A retirada de direitos e o atropelo na condução dos trabalhos estão virando praxe na Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJC) da Câmara dos Deputados. Sob o comando da deputada bolsonarista Bia Kicis (PSL-DF), o colegiado tem avançado sobre temas de maneira açodada. Nesta semana, foi a vez do Projeto de Lei (PL) 490/07, que permite que o governo tire da posse de povos indígenas áreas oficializadas há décadas, escancara as Terras Indígenas (TIs) a empreendimentos predatórios, como o garimpo, e, na prática, vai inviabilizar as demarcações desses territórios, que já estão paralisadas pelo governo Bolsonaro.

Apesar dos apelos da Oposição para que o texto fosse retirado de pauta, a presidente do colegiado garantiu que a obstrução não durasse muito tempo e o relatório do deputado federal Arthur Maia (DEM-BA) fosse lido. A votação, no entanto, foi adiada por um pedido coletivo de vista e deve acontecer apenas na próxima semana.

Para o deputado federal Orlando Silva (PCdoB-SP), a CCJC tem se esquivado do seu papel que é o controle constitucional prévio dos projetos e alertou que o tema deve ser judicializado.

“Quando analisamos um projeto que fere, por exemplo, o artigo 231, que trata dos direitos dos povos indígenas, levamos o debate para a justiça. Estamos buscando demonstrar que é inadequado que esta comissão não cumpra seu papel fundamental. O STF decidirá em socorro à Constituição, quando essa comissão não cumpre seu papel e não zela pelo cumprimento da Carta Magna. Em respeito aos povos originários e à comissão este projeto deveria ser retirado de pauta”, alertou Silva.

O parlamentar fez referência ainda ao discurso anterior, da deputada Joenia Wapichana (Rede-RR), única parlamentar indígena eleita. Em sua fala, Joenia ressaltou que a matéria é “uma tentativa de exterminar os povos indígenas”, em referência à importância que a preservação do território tem para a manutenção da cultura desses povos.

Enquanto a base governista avançava na direção oposta, garantindo os interesses do agronegócio, um grupo de indígenas protestava na frente de uma das entradas da Câmara contra o texto. Desde a semana passada, diversas lideranças indígenas estão em Brasília para se manifestar contra o PL 490/07, contra a tese do marco temporal e contra o garimpo ilegal. São 800 indígenas de 40 povos de todo o Brasil participando dos protestos.

Para a deputada federal Perpétua Almeida (PCdoB-AC), a possível aprovação da proposta pelo colegiado significa “a maior marcha a ré em relação aos direitos dos povos indígenas”. A parlamentar condenou ainda o momento inadequado e a celeridade para análise do texto, visto que o país contabiliza quase 500 mil mortes pelo novo coronavírus.

“Não é prioridade. O governo e sua base deveriam estar preocupados com formas de buscar vacinas para o povo. Mas o governo quer tirar o direito às terras dos indígenas, colocar mineração. E ainda quer fazer isso sem debate”, denunciou.

O PL já passou pelas comissões de Agricultura e Direitos Humanos. Nesta última, recebeu parecer contrário. Caso seja aprovado na CCJ, segue ao Plenário e, se também for aprovado, vai ao Senado.

 

Por Christiane Peres

 

(PL)