Orlando Silva: Por que Lula deu uma canelada no PCdoB?
Hoje (quinta-feira, 16/1) cedo, um camarada me alertou: “Lula foi desrespeitoso com o Partido”. Reagi: “Deve ser fake news!” Minha reação foi a mesma que a maioria dos nossos teria diante de um registro desses. Lula é muito querido entre os comunistas. Fui ver a entrevista. E, quando entra em tela o nome de Flávio Dino, o presidente nos brinda, para a minha surpresa, com frases absolutamente dispensáveis.
As pérolas: “O PT é um partido muito grande se comparado ao PCdoB”; “É difícil eleger um comunista e Flávio sabe disso”; e “É muito difícil eleger alguém de esquerda sem o PT”. As mesmas frases ditas por um analista político dispensariam qualquer comentário. Mas, sendo proferidas por Lula, merecem atenção.
O presidente estava num ambiente controlado, sem estresse e pôde desenvolver seus raciocínios com clareza e sem pressão. Lula, como ele próprio disse, sempre contou com o apoio do PCdoB (ele disse quatro vezes, mas na verdade foram cinco). O PCdoB é o único partido que o apoiou em todas as suas campanhas presidenciais.
O presidente Lula considerar difícil a eleição de um comunista para presidente não surpreende – afinal, ele considerava impossível uma vitória para o governo do Maranhão. Flávio Dino foi eleito e reeleito governador sem seu apoio. Mas qual a utilidade de reforçar a retórica anticomunista?
Que o PT é “grande” em relação ao PCdoB não chega a ser uma “descoberta”. O PT é o maior partido político do Brasil – e já conquistou uma rejeição da mesma proporção. Aliás, essa é a principal explicação para ter sido derrotado por um candidato nanico, Jair Bolsonaro, de um partido então minúsculo, o PSL.
Esquerda vencer sem PT? Impossível! Claro! E se um partido de esquerda não estiver aliado ao PT? Esteja certo de que esse partido nem era tão de esquerda assim… Esse raciocínio conhecemos desde o final dos anos 70 do século passado.
Flávio Dino é a novidade da esquerda brasileira. Cresceu sem “dedaço” e não incubado por nenhum grande líder. A sua competência já está à mostra no governo do Maranhão. Sua capacidade política é reconhecida até pelos adversários. Flávio Dino opera a política de frente ampla que o PCdoB elaborou, mas aplica com timidez sob os olhares severos e críticos dos “companheiros”.
Anote aí: o elogio do presidente Lula a Flávio Dino é como um “abraço de urso”. Daí ser adequado Flávio saber o ponto exato de proximidade – ou será esmagado.
A canelada do presidente Lula no PCdoB ou é um teste para as vértebras dos comunistas ou uma recaída após lembranças da chapa Osmar-Batista-Alemão? De qualquer modo, requer uma resposta fria, como a boa diplomacia ensina.
Assistindo às falas do presidente Lula, fiquei um pouco triste, mas bola pra frente! Ah! E lembrei de Criolo, em Demorô: “Onde falta respeito / A amizade vai pro lixo (…) / Muda essa roupa, corta esse cabelo”.