Otan: sanções contra Rússia podem fazer Europa racionar combustível
A atual crise de energia pode ser uma das piores e mais longas da história e os países europeus podem ser atingidos de forma particularmente dura, disse na terça-feira (31) o chefe da Agência Internacional de Energia (IEA), Fatih Birol.
Em entrevista à revista alemã Der Spiegel, Birol disse que as consequências dos eventos na Ucrânia provavelmente tornarão a atual crise de energia pior do que as crises da década de 1970.
“Naquela época, era tudo sobre petróleo. Agora, temos uma crise de petróleo, uma crise de gás e uma crise de eletricidade ao mesmo tempo”, disse Birol à publicação, acrescentando que antes dos eventos em curso na Ucrânia, a Rússia era “a pedra angular do sistema energético global: o maior exportador de petróleo do mundo, o maior exportador de gás do mundo, um dos principais fornecedores de carvão.”
Como parte de suas sanções relacionadas à Ucrânia, a União Europeia introduziu restrições aos combustíveis fósseis russos e prometeu eliminá-los gradualmente. O carvão será banido em agosto; o petróleo, em 90% até dezembro e os derivados de petróleo, até fevereiro, com exceção do transportado pelo oleoduto Druzhba; o gás, segundo a previsão da UE, dois terços até o final do ano e o restante, até 2030.
Birol alertou que os países da Europa que são mais dependentes do gás russo estão enfrentando um “inverno difícil”, pois “o gás pode ter que ser racionado”, inclusive na Alemanha.
Seus comentários vieram quando a Gazprom, fornecedora estatal de gás da Rússia, cortou por falta de pagamento o fornecimento de algumas empresas de energia na Alemanha, Dinamarca, Holanda e outros países, após recusarem o novo mecanismo de pagamento via rublos.
O chefe da IEA aconselhou os países da UE a adquirirem o máximo de gás adicional possível, por exemplo, gás de gasoduto da Noruega ou do Azerbaijão e GNL. De acordo com Birol, as usinas a carvão também podem substituir parcialmente as usinas a gás.
O próximo verão – que começa em 21 de junho no hemisfério norte – pode ser difícil também na UE e nos EUA, devido “aos mercados de petróleo bruto apertados”, disse Birol. Ele alertou que, quando a alta temporada de férias começar, a demanda por combustível aumentará, levando a “gargalos, por exemplo, com diesel, gasolina ou querosene, especialmente na Europa”.
Em março, a IEA desenvolveu um plano que prevê a introdução nas cidades de tráfego livre de carros aos domingos, preços mais baixos para o transporte público e, na Alemanha, significativos limites de velocidade nas autoestradas.
Sinal vermelho
Uma interrupção abrupta nas entregas de gás natural russo poderia desencadear uma recessão na Alemanha comparável aos anos de crise econômica de 2020 e 2009, se não pior, de acordo com estudo do economista Tom Krebs, do Instituto IMK, Universidade de Mannheim.
Tal embargo, seja desencadeado pela União Europeia ou pela Rússia, levaria a uma queda na produção nos primeiros 12 meses entre 114 bilhões de euros e 286 bilhões de euros, correspondendo a cerca de 3% a 8% do Produto Interno Bruto (PIB), segundo o documento.
A produção econômica na maior economia da Europa poderia cair mais de 2% a 4% como resultado da queda da demanda devido aos altos preços da energia.
Krebs enfatizou que seis indústrias alemãs são particularmente dependentes do gás natural: produtos químicos, em particular produtos químicos básicos; produção e processamento de metais, assim como fundição, vidro e cerâmica;
alimentos; papel; engenharia mecânica e fabricação de veículos. “Para estes setores industriais, o gás natural é um insumo essencial no processo de produção e é difícil de substituir”, disse o economista.
Na segunda-feira, o primeiro-ministro húngaro Viktor Orbán disse que “toda a Europa está dançando à beira de uma crise econômica global devido às sanções” introduzidas pelo Ocidente contra a Rússia. Ele acrescentou que Budapeste conseguiu rejeitar a proposta da Comissão Europeia de proibir o uso de petróleo russo na Hungria.
“Já temos problemas suficientes sem isso. Os preços da energia estão altos, a inflação está alta e toda a Europa está dançando à beira de uma crise econômica global devido às sanções. Sob tais circunstâncias, seria insuportável para nós ter que administrar o Economia húngara com petróleo mais caro. Isso seria como uma bomba atômica. Mas isso foi evitado”, assinalou.
Segundo o dirigente húngaro, durante o encontro em Bruxelas para decidir um novo pacote de medidas punitivas contra Moscou, ficou acordado que “os países que recebem petróleo por oleodutos podem continuar operando nas antigas condições”. “As famílias podem dormir em paz esta noite”, concluiu Orbán.
A ministra da UE, Margrethe Vestager, disse ao jornal alemão Handelsblatt na semana passada que os consumidores europeus terão que tolerar aumentos permanentes de preços de energia, já que o continente quer se tornar independente das importações russas.
“Uma parte significativa da indústria europeia depende de energia ultrabarata da Rússia, mão de obra chinesa superbarata e semicondutores altamente subsidiados de Taiwan. A Europa sabia desses riscos, mas mostrou ganância”, disse Vestager.
Segundo a ministra, os Estados europeus não podem simplesmente aceitar tais dependências como parte do acordo. “A Europa deve diversificar seu comércio e aceitar preços mais altos… os consumidores teriam que pagar por essas mudanças”, disse ela. Vestager expressou esperança de que a compra de gás natural liquefeito pela UE possa ajudar a conter parcialmente a alta dos preços.
Analistas têm comparado o embargo do petróleo russo pelo bloco – para se sujeitar aos EUA e sua provocação à Rússia via expansão da Otan a leste – a um “tiro no pé”, enquanto consideram o embargo do gás equivalente a um tiro na cabeça