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Ronnie Long, livre, abraça a esposa ao deixar a cadeia depois de 44 anos preso injustamente | Foto: Jessica K Jkoscielniak-McClathy

Negro inocente é libertado nos EUA depois de 44 anos de prisão

Ronnie Long, um homem negro da Carolina do Norte preso injustamente por 44 anos por um crime que não cometeu – um estupro – foi finalmente libertado na semana passada, cinco anos depois que seus advogados descobriram que os investigadores haviam retido evidências que provavam sua inocência.

Ele tinha 20 anos ao ser encarcerado e ao sair livre estava a poucos dias de completar 65 anos. “É tempo”, determinava a decisão do juiz do Quarto Circuito da Corte de Apelações, James Wynn, ansiosamente aguardada por familiares, amigos, advogados e repórteres.

Ao ser indagado sobre como se sentia por estar livre, Long respondeu: “Exultante. Acabou. Agora acabou”.

No relato do Charlotte Observer, Long deixou o Instituto Correcional Albemarle, de terno preto, chapéu novo de feltro e sapatos italianos na tarde de quinta-feira (27), depois que o Estado da Carolina do Norte oficializou pedido de anulação de sua condenação de 1976, por um júri totalmente branco, pelo estupro de uma mulher branca proeminente em sua cidade natal, Concord.

Long sempre sustentou que era inocente. Durante décadas, autoridades policiais e judiciais o mantiveram no cárcere, apesar das amostras de sêmen e impressões digitais tiradas na cena do crime não baterem com as dele, o que foi ocultado de Long e de sua defesa.

“Nunca desista”, disse Long a repórteres, após abraçar Ashleigh Long, sua esposa há seis anos, cujo aniversário coincidiu com a libertação de seu marido. Ele também agradeceu ao seu advogado nos últimos cinco anos, Jamie Lau, da Universidade Duke.

Como registrou o Observer, as décadas de apelação de Long finalmente ganharam velocidade graças à onda de apoio à justiça racial em curso nos EUA. Em janeiro, apesar de já se saber que a defesa não tivera acesso a evidências que exoneravam Long no julgamento de 1976, um tribunal de apelações havia negado a ele um novo julgamento em uma decisão por 2 a 1 em janeiro.

Pelo Twitter, a prefeita de Charlotte, Vi Lyles, manifestou solidariedade a Long, que disse “ter sofrido 44 anos de injustiça”. Ela acrescentou não conseguir imaginar “a força que ele e seus entes queridos precisaram para suportar” esse encarceramento.

A jornada de Long rumo a quatro décadas de injustiça e infâmia, onde o preconceito racial mal pode ser ocultado, teve início em 1976, quando ele foi preso, apesar de ter um álibi sólido, acusado pelo estupro em abril de Sarah Bost, a viúva de 54 anos de um executivo da mais importante empresa de Concord, a Cannon Mills.

A senhora Bost, mais tarde, diante do tribunal lotado, iria declarar que o “reconhecia” como o estuprador, tendo acrescentado que “não tinha dúvida”. “Jamais esquecerei a coloração de sua pele”, a vítima dissera à polícia. O júri era composto inteiramente por brancos, ao que se diz, escolhidos a dedo.

De acordo com os autos, “um homem entrou na casa” e “colocou uma faca na garganta [de Bost]”. Quando Bost não conseguiu dar o dinheiro que o agressor exigia, este “ficou zangado, xingou-a, jogou-a no chão, arrancou-lhe a roupa, espancou-a e a violou”. “O homem repetidamente ordenou a Bost que não olhasse para o rosto dele, mas ela o desafiou na esperança de poder identificar seu agressor se sobrevivesse”.

Apesar da falta de evidências físicas ligando Long ao ataque e do álibi dele – estava em casa com sua mãe e filho na noite do crime – o júri branco o considerou culpado de estupro em primeiro grau e roubo em primeiro grau e o condenou a duas penas de prisão perpétua.

Apenas 29 anos depois, Long conseguiria a primeira brecha em sua luta contra a condenação iníqua.

Em 2005, um juiz concedeu autorização para revisão das evidências biológicas e permitiu a realização de um teste de DNA. A revisão das evidências do caso revelou cabelo, fibras de roupas e outras amostras da cena do crime que não correspondiam às de Long.

Nenhuma dessas evidências havia sido compartilhada com a defesa do réu durante o julgamento de 1976. Nem mesmo um kit de estupro, preparado pelo hospital onde Bost foi examinada e tratada.

Outros dez anos de cárcere se passaram. Em 2015, o Programa de Assistência ao Teste de DNA Pós-condenação do Comitê de Inocência da Carolina do Norte descobriu 43 impressões digitais coletadas na cena do crime. Nenhuma de Long.

Graças ao empenho da única juíza dissidente, Stephanie D. Thacker, no julgamento da apelação de janeiro, que citou “um padrão perturbador e impressionante de supressão policial deliberada de provas materiais”, afinal a verdade foi restaurada.

“Sem dúvida, nenhum júri razoável poderia declarar o Sr. Long culpado com base nos fatos inegáveis diante de nós hoje”, declarou a corte de apelações, citando “evidências físicas suprimidas que não ligam o Sr. Long à cena do crime, perjúrio no testemunho de parte de investigadores, falta de evidências biológicas importantes e uma identificação de testemunha ocular obtida por meios agora ilegais na Carolina do Norte”.

“A justiça exige que concedamos imediatamente ao Sr. Long o alívio que ele buscou por 44 anos”, concluiu o juiz Wynn.

Para sua primeira refeição como homem livre, Long disse que queria costela de boi, macarrão e queijo, uma salada e um copo de limonada. À passagem de Long, um cântico irrompeu, como poderia “ocorrer em uma igreja”, no relato de Michael Gordon, do Observer.

“Ronnie Long está voltando para casa, Ronnie Long está voltando para casa”, a pequena multidão comemorou. Então a voz de alguém se sobressaiu, causando risadas: “Ronnie Long vai comer costela de boi, Ronnie Long vai comer costela de boi”. Então, “Long partiu para longe da prisão. Em direção ao primeiro horizonte aberto do resto de sua vida”.

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