A Associação Brasileira de Imprensa (ABI) divulgou manifestação em que critica a nota divulgada pelos militares e se solidariza com o senador Omar Aziz (PSD-AM), presidente da CPI da Pandemia. Para a ABI, a reação de militares do alto escalão a declarações de Aziz nesta quarta-feira (8) foi “lamentável” e uma tentativa de intimidar a CPI e o parlamentar.

Ontem, durante os trabalhos da CPI, que ouviu o ex-diretor de Logística do Ministério da Saúde, Roberto Dias, Aziz disse que “fazia muitos anos” que o Brasil não via “membros do lado podre das Forças Armadas envolvidos com falcatruas”. Foi uma sessão tensa, que terminou com o presidente da comissão dando voz de prisão a Dias por mentir em seu depoimento.

As investigações da CPI sobre o esquema de vacinas superfaturadas envolvem militares como o coronel Elcio Franco, secretário-executivo do Ministério da Saúde durante a gestão do general Eduardo Pazuello, e o coronel Guerra, da Aeronáutica, contato nos Estados Unidos do ex-PM Luiz Paulo Dominguetti, que negociava vacinas com o ministério.

Em resposta às declarações de Omar Aziz, o Ministério da Defesa divulgou nota dizendo que o presidente da CPI foi “leviano” e fez uma acusação “grave, infundada e, sobretudo, irresponsável” às Forças Armadas. Após a divulgação do comunicado, Aziz disse no plenário do Senado que sua fala foi pontual e que não se intimidaria pela nota.

A nota traz a assinatura de Walter Braga Netto (ministro da Defesa); almirante Almir Garnier Santos (comandante da Marinha); general Paulo Sérgio Nogueira de Oliveira (comandante do Exército); e brigadeiro Carlos de Almeida Baptista Junior (comandante da Força Aérea).

Na avaliação da ABI, com a manifestação, o ministro da Defesa e os comandantes militares “protegem militares suspeitos de envolvimento com corrupção”.

“Note-se que não houve qualquer acusação às Forças Armadas em si. Surgiram apenas nomes de militares isolados e nem mesmo eles foram acusados por Aziz. Simplesmente depoimentos de terceiros trouxeram seus nomes à baila. Como era lógico, a CPI considerou conveniente convocá-los para depor. Foi o que bastou para que os chefes militares se alvoroçassem”, diz um trecho do texto divulgado pela Associação Brasileira de Imprensa.

A nota prossegue afirmando que “não interessa” aos brasileiros ver as Forças Armadas, como instituições de Estado, “enxovalhadas”, mas “é preciso que se deem ao respeito”, do contrário elas próprias estão contribuindo para seu desgaste.

“Não é razoável por exemplo, que, diante da constatação de que o general Eduardo Pazuello participou de um ato político em apoio a Jair Bolsonaro, o Exército aceite a versão de que aquilo não passou de um passeio de motocicleta. E, em seguida, estabeleça sigilo por cem anos (sim, cem anos!) para a publicidade de qualquer investigação sobre o caso”, critica a nota.

O texto diz que não há razão para que se deixe de investigar as acusações relacionadas às vacinas e que todos que defendem a lisura em relação à coisa pública devem se solidarizar com Omar Aziz.

Confira a nota na íntegra:

A nota divulgada ontem pelos comandantes militares é lamentável. Foi uma tentativa de intimidar a CPI da Pandemia e seu presidente, o senador Omar Aziz, protegendo militares suspeitos de envolvimento com corrupção.

Note-se que não houve qualquer acusação às Forças Armadas em si. Surgiram apenas nomes de militares isolados e nem mesmo eles foram acusados por Aziz. Simplesmente depoimentos de terceiros trouxeram seus nomes à baila. Como era lógico, a CPI considerou conveniente convocá-los para depor.

Foi o que bastou para que os chefes militares se alvoroçassem.

Ora, as Forças Armadas são instituições de Estado necessárias a um país soberano. Não interessa a qualquer brasileiro vê-las enxovalhadas. Mas é preciso que se dêem ao respeito. Ou elas próprias estarão contribuindo para o seu desgaste.

Não é razoável por exemplo, que, diante da constatação de que o general Eduardo Pazuello participou de um ato político em apoio a Jair Bolsonaro, o Exército aceite a versão de que aquilo não passou de um passeio de motocicleta. E, em seguida, estabeleça sigilo por cem anos (sim, cem anos!) para a publicidade de qualquer investigação sobre o caso.

Isso ajuda a imagem das Forças Armadas? É evidente que não.

É preciso repetir: a CPI da Pandemia não fez qualquer acusação ao Exército, à Marinha ou à Aeronáutica. Simplesmente está apurando os fatos, que são gravíssimos, trazendo elementos para posteriormente responsabilizar quem cometeu atos de corrupção. Sejam civis ou militares.

Afinal, vivemos numa república. Todos são – ou deveriam ser – iguais perante as leis.

Tudo indica que dois grupos disputavam o controle das compras no Ministério da Saúde: um, formado por parlamentares do chamado Centrão; outro, integrado por militares, levados por Jair Bolsonaro e Pazuello.

Não há razão para que se deixe de investigar as acusações num momento em que está claro que a demora na aquisição de vacinas não foi fruto apenas de incompetência. Foi um artifício para, depois, numa situação emergencial, negociar a preços superfaturados com outros fabricantes, com quem se tinha esquemas de corrupção.

Por isso o atraso na aquisição de vacinas. Este crime contribuiu para a morte de mais de meio milhão de brasileiros.

Assim, num momento em que, talvez por corporativismo, os chefes militares tentam intimidar o senador Aziz, todos os que defendem a lisura em relação à coisa pública devem se solidarizar com ele.

É o que faz hoje a ABI, entidade com 113 anos de história em defesa das boas causas do povo brasileiro.

Rio de Janeiro, 8 de julho de 2021

Paulo Jeronimo – Presidente da Associação Brasileira de Imprensa