Papa em Bagdá: “que cessem os interesses externos no Iraque”
O Papa Francisco chegou ao Iraque nesta sexta-feira (5) e foi recebido pelo primeiro-ministro Mustafa al Kazemi, no Aeroporto Internacional de Bagdá.
É a primeira vez que um chefe da Igreja Católica chega ao país, que é majoritariamente muçulmano.
Na viagem, que tem como lema “somos todos irmãos”, ênfase na mensagem da fraternidade inter-religiosa, Francisco se propõe percorrer as principais regiões do país.
Em mensagem aos iraquianos, antes de embarcar, o papa afirmou: “Obrigado pelo seu testemunho. Que os muitos, demasiados mártires que vocês conheceram nos ajudem a perseverar na humilde força do amor. Gostaria de lhes trazer o carinho afetuoso de toda a Igreja, que está próxima de vocês e ao mortificado Oriente Médio e os encorajar a seguir em frente”, disse.
Também lançou uma advertência para países e setores internacionais que não devem “impor interesses ideológicos e políticos”, numa defesa da soberania do país no qual se hospedará nestes dias.
“Que cessem os interesses particulares, esses interesses externos que são indiferentes à população local”, defendeu em mais uma referência, ainda que não literal, à ingerência dos Estados Unidos e outros países por declarado interesse em se apropriar do petróleo e das riquezas do Iraque.
Francisco sempre se opôs à guerra no Iraque de 2003, promovida sob a mentirosa acusação de que o governo de Saddam Hussein detinha e desenvolvia armas de destruição em massa. O então arcebispo Jorge Bergoglio chegou inclusive a abençoar uma tenda na Praça de Mayo, em Buenos Aires, que protestava contra o conflito e pedia paz, lembrou a agência Télam. A tenda media 10 metros por 10 metros e era coberta por uma bandeira argentina. Dentro, além das velas, havia três pôsteres com uma palavra escrita em cada um: Paz, Salam e Shalom. O mesmo conceito, em espanhol, hebraico e árabe, escrito em letras brancas. Desde Roma, Bergoglio monitorava o movimento da tenda já que mesmo dentro dos muros do Vaticano o movimento pacifista contra a guerra era sentido e encorajado.
“O nome de Deus não pode ser usado para justificar atos de homicídio, exílio, terrorismo e opressão”, afirmou em seu primeiro discurso em Bagdá. “Também no Iraque a Igreja Católica deseja ser amiga de todos e, através do diálogo, colaborar de maneira construtiva com as outras religiões, pela causa da paz”, assinalou.
A visita do pontífice argentino ao Iraque será marcada pela ausência de multidões e o levará a utilizar um automóvel blindado em seus deslocamentos.
Apenas no estádio de Erbil, com capacidade para 20.000 pessoas, ele falará para 4.000 fiéis na missa dominical, segundo fontes locais.
“Anseio conhecê-los, ver seus rostos, visitar sua terra, antiga e extraordinária, berço da civilização”, afirmou o pontífice, que deseja cumprir o sonho do papa João Paulo II, que não conseguiu viajar ao Iraque.
“Vou como um peregrino da paz em busca da fraternidade, animado pelo desejo de rezar juntos e caminhar juntos também com irmãos e irmãs de outras religiões”, ressaltou, em referência ao país predominantemente muçulmano.
Os cristãos eram 1,5 milhão entre 25 milhões de iraquianos em 2003, quando a intervenção dos Estados Unidos derrubou Saddam Hussein. Hoje as cifras são estimadas entre 150.000 e 300.000 sobre um total de 40 milhões de cidadãos.
Ao todo, está previsto que o Papa pronuncie sete discursos, todos em italiano.
No sábado (6), está previsto em Najaf um encontro com o líder espiritual dos xiitas no Iraque (cerca de 60% da população): o grão-aiatolá Ali Sistani, uma das figuras de referência do país.
Sistani, de 90 anos, não aparece em público e quase não recebe visitas e o encontro foi altamente apreciado pela comunidade xiita, cujas tropas suspenderam qualquer ato agressivo durante a visita do pontífice.
Francisco fará todos seus deslocamentos nas cidades que visitará (Bagdá, Mossul, Arbil, Najaf, Qaraqosh) a bordo de um carro blindado e coberto (normalmente se desloca em carros comuns ou numa espécie de conversível). A segurança, especialmente porque a rota é conhecida há bastante tempo, foi reforçada em todos os locais pelos quais passará.
A Bíblia aponta que a antiga cidade de Ur – onde o papa Francisco rezará no sábado – é o local de nascimento de Abraão, pai das religiões abraâmicas, que incluem o cristianismo, o judaísmo e o islamismo.