligações entre ele e aquele que foi apontado por todos como o operador financeiro do esquema criminoso, Rafael Alves, está mais do que demonstrada nos autos e no decreto de prisão”.
A desembargadora também afirmou para o presidente do STJ que a prisão preventiva era necessária, pois o prefeito teria atuado para obstruir as investigações. Conforme provas colhidas na investigação, aponta a magistrada, a organização criminosa teria pressionado os empresários a manter os pagamentos de propina e a desaparecer com os vestígios dos crimes.
“A alegação dos impetrantes [dos advogados de Crivella] de que o término do mandato do Prefeito, ou até mesmo o seu afastamento das funções públicas, importaria na cessação de risco à ordem pública não procede, na medida em que também se imputa ao paciente o crime de lavagem de dinheiro, que, ao que tudo indica, por ele vem sendo realizado de modo bastante eficiente”… “Logo, afirmar que não há risco à ordem pública, s.m.j. [salvo melhor juízo], é querer fechar os olhos à realidade dos chamados crimes do ‘colarinho branco’”, escreveu a desembargadora.
Além disto, Rosa Helena cita o caso da apreensão de um telefone celular com Crivella que, segundo laudo da perícia, não pertencia ao bispo.
“Se o paciente não tivesse nenhum envolvimento com o ilícito, não teria entregue ao Oficial de Justiça, quando do cumprimento do mandado de busca e apreensão em sua casa, um aparelho de telefone celular que não lhe pertencia (…). O Sr. Prefeito, a um só tempo, não só reforçou, com tal proceder, os indícios de autoria na sua pessoa, como também demonstrou a sua clara intenção em obstruir a colheita da prova”, escreveu.
Sobre estas duas acusações que fundamentaram a prisão preventiva, a desembargadora conclui que “trata-se, portanto, de fundamentos concretos e objetivos, todos eles calcados em fatos recentemente ocorridos e absolutamente documentados nos autos, não havendo que se falar em ilações, presunções ou em antecipação de pena, como alegam os impetrantes”, frisou Rosa Helena.
Rosa Helena afirmou também que apenas a prisão domiciliar com tornozeleira eletrônica pode ser insuficiente para impedir que Crivella cometa crimes.
“Ora, se o paciente já burlou uma vez a ordem judicial de busca e apreensão, usando de expediente maliciosamente planejado com tal finalidade, já que comprovado pericialmente nos autos que o celular fake, por assim dizer, chegou às suas mãos na véspera do cumprimento da diligência, cuja realização evidentemente ‘vazou’, sendo levada ao seu conhecimento, nada pode garantir que não o fará novamente, não obstante todas as cautelas já determinadas. Até porque em contato com familiares que dispõem livremente de meios de comunicação próprios, os quais podem lhe ser momentaneamente cedidos. Sem contar a possibilidade de entrega por meio de delivery, dentre tantas outras hipóteses possíveis”, alertou a desembargadora.
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(PL)