A Marcha do Sal foi um ato de protesto contra a proibição, imposta pelos britânicos, da extração de sal na Índia colonial. Mahatma Gandhi caminhou de Sabarmati Ashram a Dandi, para pegar um pouco de sal para si. Um número muito grande de indianos o seguiu, mas os britânicos nada puderam fazer contra ele, pois não havia incitado os outros a seguirem-no. A marcha ocorreu de 12 de março até 6 de abril de 1930.

O presidente ataca o bastião do liberalismo com a intervenção na presidência da Petrobras. A reação é medonha, de A a Z da mídia e do mal chamado senhor Mercado – este no caso, nacional e internacional.

Por Walter Sorrentino*

Bolsonaro quer popularidade, espera contornar a crise com os caminhoneiros, quem sabe baixando temporariamente o preço dos combustíveis. Bolsonaro sabe que o papel do Estado dá popularidade (ora vejam) em particular no que concerne à maior e mais avançada empresa criada pelos brasileiros por várias décadas, desde “O petróleo é nosso” até a descoberta do Pré-Sal. O poder da caneta presidencial é imenso, não é de se subestimar.

Mas o governo está em declínio progressivo, enfraquecido com os desdobramentos deste terrível início de 2021 para o país, particularmente pela ruinosa gestão do enfrentamento da pandemia e o fim do auxílio emergência. Se vê crescentemente enquadrado em seus intuitos autoritários. Busca caminhos para sua estratégia básica, que não é salvaguardar a nossa soberania, mas sua reeleição em 2022. A vida não está fácil para o governo.

Enquanto isso, no Congresso se articula a PEC Emergencial que propõe dar um tiro de misericórdia nas verbas obrigatórias para a Educação e Saúde. Em meio a uma escalada de 10 milhões de casos de COVID-19 e 250 mil mortes pela doença. Em meio a um ano perdido no calendário das escolas, que marcará para sempre uma geração inteira de estudantes no ingresso à vida profissional.

Os presidentes do Congresso veem a brecha para serem os avalistas da agenda econômica falida. O Centrão, com isso, eleva o cacife para cobrar a sustentação ao governo, enquanto se apoderam de nacos de poder para o fortalecimento de seus partidos; o maior de todos é o objetivo de Artur Lira de que os deputados “governem” o orçamento. Ficam à disposição de Bolsonaro, quem sabe, ou fortes para detoná-lo se necessário, criando uma alternativa de nome para a eleição presidencial.

O país segue à deriva, o governo é trôpego; o desencontro de agendas entre a sociedade, o governo, o Congresso e os setores econômicos são uma babel. Não há consensos nem força para construí-los e hegemonizá-los. A vida não está fácil para nenhum bloco.

No governo, Guedes é apenas um espectro: o presidente atual da Petrobras é um dos quatro centuriões que indicou a Bolsonaro e já caíram; os militares estão colhendo o desprestígio que semearam com o apoio e presença maciça no Executivo; o núcleo ideológico está na defensiva e enfraquecido pelos fatos que levaram à prisão o deputado criminoso confesso; a famigerada toga já foi defenestrada do governo por Bolsonaro e a Lava Jato colhe derrotas sucessivas de sua ofensiva de perseguições jurídicas subversivas.

No establishment econômico as divisões prosperam quanto a o-que-fazer. Mas enquanto predominar a atitude ir levando com um governo mequetrefe, para ficar com a galinha de ovos de ouro das “reformas”, serão os principais responsáveis históricos por quebrar o país, em mais uma década perdida com essa agenda econômica senil.

O que o Brasil precisa é de proteger as vidas, implementar um robusto e seguro programa de vacinação, aprovar imediatamente um auxílio-emergência de R$ 600,00 até dezembro, em ampla escala e renovável enquanto não se debela a taxa de transmissão da COVID-19 (RT < 0,9). Não se pode levar adiante a satânica agenda de teto de gastos, regra de ouro e outras, em meio a tal situação. É preciso superar esse fiscalismo perante uma crise humanitária e uma economia em depressão, financiando a emergência com títulos públicos a serem adquiridos pelo Banco Central, “marcados” para contabilizá-los para a dívida pública.

Mas as saídas são políticas. É preciso uma forte e ampla oposição, de geometria irregular segundo se trate de defesa da democracia, da agenda econômica e dos direitos sociais, civis e humanos. Foi marcante o gesto da cantora Teresa Cristina na entrevista ao Roda Viva, dedicando a eles uma música conclamando Lula, Flávio Dino, Boulos e Freixo a se unirem para dar uma esperança e perspectiva aos brasileiros.

Ela fez como apanhar um punhado de sal à beira-mar, de Gandhi, que desatou a independência da Índia do império inglês. Gestos são importantes. É disso que precisa a oposição, ecoando o poderoso anseio de unidade das forças progressistas, que é bem maior do que os intentos, legítimos que sejam, de quaisquer das legendas partidárias.

Nada é mais importante que isso hoje. Uma foto e uma mensagem de todas as nossas lideranças – esse será nosso “punhado de sal”. Trata-se de sinalizar a travessia deste trágico início de 2021; 2022 vem depois, não antes.

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Walter Sorrentino* é Vice-Presidente Nacional e Secretário de Relações Internacionais do Partido Comunista do Brasil (PCdoB)

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