Nordeste pode usar doses da Sputnik V em estudo de imunização
Os governadores do Nordeste querem concentrar as primeiras doses da vacina russa Sputnik V, autorizadas pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) na última sexta-feira (4), em uma cidade de cada Estado, para reproduzir o Projeto Serrana, realizado pelo Instituto Butantan, no pequeno município de Serrana, que avaliou a eficácia da CoronaVac.
De acordo com o governador do Piauí, Wellington Dias (PT), que preside o Consórcio Nordeste, a proposta foi discutida durante reunião virtual com governadores e secretários de Estado, na manhã do sábado (5). Wellington Dias também é o coordenador para vacinação do Fórum Nacional de Governadores.
“A ideia que a gente discutiu hoje é de, provavelmente, escolher cidades. Piauí, por esse 1%, duas doses, vai receber 64 mil doses. Vamos escolher uma cidade que tenha mais ou menos 32 mil pessoas para vacinar. Vamos aplicar a primeira e a segunda dose, como foi feito em Serrana, acompanhado pelo Butantan. E assim, cada um dos Estados. É mais ou menos essa a ideia”, explicou o presidente do Consórcio Nordeste
Na última sexta-feira (4), a Anvisa aprovou a importação excepcional e temporária de 4 milhões de doses das vacinas russa Sputnik V e da indiana Covaxin. Apesar do aval, a agência segue tentando boicotar a vacina russa no país e para isso limitou o número de doses a 1% da população de cada estado.
De acordo com Wellington Dias, uma reunião entre os governadores, Fundo Soberano Russo e Ministério da Saúde da Rússia deve acontecer nesta quinta-feira (10) para acertar o cronograma de entrega de vacinas.
“Está mantido o contrato para entrega de 37 milhões de doses e mais outros contratos existentes no Brasil, por exemplo, 10 milhões de doses para o Ministério da Saúde e também outros estados. E a garantia também de, nesse cronograma, termos a entrega dessas vacinas até o mês de agosto, para mais cedo garantir a imunização”, disse o governador.
Vacina eficaz
Os desenvolvedores da vacina Sputnik V já publicaram os resultados dos estudos das três fases de seu imunizante na respeitada revista científica Lancet. A vacina apresentou resultados altamente positivos em termos de segurança e eficácia da fase 3 dos testes, apresentando um índice de 91,6% de eficácia.
O artigo enfatiza que o resultado foi de elevado índice de eficácia para todas as faixas etárias e que nenhum caso de efeito adverso grave foi registrado entre todos os voluntários que receberam injeção do imunizante.
Os testes clínicos foram conduzidos em 19.866 voluntários, dos quais 4.902 formaram o chamado grupo placebo (a quem é ministrada injeção sem vacina).
Os resultados apontam que a capacidade de imunização cresce para 91,8% quando é considerada a idade acima de 60 anos (2.144 voluntários).
Ao final dos estudos, foram confirmados 62 casos de contaminação por Covid-19 nos que tomaram placebo, enquanto que, dentre os 14.964 efetivamente vacinados, apenas 16 apresentaram contaminação. A Sputnik V provou que é 100% efetiva no que tange à prevenção de casos graves.
A Sputnik V já está sendo usada em mais de 66 países, inclusive na Argentina, e foi registrada na Rússia, dois países elencados na norma interna e na legislação brasileira como possuidores de agências reguladoras reconhecidas internacionalmente. Não há nenhuma justificativa plausível para a protelação da Anvisa em aprovar o uso emergencial da vacina russa.
Projeto Serrana
No Projeto Serrana, durante os últimos quatro meses, pesquisadores do Instituto Butantan mediram os efeitos da imunização em larga escala na cidade de Serrana, no interior de São Paulo e viram que com a vacinação de toda a população adulta do município, com a vacina CoronaVac, fez os casos sintomáticos de Covid-19 despencarem 80%, as internações, 86%, e as mortes, 95% após a segunda vacinação do último grupo.
A pesquisa, pioneira no mundo, foi desenvolvida pelo Butantan, aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da USP e avaliada pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Foi realizada em parceria com a Secretaria de Saúde e a Prefeitura Municipal de Serrana. O objetivo do projeto é entender qual a efetividade da CoronaVac, ou seja, como a imunização de toda uma população pode afetar o curso da epidemia. Na prática, entender como a vacina se comporta no mundo real.
A cidade, de 45 mil habitantes, foi escolhida para a vacinação em massa porque tinha um alto índice de contágio. A imunização seguiu critérios científicos. A cidade foi dividida em 25 áreas que formaram quatro grupos. Os grupos foram vacinados, um por vez, com uma semana de diferença.
Em abril, Serrana já observava uma queda expressiva na incidência da Covid-19. De 699 casos em março, esse número caiu para 251. E as mortes passaram de 20 para 6, nesse mesmo período.
Após a aplicação de 54,8 mil doses da CoronaVac no município paulista, não foi observado um índice preocupante de reações adversas. No total, 4,4% dos participantes apresentaram algum incômodo após a primeira dose. Apenas 0,02% deles tiveram efeitos colaterais grau 3, como dor na cabeça ou nos músculos, que chegaram a prejudicar as atividades diárias.
O Projeto também acompanhou os casos de hospitalização ou morte por covid-19 durante e logo após a vacinação. No intervalo entre a primeira e a segunda dose da vacina, foram registradas 43 internações e 7 óbitos entre os voluntários. No período de 14 dias após a segunda dose, os cientistas identificaram cinco voluntários que necessitaram de atenção hospitalar e uma morte.
De acordo com o Instituto Butantan “Outra conclusão importante é a avaliação da incidência da doença em Serrana na comparação com as cidades vizinhas. Serrana tem cerca de 10 mil moradores que trabalham em Ribeirão Preto diariamente. Porém, enquanto Ribeirão Preto e cidades da região vêm apresentando alta nos casos de Covid-19, Serrana manteve taxas de incidência baixas graças à vacinação. Ou seja, além da queda das infecções, os moradores que transitam em outras cidades não trouxeram um incremento relevante nos casos. O Projeto S criou um ‘cinturão imunológico’ em Serrana, uma barreira coletiva contra o vírus, reduzindo drasticamente a transmissão no município”, afirmou o instituto.