A maioria dos membros da Assembleia Geral se negou a apoiar a medida discriminatória dos EUA

Enquanto se avolumam os indícios de que a matança na pequena cidade ucraniana de Bucha foi cometida pelos nazistas do Batalhão Azov, a Assembleia Geral da ONU, sob intensa ‘torção de braço – como Obama costumava dizer -, votou pela suspensão da Rússia do Conselho de Direitos Humanos, com sede em Genebra.

Foram 93 votos pela suspensão, 24 contra, incluindo China, Cuba, Irã, Argélia, Etiópia, Cazaquistão e Vietnã, e 58 abtenções, entre os quais África do Sul, Brasil, Índia, México, Egito, Indonésia, Emirados Árabes e Arábia Saudita. 16 países estiveram ausentes.

A Rússia foi aprovada para o CDH em 2020 com 158 votos.

Ainda não foi realizada qualquer investigação e sequer uma perícia forense, ou coleta de depoimentos de testemunhas, mas o ódio russofóbico estimulado pelos EUA já busca proclamar o veredicto de culpado, sem qualquer menção à presunção de inocência ou ao devido processo.

Em sua declaração de voto – contra – a China enfatizou defender os direitos humanos […] mas se opõe “à politização dos direitos humanos”. “Um movimento tão apressado irá agravar a divisão na ONU e adicionar combustível ao fogo”, acrescentou o embaixador chinês.

A Rússia qualificou a decisão de “ilegítima e com motivações políticas flagrantes”. O vice-representante permanente russo na ONU, Guennadi Kuzmín, ressaltou que o objetivo é punir comprovadamente um Estado membro soberano que realiza uma política interna e externa independente, acusando-o “de um crime que não foi cometido e que também não foi investigado”.

Kuzmin assinalou que a resolução aprovada nada tem a ver com a situação no campo dos direitos humanos e não passa de uma tentativa dos Estados Unidos de manter sua posição dominante e controle total, para continuar sua política de “colonialismo dos direitos humanos” nas relações internacionais.

No início do dia, o vice-representante permanente da Federação Russa na ONU, Dmitry Polyansky, alertara que a medida irá prejudicar as Nações Unidas como um todo, “um golpe no multilateralismo”, pelo papel de equilíbrio no CDH desempenhado pela Rússia, e por privar muitos países em desenvolvimento no órgão de um protetor.

Em comunicado, a chancelaria russa enfatizou que Moscou “pretende continuar a contribuir para fortalecer um diálogo construtivo sobre direitos humanos, envolvendo todas as partes interessadas no processo de desenvolvimento coletivo e tomada de decisões que atenda aos interesses de todos os grupos de Estados”.

Em 2011, votação análoga serviu para excluir a Líbia do organismo, o que era só mais uma fachada para ajudar as potências coloniais e a Otan a destruírem o país, sob o pretexto de ‘proteger a população’ do líder Kadhafi, com todas as consequências conhecidas, até mesmo a volta do tráfico de escravos.

Duplicidade de critérios

O embaixador cubano na ONU, Pedro Luis Pedroso, que lembrou que os EUA se opuseram à constituição do Conselho de Direitos Humanos, condenou politização e a duplicidade de critérios, e ainda questionou o mecanismo de suspensão no CDH, “que não tem paralelo em nenhum órgão da ONU”, e que vem sendo usado de “forma seletiva”.

Apontando que Washington causou a morte de centenas de milhares de civis e cometeu flagrantes e massivas violações dos direitos humanos como resultado de invasões e guerras predatórias contra governos soberanos, ele questionou: “poderá algum dia a Assembléia Geral aprovar uma resolução para suspender a participação dos Estados Unidos no Conselho de Direitos Humanos?”

Tampouco – acrescentou – “será aplicada a cláusula suspensiva contra o Estado que mantém contra Cuba, há mais de 60 anos, um bloqueio criminoso, que é um verdadeiro ato de genocídio contra uma nação inteira”, salientou Pedroso.

Para culminar, a proposta de suspensão da Rússia partiu dos EUA, que são exatamente o país que mais crimes de guerra cometeu nas últimas quatro décadas, com centenas de milhares de mortos nos países invadidos em bombardeios, milhões passando fome, outros milhões tornados em refugiados, pilhagem de petróleo e imposição de regimes fantoches.

Segundo o renomado intelectual norte-americano Noam Chomsky, sob as normas do Tribunal de Nuremberg e de Tóquio – que julgaram e puniram os chefes nazistas alemães e os fascistas japoneses -, “nenhum presidente dos EUA” do pós-guerra escaparia de ser condenado como criminoso de guerra.

Para ficar só nos mais recentes, Bill Clinton matou 500 mil crianças iraquianas com o bloqueio ao Iraque e mais milhares de civis no bombardeio da Iugoslávia. Seu sucessor W. Bush, ocupou o Iraque e o Afeganistão, matando centenas de milhares e tornando outros em refugiados – além da tortura em Guantánamo e nas prisões negras da CIA.

O ‘Prêmio Nobel da Paz’ Obama destruiu a Líbia, escalou a guerra no Afeganistão e a ‘guerra dos drones’, promoveu a ‘guerra por procuração’ na Síria, causando uma onda de milhões de refugiados chegando à Europa, e articulou o golpe da CIA na Ucrânia em 2014. Curiosamente, o desempenho de Trump nesse quesito foi quase modesto, um ataque de mísseis à Síria, estando mais concentrado na guerra econômica à China e ao Irã.

Biden estreou com o assassinato de uma família por drone dos EUA na atribulada retirada de Cabul e vem jogando tudo em incendiar a Ucrânia e – quiçá – o mundo, no empenho de adiar o declínio a olhos vistos do mundo unipolar norte-americano.