No Brasil de Bolsonaro, preços dos alimentos pressionam famílias
O salário-mínimo deveria ser de R$ 4.420,11 em julho para atender às necessidades de uma família de quatro pessoas, com dois adultos e duas crianças. O valor é 4,23 vezes maior do que o mínimo atual, de R$ 1.045. A estimativa foi feita pelo Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), que faz o cálculo com base na cesta básica mais cara do país, segundo os resultados da Pesquisa Nacional da Cesta Básica de Alimentos.
Na pesquisa do último mês, esse valor ficou em R$ 526,14, o custo da cesta em Curitiba. Ao todo, a pesquisa avalia 16 capitais e considera, para calcular o valor da cesta básica, o conjunto de alimentos necessários para as refeições de uma pessoa adulta durante um mês.
Os dados de julho revelaram que o custo da cesta básica diminuiu em 13 das capitais pesquisadas. Mas, segundo Patrícia Lino Costa, supervisora de preços do Dieese, infelizmente a queda na maioria das capitais não significa que a alimentação ficou mais acessível para as famílias. Isso porque o recuo foi puxado basicamente por dois itens: o tomate a batata.
“O tomate e a batata estão em período de safra [quando o produto é mais abundante] e puxaram o custo da cesta para baixo. Como os dois têm um peso grande, isso influenciou bastante. O tomate chegou a cair 39% em Aracaju e 30% em Vitória. A batata, que só é pesquisada na região Centro-Sul, caiu 36% em Belo Horizonte”, explicou.
Itens básicos
Enquanto batata e tomate ficaram mais baratos, itens básicos e muito presentes na mesa dos brasileiros encareceram. O leite e a manteiga, que é uma derivada, são dois exemplos. O preço do leite aumentou em todas as capitais pesquisadas, enquanto a manteiga subiu em 12 cidades. O leite chegou a aumentar 12%, em Goiânia e a manteiga ficou 4,17% mais cara em Curitiba.
“A entressafra do leite [quando há escassez] costuma ir até junho e agora, esse ano, se estendeu um pouco mais, para julho. Talvez haja também uma dificuldade de conseguir fazer o transporte do leite, devido à pandemia”, ressaltou Patrícia Lino Costa.
O custo do óleo de soja, que as famílias utilizam para cozinhar, subiu em 15 das 16 capitais, sendo que a maior alta foi em Campo Grande, de 6,22%. O motivo são as exportações da soja em alta e o uso do óleo para a fabricação de biocombustíveis.
O arroz e a carne, presença constante nas refeições, também aumentaram de preço. O preço do arroz agulhinha ficou mais alto em 14 capitais, chegando a subir 12,2% em Aracaju. Já a carne subiu em 11 cidades, com alta de 1% em São Paulo – apesar de mais modesta, a alta está acima da inflação registrada pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC) em julho, que ficou em 0,36%.
Segundo Patrícia Lino Costa, no caso do arroz, o aumento de preços se deve a um momento de estoques em baixa e alta demanda. No caso da carne, acontece movimento semelhante ao da soja: as exportações estão diminuindo a oferta no mercado interno.
O peso dos alimentos
Assim, ressalta Patrícia, ainda que haja recuo no preço global da cesta devido à sazonalidade de alguns produtos, na prática as famílias acabam pagando mais caro quando vão ao supermercado. Principalmente porque os itens básicos são de difícil substituição. “Você não vai deixar de comprar arroz para comprar tomate”, exemplifica a pesquisadora.
O Dieese apontou ainda que os alimentos consumiram cerca de metade de um salário-mínimo em julho. O percentual do salário líquido necessário para pagar por uma cesta básica ficou em 48,26% no mês passado, em relação ao salário de R$ 1.045. E este é o gasto necessário para alimentar apenas um adulto. A capital onde a parcela do salário-mínimo necessária para comprar uma cesta básica ficou mais elevada foi em Curitiba, com 54,43%, e o menor percentual coube a Aracaju, com 40,63%.
Coleta a distância
Desde 18 de março, o Dieese deixou de fazer coleta de preços presenciais devido à pandemia do novo coronavírus. Segundo nota da entidade, para evitar um apagão de dados sobre os preços dos principais produtos básicos de alimentação, a partir de abril os pesquisadores iniciaram uma tomada de preços por telefone, e-mail, consultas na internet e em aplicativos de entrega. São Paulo foi a única capital onde houve coleta presencial.
A entidade afirma que houve dificuldades como ausência de dados em sites, aplicativos ou a recusa dos funcionários dos estabelecimentos, atribulados pelo trabalho, em repassar os preços por telefone ou e-mail. Devido aos problemas, o Dieese destacou que teve de reduzir e modificar a amostra original. Mesmo com a mudança, dizem os pesquisadores, os dados apurados têm revelado tendências semelhantes de alta ou queda em todas as capitais ou naquelas que fazem parte de uma mesma região geográfica, o que permite a divulgação das informações capturadas. (Por Mariana Branco)