Orlando Silva: Hora de jogar para ganhar, unidade já!
“A unidade é a bandeira da esperança”. A célebre frase de João Amazonas, dirigente histórico do PCdoB, encerra mais do que uma diretriz a ser perseguida ao fazer política. Ela condensa o aprendizado histórico do partido mais antigo do país, o único a sobreviver a duas ditaduras abertas, a participar dos processos de redemocratização de 1946 e 1985, do mais longo ciclo de governos progressistas do país, o primeiro a alertar que as classes dominantes engendravam um golpe travestido de impeachment contra a presidenta Dilma.
Essa rica experiência de 96 anos ininterruptos de atuação, que vai da luta armada à conquista de governos eleitos, da clandestinidade à vida partidária legal e ativa, da atuação permanente em movimentos sociais ao embate parlamentar, ensinou o PCdoB a lutar, sem hegemonismos, dogmas e esquematismos, de acordo com a exigência do momento político. Afinal, a melhor tática é sempre aquela que atende a um requisito básico: aproximar do objetivo a ser atingido, de acordo com a situação concreta.
Foi esse o guia político do PCdoB quando, depois da memorável campanha das “Diretas” – em que tínhamos multidões nas ruas e mesmo assim não alcançamos a aprovação da emenda Dante de Oliveira -, buscamos a formação de uma ampla frente que logrou derrotar a ditadura com seu próprio instrumento, o Colégio Eleitoral. Não cedemos à tentação de “marcar posição” quando o que estava em jogo era a abertura democrática do país.
Também foi buscando o objetivo de vencer e mudar o Brasil que defendemos a ampliação da aliança, em 2002, quando a chapa Lula-José Alencar representou o pacto dos setores interessados no desenvolvimento nacional, na valorização do trabalho e da produção. Fomos vitoriosos, mas não foram poucos os que, à época, criticaram a política frentista.
Pois bem, chegamos às portas das eleições de 2018 em um dos momentos mais graves e complexos da história brasileira. O golpe consumado em 2016, em suma, significou uma nova pactuação das elites para isolar o campo progressista e por fim ao ciclo aberto em 2002. A base econômica desse pacto diz que os direitos assegurados pela Constituição de 88 não cabem no orçamento, que as leis trabalhistas e previdenciárias não se aplicam mais e assegura ainda mais a hegemonia do capital internacional ante ao nacional, das finanças sobre a produção, do capital sobre o trabalho.
E mais: indo além até do controle dos artífices políticos do golpe parlamentar, a nova hegemonia que tenta se impor implica numa reconfiguração do Estado Democrático Direito, com a hipertrofia do poder judiciário, que, ao fim e o cabo, liquida as próprias garantias constitucionais que deveria resguardar, levando o país à beira de um estado de exceção.
O arbítrio virou o novo normal no Brasil. É isso que explica a prisão sem provas de Lula, em meio a um processo eivado de atropelos. É isso que garante que um juiz descumpra ordem superior impunemente, que dá poderes à magistrada responsável pela execução penal para impedir Lula de ser entrevistado. É o estado de exceção que impede que o maior líder político do país esteja livre e, ao que tudo indica, impedirá que tenha assegurado seu direito de participar das eleições. Não se quebra a base da democracia de um país das dimensões do Brasil para não ir até as últimas consequências.
Diante de situação tão grave era de se esperar que as forças políticas comprometidas com a nação brasileira estivessem rendidas e impossibilitadas de vislumbrar quaisquer chances nas eleições de outubro. Ocorre que o fracasso e a desmoralização do governo Michel Temer proporcionam uma chance de reverter o quadro.
O povo, ludibriado pela campanha pró-impeachment, se depara com uma realidade trágica: a economia não voltou a crescer, o desemprego aumentou, os direitos trabalhistas foram retirados, os investimentos em saúde e educação foram congelados e a desagregação do tecido social é visível nas grandes cidades. Esse povo não quer Temer e nada que se pareça com ele.
As pesquisas de opinião mostram que é possível colocar um freio à marcha da insensatez que engolfou o país, é possível galvanizar as esperanças e chegar ao segundo turno da eleição com uma candidatura ancorada no interesse nacional. Novamente, a história nos coloca diante de um dilema tático: unificar amplas forças para lutar pela vitória ou manter a fragmentação atual (ou no máximo montar uma articulação da Esquerda), correndo o risco de dar de bandeja a eleição aos conservadores?
Enquanto na chamada “Esquerda” se viu grande indisposição em unir amplos setores para construir uma saída para a grave crise brasileira, os conservadores agiram. Alckmin polariza partidos que noutro momento foram base de governos petistas, se consolida como a candidatura mais forte da direita e será a inquestionável herdeira do programa do governo Michel Temer. O cenário se completa com a candidatura fantoche de Henrique Meirelles, que cumpre o papel de atrair a rejeição de Temer e tirar do ex-governador paulista o ônus de defender a continuidade de um governo odiado pelo povo.
Qual seria a resposta das esquerdas? Conforme apontou o XIV Congresso do PCdoB, o necessário seria construir uma frente ampla em defesa da nação brasileira, da democracia e dos direitos dos trabalhadores.
É possível vencer as eleições e derrotar nas urnas o programa antinacional, antipopular e antissocial das elites. Para somar a este projeto, a candidatura própria do PCdoB, que tem cumprido enorme papel e ajudado sobremaneira a dar visibilidade ao Partido, não será óbice.
Mas será necessária uma mesa de diálogo em que todos tenham a disposição sincera de buscar unir forças pelo país. Não é hora de marcar posição nem de alimentar ilusões vãs, é hora de jogar para ganhar. O Brasil depende de nós.
Temos pouco tempo.