A deputada baiana Olívia Santana (PCdoB), uma das mulheres negras pioneiras na ocupação de cargos públicos, compartilha mais de 35 anos de trajetória nas lutas sociais com a publicação de seu primeiro livro: Mulher Preta na Política. Realizado em parceria com a editora Malê, o livro é um relato pessoal, um documento histórico e um gesto de convocação para que mais mulheres negras adentrem o espaço da política. O lançamento ocorre no dia 8 de julho, no Festival Latinidades, em Brasília, e no dia 25 de julho, em Salvador.

Quebrando barreiras na política

Forjada no poder da oralidade transmitido pela Yalorixá Feliciana, que detinha grande legitimidade na comunidade do Alto do Canjira, por sua capacidade de organização e acolhimento, Olívia conta no livro como seu tino de contestadora atravessou toda sua vida e a levou aos fóruns de deliberação e empoderamento.

Primeira deputada preta eleita na Assembleia Legislativa da Bahia, onde exerce o terceiro mandato, Olívia ingressou no poder legislativo aos 37 anos, quando foi eleita vereadora de Salvador, em 2003. Foi Secretária de Educação e Cultura de Salvador, e pelo Estado da Bahia, atuou nas Secretarias de Política para Mulheres e de Trabalho, Emprego e Renda.

“Ser é a única mulher preta no plenário da Assembleia Legislativa da Bahia, o estado mais negro do Brasil, diz muito sobre a intensidade do racismo, sobre nós. Impactando nosso caminho, impedindo a promoção de mulheres pretas na política”, disse Olivia ao Portal Vermelho.

Foi no Movimento Estudantil que consolidou seu desejo em ocupar os espaços para transformá-los na direção de um projeto de transformação social. Em 1988, ano em que a Constituição Federal foi aprovada como um novo marco democrático no Brasil, Olívia se elegia vice-presidente do Diretório Acadêmico de Pedagogia da Universidade Federal da Bahia. Foi na Faculdade de Educação que se encantou pela pedagogia do oprimido de Paulo Freire, que acessou os estudos marxistas sobre a estrutura das classes e também, a partir da experiência universitária, conhecer organizações partidárias e dos movimentos negros e de mulheres. “Imaginem o que faz uma universidade na cabeça de uma faxineira, favelada e inquieta”, escreve na introdução do livro.

Compromisso com a educação e a cultura

Na escrita, Olívia ressalta o quanto cada fragmento de experiência marca sua práxis política. Projetos de lei de sua autoria, como o que instituiu em Salvador o “Dia Municipal de Combate à Intolerância Religiosa”, e que inspirou a lei nacional, têm conexão direta com a reverência que lhe despertou ainda na infância a liderança de Yá Feliciana, a energia de festa e respeito que circundava em seu terreiro. O compromisso de Olívia com a Educação, adquirida desde sua formação em Pedagogia, vem transversal em sua atuação tanto como gestora quanto como legisladora. O que encontra grande simbolismo na Lei Municipal de Incentivo ao Livro e à Cultura da Leitura, iniciativa do seu mandato enquanto vereadora de Salvador.

Enfrentando desafios e violências

Nem todos os relatos do livro, entretanto, apontam para vitórias e alegrias. Ser mulher negra na política também é confrontar-se, cotidianamente, com violências diversas, de isolamento, de não pertencimento e mesmo de retaliação. Em 2001, protagonizou a resistência a uma ação truculenta de policiais no campus de Direito da UFBA, e socorreu um jovem estudante ferido. Encontrar maiorias brancas e masculinas nos espaços de decisão, também marca o desafio da sobrevivência diária muitas vezes em meio a um ambiente de hostilidade e descredibilizarão.

Resposta através da política inclusiva

Mais uma vez, Olívia responde com a política. Em seus mandatos e gestões, sempre assegurou a dimensão da diversidade na composição de suas equipes de trabalho, atestando que maiorias negras podem executar um excelente trabalho em parceria com pessoas não-negras, bem como homens e mulheres, LGBTQIA+s e não-LGBTQIA+s. Para Olívia, é na diversidade que nasce a criatividade, que não só vem assegurado o crescimento de sua influência política, tendo alcançado 92.559 votos para deputada estadual em 2022, como a relevância de suas iniciativas como gestora. No secretariado das Políticas sobre Mulheres da Bahia, implementou a Ronda Maria da Penha, instrumento fundamental para efetivação da lei e proteção das mulheres sob risco de violência, e o projeto Mulher com a Palavra, um grande espaço de circulação de vozes de diversas mulheres e seus saberes, com repercussão na esfera pública.

O livro Mulher Preta na Política é para Olívia Santana, um manifesto de suas escrevivências, conceito de Conceição Evaristo desenvolvido como uma articulação entre escrita e oralidade, possibilidade de transmitir uma história e também se curar das chagas da injustiça social através da palavra. Às intelectuais negras que a inspiram em sua jornada, como Carolina Maria de Jesus, Lélia Gonzalez, Luiza Bairros e Keeanga-Yamahtta Taylor, Olívia se soma na disputa de narrativas que a voz e a escrita de mulheres negras vem travando com “os perigos da história única”, tão bem descritos por Chimamanda Ngozi Adichie no TED Talk, em 2009.

“Ter escrito esse livro, ter conseguido escrever esse livro durante a pandemia pra mim foi um ato de libertação, porque na verdade a ideia é que ele possa encorajar outras mulheres, que ele possa despertar consciências de que o racismo não pode continuar sendo esse alicerce das relações sociais e políticas no Brasil. Nós temos que dar um basta nisso!”, disse Olívia ao Portal Vermelho.

SERVIÇO

Lançamento do livro “Mulher Preta na Política”, de Olívia Santana, no Festival Latinidades
Data: 8 de julho de 2023
Horário: 14 horas
Local: Anexo do Museu Nacional da República
Setor Cultural Sul, Lote 2 – próximo à Rodoviária do Plano Piloto, Brasília/DF

__
Ascom Olívia Santana
Edição: Bárbara Luz