Apesar da queda no número de casos e mortes por Covid-19, o Brasil ainda corre o rico de viver mais uma onda da pandemia. Segundo a Fiocruz, o País vive uma leve tendência de crescimento nos casos de Síndrome Respiratória Aguda (SRAG) em adultos, embora ainda baixos.

De acordo com especialistas, a tendência é que não haja, nos próximos meses, um repique da crise sanitária. É preciso, no entanto, aumentar as coberturas vacinais da terceira dose, que hoje contempla pouco mais de 41% da população, e da quarta dose, que foi aplicada em apenas 16% dos idosos com mais de 80 anos, conforme dados do Ministério da Saúde.

“Temos um alto percentual com duas doses, o que segura contra hospitalização e óbito, mas não é o ideal. Temos muitas pessoas sem a terceira e a quarta dose, que estão mais em risco”, avalia a microbiologista Natalia Pasternak, presidente do Instituto Questão de Ciência. “As pessoas não estão voltando para o reforço porque perderam a sensação de urgência, já que estamos nesse cenário melhor. Mas, em uma população que não consegue atingir um percentual elevado de vacinação, a doença segue circulando e eventualmente chega nos mais vulneráveis.”

Para os especialistas, o momento para se pensar em medidas que previnam o País de um novo cenário de altas é agora. Afinal, falar sobre intensificar a vacinação quando os hospitais estiverem cheios pode não ser tão eficaz. “Acelerar a vacinação não é algo que acontece de uma semana para outra”, diz o médico geneticista Salmo Raskin, diretor do laboratório Genetika, de Curitiba. “Temos de nos prepararmos para evitar problemas daqui a dois três meses. Não adianta falar sobre isso quando estivermos numa onda com aumento nos números.”

No Brasil, o primeiro reforço, ou terceira dose, é recomendado pelo Ministério da Saúde a todos acima de 18 anos e adolescentes imunossuprimidos, no período de quatro meses após a segunda dose. Para Natalia, o surgimento de novas variantes comprovou que o esquema vacinal deve ser considerado completo apenas com as três aplicações.

Embora a cobertura esteja elevada entre os mais idosos, chegando a quase 90% dos mais de 70 anos, ela ainda é considerada baixa em outras faixas etárias. Entre aqueles com 18 a 35 anos, nem 40% receberam a aplicação. E isso impacta diretamente a proteção a nível nacional.

Em janeiro, o Brasil tinha 67,4% da população com as duas doses. Hoje, apesar de ser esperado um percentual semelhante com a terceira, apenas 41% dos brasileiros buscaram o reforço. Além disso, desde que a situação sanitária começou a melhorar, após o pico da Ômicron, o ritmo de vacinação está cada vez mais baixo. No meio de janeiro, o País tinha uma média elevada de 740.713 aplicações diárias de doses de reforço. Já na última semana de abril, esse índice havia caído para uma média de 176.938 doses aplicadas por dia – uma queda de 76% no ritmo de imunização.

“Nesse contexto, em que não temos previsão de quando aparecerão novas variantes, e como elas serão, a gente precisa de uma cobertura ampla para se preparar. Se não estivermos todos protegidos com a vacinação, poderemos ter consequências graves nos próximos meses”, alerta a imunologista e doutora em Biociências e Fisiopatologia, Letícia Sarturi.

Para ampliar esse percentual, os especialistas defendem que é responsabilidade do governo promover campanhas publicitárias, buscas ativas por telefones e contatos de e-mail e outras estratégias de comunicação que lembrem quem ainda não se vacinou a importância de atualizar o esquema. “Isso do ‘depois eu faço’ acaba prejudicando muito a vacinação. Muita gente que está devendo essa dose não é por medo, mas porque está acomodada em relação a essa atualização”, afirma Natalia Pasternak.

Os especialistas reforçam também que o número de idosos acima de 80 anos vacinados com a quarta aplicação ainda é extremamente baixo. Esse é um grupo naturalmente de risco e responde pior às vacinas – por isso a importância de um segundo reforço. Hoje, a cobertura nesse público não chegou nem a 18%. Entre aqueles com 70 a 79 anos, esse percentual segue abaixo de 10%.

A maior ameaça hoje ao cenário epidemiológico positivo do país seria o surgimento de uma nova variante que escapasse totalmente à imunidade conferida pela vacina ou por infecção prévia, ou que causasse quadros mais graves da doença. Uma maneira de evitar o surgimento dessas novas variantes é justamente intensificar a imunização, inclusive a de crianças, que ainda estão com uma baixa cobertura no Brasil. “E eventualmente vamos ter que ampliar a terceira dose também para essas crianças e adolescentes aqui, como foi solicitado recentemente nos EUA”, destaca Raskin.

Os especialistas também chamam a atenção para o fim do uso da máscara em locais de riscos como fatores que podem provocar um aumento nos casos. “Precisamos de uma campanha educativa para que as pessoas entendam que elas são importantes em locais como transportes públicos e ambientes fechados sem ventilação e com muita gente, locais de risco”, defende Natalia.

Além disso, eles apontam a queda na testagem, que leva muitas pessoas a circularem nas ruas sem saber que estão contaminadas, como um ponto negativo. Segundo dados da Associação Brasileira de Redes de Farmácias e Drogarias (Abrafarma), houve uma redução de mais de 81% na realização de testes entre janeiro e março deste ano.

Com informações do O Globo