Naftali Bennett e Yair Lapid, líderes do novo governo a ser votado no domingo 

Encabeçada pelo premiê Benjamin Netanyahu (Bibi como é alcunhado em Israel), teve início a mais agressiva campanha de difamação e incitamento ao ataque a parlamentares da história de Israel. A campanha segue desde que a coalizão de oito partidos foi anunciada, no dia 30 de maio, pelos chefes da negociação, Yair Lapid (do partido de oposição mais votado, o Yesh Atid) e Naftali Bennett (do partido que vai indicar o primeiro premiê no governo de rotação, Yamina).

A coligação que formou governo através de um extenuante ciclo de negociações articuladas por Lapid, montado ministério a ministério, integrando posições para unir forças no fragmentado sistema parlamentar israelense – agora com data de votação do novo governo no parlamento, o Knesset, prevista para o próximo dia 11 – foi anunciada por Lapid e, logo a seguir, por Nafatali Bennett no dia 30 de maio.

Imediatamente, Netanyahu começou a atacar o governo que começava a se delinear e que viria a ser firmado em documento pelos líderes dos oito partidos, incluindo pela primeira vez um partido árabe israelense.

Em sua difamação descreveu essa frente ampla como o “governo da mentira, da traição, da desconfiança e da insegurança”.

Isto porque, “só um governo de direita”, com ele à testa, claro, poderia garantir a “segurança de Israel e de todos os israelenses”.

Ainda que o ataque fosse dirigido a todos os partidos do novo governo, o principal golpe foi desferido contra os da direita que passaram a se descolar de sua crescente insanidade.

“Colem neles”, disse Bibi referindo-se aos deputados eleitos pelo partido direitista de Bennett, “não tenham medo de colarem neles”. E, repetindo Trump prosseguiu: “São parte da fraude, a maior fraude da história de Israel”.

As ameaças começaram a chover por ligações telefônicas ao longo de todos os dias subsequentes, com dizeres, “Deus se apiede de você”, direcionados às principais lideranças do Yamina, Bennett e a ex-ministra da Justiça, Ayelet Shaked, do mesmo partido. O deputado Nir Orbach foi “convidado” para o próprio enterro.

Logo a deputada do mesmo partido Idit Silman se declarou ameaçada dizendo que um carro a seguia por onde fosse e que seu filho foi ameaçado no caminho à escola”.

Manifestações de fanáticos enraivecidos tomaramdestaque a frente das casas dos deputados com faixas e aos gritos de “traidor” e “Não ao governo de esquerda”.

O leque de ameaças se estendeu. A deputada do partido à esquerda Meretz declarou que saíra de casa para lugar não declarado depois das ameaças a sua integridade física e a seu filho. Os fanáticos divulgaram nas redes sociais “anúncio” da morte da deputada.

Bennett dirigiu-se a Netanyahu pedindo: “Deixe ir. Deixe que o país vá adiante”.

Os líderes dos oito partidos se reuniram e lançaram um apelo: “O papel dos líderes é permitir a democracia e não envenenar através do incitamento”.

Houve solicitação pessoal a Netanyahu que baixasse o tom e pedisse calma a seu seguidores. Sem sucesso.

Quando Bibi, ao contrário, disse a seus seguidores que “colem neles”, em uma orientação clara de que estes elevassem o tom e o nível do ódio, o líder do Yamina, Naftali Bennett se pronunciou:

“’Colar neles’ é agredir uma deputada do Knesset em seu carro e seus filhos a caminho da escola. É fazer juramentos e ameaças”.

“Durante meus anos de política”, prossegue, “aprendi que os líderes devem saber lidar com as críticas. Mas há uma linha divisória entre a crítica e o comportamento aterrorizador”.

“Durante as últimas semanas tem havido uma campanha muito bem financiada e administrada para pressionar os deputados do Yamina e do Nova Esperança [outro partido de direita na coligação atual] na tentativa de quebrá-los, de forçá-los a votar contra o novo governo. Neste esforço, todos os meios são válidos”.

Vigilância

O chefe do serviço de segurança de Israel que determinou nível 5 de vigilância (o segundo mais alto) para impedir que o pior aconteça a Bennett e a Shaked (que passaram a ter policiamento em suas residências e a andar de carros blindados), pediu que os incitamentos cessem “pois alguém pode sair ferido”.

O ex-ministro das finanças do partido de Netanyahu, deputado Israel Katz, alertou: “É possível apresentar divergência profunda sem cruzar linhas perigosas. Todos temos a responsabilidade de agir assim”.

Netanyahu passou a projetar nos outros sua insanidade: “As bandeiras negras foram fundadas pela esquerda. Eu, minha mulher e meus filhos temos recebido estes horríveis telefonemas”.

E justificou o comportamento ensandecido dos fanáticos: “Eles se sentem traídos e não devem ser calados. Todos os esforços devem ser feitos para impedir este governo de se formar. Ainda não está muito tarde”.

No dia 7, Netanyahu afundou ainda mais no alheamento e, em mais uma demonstração de sua modéstia se comparou a Moisés ao dizer: “Todos sabem como Deus tratou os opositores de Moisés”.

Estava se referindo a uma passagem bíblica na qual Korach, por ação divina, é tragado pela terra que se abre aos seus pés e demais opositores a Moisés.

Um grupo de rabinos de ultradireita lançou um ‘rodef’ (chamado à ‘perseguição’): “Todos os esforços devem ser feitos para que esse governo não tome posse”.

Na mesma linha, a deputada do partido de Netanyahu, May Golan falou na morte dos opositores: “Naftali Bennett e Gideon Sa’ar não têm mais para onde ir. Eu os comparo a homens-bomba suicidas. O serviço de segurança pode dizer o que quiser. Eles são como terroristas que não acreditam em mais nada. Eles saem em sua missão suicida e, mesmo sabendo que têm uma sentença de morte contra eles, não se importam”.

Ampla condenação

Merav Ben Ari, deputado do partido de Lapid, Yesh Atid, repudiou a estupidez: “Nenhum deputado deveria estar passando por isso. A violência contra eles vem da casa do primeiro-ministro”.

Argaman, o chefe da segurança, acrescentou que “estamos nos aproximando cada vez mais dos meses de 1995 que antecederam ao assassinato de Rabin”.

Como descreveu na coluna intitulada “Netanyahu está comandando um incitamento que poderia terminar em morte, novamente”, o articulista Nehemia Shtrasher, no jornal israelense, Haaretz:

“Uma linha direta conecta o terrível incitamento que antecedeu o assassinato de Rabin [morto após assinar o acordo de paz com Arafat] e o ainda mais duro incitamento que acontece hoje. Exatamente como então, 26 anos atrás, Benjamin Netanyahu está tendo um papel chave no incitamento. Em 1995, ele caminhou à frente de uma marcha, na cidade de Raanana, com um caixão e depois apareceu em uma varanda como chefe da agitação em uma grande concentração na Praça Sion, em Jerusalém [abaixo dele uma faixa dizia: “Morte ao Rabino dos assassinos]. Ele segue o mesmo roteiro hoje. Fala em discursos cheios de mentira e difamação”.

Pensar que este é o premiê de Israel há 12 anos, durante os quais mais do que fez o maior obstáculo à paz, o número de ‘colonos’ judeus em terras assaltadas aos palestinos passar de 480.000 para 620.000 e que, somando-se à atual criminosa campanha que, segundo editorial do Jerusalém Post do dia 7, coloca “Israel em perigo”, se aferra ao cargo para além de alimentar seu delírio megalomaníaco, tentar fugir da cadeia pois é indiciado em quatro processos que correm na Corte Suprema por “receptação de suborno, fraude e quebra de confiança”.

A eleição do novo governo denominado “Governo da Mudança” no parlamento será no dia 11 e, por determinação do presidente do Knesset, Yariv Levin que também repudiou a agitação de Netanyahu, a posse deve ocorrer no mesmo dia.