O movimento Direitos Já! Fórum pela Democracia! realizou na segunda-feira (1/3) o lançamento do documento-manifesto pela imediata aprovação do auxílio emergencial de R$ 600, pelo menos até dezembro de 2021, ou enquanto durar a pandemia da Covid-19, que será entregue à Câmara dos Deputados e ao Senado Federal.

“O documento foi elaborado por um grupo de economistas, bastante amplo, indicado pela sociedade e por diversos partidos”, segundo o coordenador do movimento, o sociólogo Fernando Guimarães. O evento contou com a presença de lideranças de 15 partidos políticos, sindicalistas, religiosos, representantes de movimentos sociais, sindicalistas e economistas.

“Convocamos esse ato com a máxima urgência porque esta semana é uma semana decisiva. A proposta do governo é uma proposta que na verdade amplia para quem recebe o Bolsa Família mais R$ 60. Porque, em média, é R$ 190 o Bolsa Família. Se a gente calcular é R$ 2 por dia, e isto se insere no contesto da necropolítica deste governo”, denunciou Fernando Guimarães, que mediou as intervenções transmitidas nas redes sociais.

Após dois meses do fim do auxílio emergencial, o governo Bolsonaro vem protelando o número de mortes e contaminações, o que tem exigido dos governos estaduais uma série de medidas restritivas das atividades econômicas para salvar vidas e conter o avanço da Covid.

O governo chantageia, dizendo que para um novo auxílio tem que ter contrapartidas como cortes na saúde, educação e nos direitos dos servidores públicos e em troca reduz o auxílio para até R$ 250 e para menos da metade dos beneficiados no ano passado, deixando de fora milhões de brasileiros que agora engrossam as filas de desempregados e enfrentam uma violenta carestia.

Para o economista Rogério Studart, ex-diretor do Banco Mundial, que abriu as discussão da live que apresentou o documento do movimento Direitos Já!, “quando se trata de vidas, de emergência, é prioridade, depois se discute as perspectivas”.

“Qual o papel nosso como economista? Não só dizer que é importante realizar esse ato de socorro imediato para evitar mais perdas de vidas e de sobrevivência, mas também como é possível fazê-lo. Porque não há nenhum impedimento técnico para isso, e demonstrar as consequências terríveis de não fazê-lo”, afirmou Rogério Studart. “Existe a urgência do auxílio emergencial e não existe nenhum impedimento técnico para fazê-lo”, acrescentou.

“O aumento da dívida não representa nenhuma irresponsabilidade, no sentido de que ele é um fenômeno mundial, e não existe nenhum critério técnico ou reconhecido pelos economistas do mundo inteiro e que digam que uma dívida do tamanho do Brasil, até maior para assumir ainda mais os investimentos necessários para a recuperação, não cabem no Brasil”, afirmou o ex-diretor do Banco Mundial.

O economista defendeu o que vem sendo feito no resto do mundo no enfrentamento da crise sanitária e econômica, que é o financiamento monetário. “O Tesouro emitindo títulos para o Banco Central que é conhecido entre os economistas e a população como ‘Zé com Zé’, ou seja, o Tesouro Nacional vende para o Banco Central, que coloca na sua carteira e isso permite o Banco Central fazer os gastos necessários”.

“O Brasil é um país do G-20, entre as dez maiores economias do mundo. É um país rico com muitos pobres. Nós temos condições materiais, financeiras, de arcar com esse tipo de inciativa. Nossa proposta e muito simples, é um auxílio emergencial que permita a sobrevivência das famílias, e a gente está baseado aqui mais ou menos no que a média da cesta básica nacional, ou seja R$ 600, para garantir a sobrevivência mínima dessas pessoas, renovada até que necessária seja, especialmente olhando os critérios científicos que demonstram que as pessoas podem ter esperança e podem retornar ao trabalho com tranquilidade”.

“O auxílio emergencial ajudou uma população em uma situação de extrema vulnerabilidade a superar uma situação que se desdobraria em crise humanitária. Também ajudou a economia, a economia só não despencou mais em função do auxilio. Tirar isso dá população significa também tirar imediatamente o oxigênio da economia”, declarou o economista ao sintetizar o documento.

“Não é uma crise que começou agora, ela já vai de longe, a Covid-19 só piora e joga uma população para vulnerabilidade. O auxílio emergencial ajudou essa população a superar minimamente uma situação que seria imediatamente uma crise humanitária. Não de uma forma suficiente, porque o Brasil é um país muito desigual, mas deu um pouco de ar numa situação de total desespero. Ajudou a economia, foi muito importante, a economia não despencou mais – porque já demonstrava que ia despencar – em função desse auxílio emergencial”, disse o economista. “Não renová-lo, já coloca essas pessoas todas em vulnerabilidade e em uma situação de pré-crise humanitária”, enfatizou.

“Ao mesmo tempo que você retira esse apoio a essa população, você também retira o oxigênio da economia. Fazendo despencar a economia, você leva ao desemprego ainda maior e a uma situação de vulnerabilidade aos poucos que podem retomar ao trabalho”.

Prioridade número um 

Após a síntese do documento apresentada por Rogério Studart, lideranças partidárias, economistas, entre outros membros do movimento se manifestaram.⁸

“Nós não podemos condicionar o auxílio a nenhuma outra matéria”, defendeu o deputado Federal do MDB, Baleia Rossi, afirmando que a proposta apresentada pelo movimento Direito Já! “é uma boa”, e que ele iria apresentá-la aos demais parlamentares do MDB na Câmara e no Senado. “A prioridade número um do Brasil tem que ser o auxílio emergência, que dê amparo a milhões de brasileiros que pós dezembro, com o fim do primeiro ano do auxílio, passam por grandes dificuldades, inclusive naquilo que é mais básico, que é alimentação”, afirmou Rossi.

“O fundamental é que essa ajuda chegue nas mãos dos brasileiros e cheguem para ontem. É compromisso da bancada do PSDB na Câmara e Senado para que isso não passe dessa semana. A incompetência do governo tem matado brasileiros”, disse Bruno Araújo, presidente do PSDB.

“Vacina no braço e comida no prato”, declarou o deputado federal Marcelo Ramos (PL/AM), vice-presidente da Câmara. “A crise sanitária que acontecia naquele momento no Estado do Amazonas, ela escondia uma dramática crise social em que centenas talvez milhares de pessoas não tinham o que comer”, afirmou o parlamentar.

“Com o recrudescimento dos números alarmantes da pandemia, nós precisamos cuidar da saúde do povo brasileiro e, nesse momento em que a economia está completamente estagnada nós possamos garantir o retorno do auxílio emergencial que não era sequer para ter sido tirado”, disse André Figueiredo, deputado federal pelo PDT/CE e líder da oposição na Câmara. “Fontes existem”, reforçou.

“Parabéns por reunir tanta gente para discutir algo fundamental para o país no momento que estamos vivendo. Esse auxílio emergencial não deveria ter sido suspenso quando foi”, completou Roberto Freire, presidente nacional do Cidadania. Segundo ele, o Congresso Nacional tem o dever de enfrentar a pandemia “que não foi enfrentada e combatida pelo governo federal, pelo presidente da República negacionista, Jair Bolsonaro”. “Se não fosse esse auxílio a tragédia teria sido ainda maior do que foi e que continua sendo”.

O presidente do Partido Verde, José Luiz Penna, defendeu que a ajuda financeira emergencial seja no valor de R$ 600, até o final do ano, e fez críticas aos ataques de Bolsonaro aos govenadores e prefeitos. “A cabecinha ridícula dele é de jogar para prefeitos governadores a questão”, criticou Penna.

A economista Mônica de Bolle, pesquisadora da Universidade Johns Hopkins e do Peterson Institute, que também contribuiu com a redação da proposta, ressaltou que “não se condiciona nada em um momento de emergência”, referindo-se à PEC de Emergência apresentada pelo governo, como condicionante para a aprovação de um auxílio emergencial de R$ 250 proposta pelo governo. “Essa proposta para o auxílio emergencial é sem condicionantes. Porque emergência e condicionantes são contradições. Você não condiciona nada em um momento de emergência. Deixo aqui meu recado para outros economistas: o momento requer muita razão, mas também muita empatia para entender a tragédia pela qual nós estamos atravessando”.

“Foi uma irresponsabilidade criminosa, no meio da segunda onda, que o governo tenha simplesmente eliminado todo o suporte – não só para os mais pobres, mas também para os trabalhadores formais, para estados e municípios, também para as empresas”, disse o economista Guilherme Melo, professor da Unicamp. “Esse discurso de que não tem dinheiro para implementar é o mesmo discurso do ano passado. E se fez. Agora também vai ser possível fazer. E é fundamental que se faça para evitar que essa tragédia não seja maior”.

“O gás está quase R$ 100, o gás de cozinha. Que família vai colocar comida na mesa com R$ 250. Isso é um acinte e um deboche, que traz a fome como parceira da economia”, denunciou a deputada Alice Portugal, do PCdoB da Bahia. “Temos que aproveitar esse momento para repudiar essa PEC da Emergência, que é um pacote de arrocho fiscal – não pode haver vinculação. As alternativas foram colocadas para trazer esses recursos. Soluções existem e elas precisam ser implementadas para que chegue nas mãos das mães desse país”.

“O auxílio emergencial vem para exatamente socorrer, garantir aqueles que estão vendo bater nas suas portas a fome, vendo retomar esse fantasma sobre a vida das famílias brasileiras. É neste momento, que nós sentimos a necessidade de que o Congresso Nacional aprove esse auxílio emergencial, afirmou a deputada federal Lídice da Matta (PSB-BA), destacando o empobrecimento atinge especialmente as mulheres.

Carestia e desemprego

Representando o Dieese, que também contribuiu com dados para a redação do documento, Victor Pagani reforçou que o processo inflacionário vivido no Brasil afeta sobretudo os mais pobres.

“Nós acompanhamos os índices de custo de vida e fazemos a pesquisa nacional da cesta básica de alimentos. Estamos vivendo um processo inflacionário que afeta sobretudo as famílias mais pobres. A alta no preço dos alimentos está muito acima da inflação média – ela foi o triplo da inflação média nos últimos 12 meses. A cesta aumentou mais de 26% nesses 12 meses. Um processo de carestia. Portanto, o valor de R$ 600 é condizente com o valor da cesta básica”, defender Pagani.

PEC do arrocho à saúde, à educação e ao servidor público

O economista e professor Nilson Araújo de Souza reforçou que não é necessário cortar a verba da Saúde e da Educação para bancar a despesa do auxílio emergencial e afirmou que a tragédia social atual é muito maior somando desempregados e a população que nem ao menos está procurando emprego.

“Nós estamos em um momento de dupla tragédia. Uma tragédia humanitária e sanitária, que já ceifou 250 mil vidas. Além dessa tragédia, tem a tragédia social. Não existe apenas 14 milhões de desempregados – têm os 14 milhões que estão procurando emprego, mais quase 6 milhões que não estão e mais quase 8 milhões que gostariam de trabalhar, mas em função da pandemia não estão procurando trabalho”, disse o professor Nilson. “Não temos outra saída se não lutar pelo auxílio emergencial sem condicionamento. Não é necessário cortar verba da saúde e da educação para bancar essa despesa. Temos outras saídas”.

Para o economista da UnB, José Luis Oreiro, “o governo não quer aprovar esta semana o auxílio emergencial, o que ele quer fazer é um estratagema para poder aprovar a PEC Emergencial, que foi apresentada no início do ano de 2020, que tinha por objetivo inicial reduzir os serviços públicos”. “O Guedes queria aprovar em 2019 uma redução da jornada de trabalho dos servidores públicos em 25%. Agora imagine-se no ano de 2020 os médicos fossem dar 25% a menos de horas de trabalho, os professores 25% menos aulas, se os policiais e os fiscais da Receita Federal fossem trabalhar 25% menos. É disso do que tratava aquela PEC Emergencial”, denunciou Oreiro.

“Hoje são mais de 14 milhões de desempregados, estados entrando em colapso e há dois meses a população sem receber nenhum tipo de auxílio. Isso é uma crise sem precedentes e nesse contexto o auxílio se coloca como uma questão humanitária”, defendeu Renata Abreu, presidente do Podemos.

O ex-ministro Aldo Rebelo, do Solidariedade, ressaltou que além de garantir renda, o auxílio é também um programa econômico para o país em crise.

“Quando o estado brasileiro decidiu oferecer a renda de emergência, o resultado não foi apenas a melhoria da renda dos mais pobres, o resultado foi a melhoria da economia em geral. Por essa razão, essa medida, além de urgente, necessária e inadiável, ela constitui o verdadeiro programa econômico e social que as forças políticas que têm compromisso com o país tem que abraçar”, ressaltou Rebelo.

Baseado em estudos recentes, 20 milhões de pessoas estariam voltando à pobreza caso o auxílio não seja aprovado, disse o economista Nelson Marconi, da FGV. “A renda dos mais vulneráveis (que não recebem outros benefícios) cairia 37%. A gente teria aí um problema social muito grande”.

“A melhor forma de financeira [de garantir o auxílio] seria a emissão de moeda e temos uma ampla possibilidade de fazer isso sem aumentar a dívida – e vários países fizeram. Para o momento o que temos que fazer é lutar para separar as PECs e aprovar esse auxílio com o valor máximo possível”, defendeu o professor da Fundação Getúlio Vargas.

Ao defender um auxílio emergencial de pelo menos R$ 600, o porta voz da Rede Sustentabilidade, Pedro Ivo, ressaltou que “todos estão tendo a grandeza de deixar as suas diferenças para lutar por uma causa comum, que é a causa da vida. Porque é isso que está em jogo, é a defesa da vida”.

“É uma felicidade saber que temos uma convergência entre esquerda e direita em dois assuntos muito importantes: um é a manutenção do regime democrático, o outro é sobre a ideia de nesse momento a população precisa de uma renda básica”, disse o deputado federal Kim Kataguiri (DEM-SP).

“Não resta dúvida de que o agravamento dessa crise sanitária e social foi intensificado pela suspensão criminosa do auxílio emergencial. Quase a metade dos lares brasileiros são chefiados por mulheres. Dessas mulheres, quase 42% são empregadas domésticas ou trabalham por conta própria. A fome é urgente”, disse Conceição Cassano, representando a Confederação das Mulheres do Brasil (CMB).

“Nós não aceitamos essa PEC Emergencial como elemento de chantagem e faremos essa luta na Câmara dos Deputados. Precisamos derrotar a PEC e garantir o auxílio emergencial”, afirmou a deputada federal Fernanda Melcchiona, do Psol.

A deputada federal Erika Kokay, do PT/DF, saldou a constituição da aliança em defesa do auxílio. “Uma crise atinge a todos, mas atinge mais as mulheres. Ela vai aprofundar as desigualdades sociais. A discussão da defesa da vacina e do auxílio emergencial são discussões em defesa da vida. Cabe a nós reagir nesse momento”.

“Vamos lutar pelos R$ 600. Todos juntos, os partidos as Centrais sindicais, a sociedade. Só desta forma nós vamos superar esta situação grave que o Brasil está vivendo”, defendeu o coordenador nacional do PSD e presidente do Sindicato dos Comerciários de São Paulo, Ricardo Patah.

A seguir a íntegra do documento:

“Aprovação do auxílio emergencial já

Os quadros socioeconômico e de saúde são gravíssimos

Antes da crise atual da Covid-19 a economia brasileira já sofria com  tendência à estagnação, alto desemprego, desigualdade em ascensão e  baixa produtividade e competitividade. A pandemia agravou esse quadro,  jogando a economia brasileira novamente em recessão, o que pode  resultar em uma década perdida. 

 A crise também escancarou as mazelas da desigualdade, atingindo  profundamente as populações mais vulneráveis social e economicamente.  A taxa de desocupação aumentou de 11,6% da força de trabalho para 14,1% entre os trimestres encerrado em fevereiro de 2020 e o terminado em novembro de 2020. Esta variação representa um aumento de  aproximadamente 1,7 milhão de desempregados e atinge a cifra de 14  milhões de desempregados. No mesmo período, 8,1 milhões de  trabalhadores perderam suas ocupações e pararam de procurar emprego  por força da pandemia. Somado o aumento do número de desempregados  com o êxodo de pessoas da força de trabalho, temos um contingente  adicional de quase 10 milhões de brasileiros (as) retirados (as) do mercado  de trabalho ao longo desse período. 

 O Auxílio Emergencial injetou centenas de bilhões de reais na economia  brasileira, proporcionando renda para milhões de brasileiros que  perderam sua atividade econômica por conta da pandemia. Esta medida, que foi protagonizada pelo Congresso Nacional, impediu uma elevação  mais forte do desemprego e uma queda ainda mais brutal do poder de  compra da população, evitando uma tragédia social e amortecendo a queda do nível de atividade econômica ao longo do ano.

 O encerramento do auxílio emergencial em dezembro de 2020 certamente provoca efeitos maléficos sobre os indicadores sociais e econômicos. Primeiramente, os 10 milhões de brasileiros vulneráveis, atualmente fora do mercado de trabalho, não terão outra alternativa  senão buscar retornar a este mercado, mesmo que em condições mais precárias, expondo-se ao risco de contaminação com uma cepa mais agressiva do vírus. Em segundo lugar, os efeitos macroeconômicos do encerramento do auxílio emergencial somente agravariam a crise, especialmente se acompanhado do retorno à gestão fiscal anterior ao  início da pandemia, ancorada no “teto de gastos” e na “regra de ouro”.  Neste caso, gerar-se-ia a maior contração fiscal da história do país, com  um efeito devastador sobre a demanda agregada e, por conseguinte, sobre a geração de emprego e renda. 

 Os 10 milhões de brasileiros vulneráveis, atualmente fora do mercado de trabalho, não terão outra alternativa  senão buscar retornar a este mercado, mesmo que em condições mais precárias, expondo-se ao risco de contaminação com uma cepa mais agressiva do vírus.

 Além da crise de emprego e humanitária, o Brasil se depara no início de  2021 com uma segunda onda de contágios de Sars-Cov-2. Dado o  excessivamente lento ritmo de vacinação, é pouco provável que uma  parcela significativa da população brasileira esteja imunizada até o final do  primeiro semestre de 2021. Para agravar o quadro, a temporada de  doenças respiratórias começa em abril/maio, o que deverá aumentar de  forma significativa o número diário de mortes pela Covid-19.

 Os efeitos macroeconômicos do encerramento do auxílio emergencial somente agravariam a crise, especialmente se acompanhado do retorno à gestão fiscal anterior ao  início da pandemia, ancorada no “teto de gastos” e na “regra de ouro”.  Neste caso, gerar-se-ia a maior contração fiscal da história do país, com  um efeito devastador sobre a demanda agregada e, por conseguinte, sobre a geração de emprego e renda

 Face a esse cenário, torna-se absolutamente necessária a renovação  imediata e incondicional do auxílio emergencial. Do contrário, teremos um  cenário macabro: o aumento exponencial do número de mortes  combinado com aumento exponencial da miséria e da fome. Trata-se de um cenário de “terra arrasada”, compatível com o vivenciado pelos países  europeus durante a segunda guerra mundial.

A crise é humanitária, o auxílio é emergencial

 A renovação do auxílio emergencial é urgente e fundamental, e não deve  ser atrelada a nenhuma condicionalidade. A renovação do auxílio  emergencial, por tratar-se de uma resposta a uma crise humanitária sem precedentes, similar a uma situação de guerra ou catástrofe natural, não pode estar condicionado a quaisquer outras políticas ou debates. A crise é séria, e o auxílio é emergencial. Vidas estão em jogo.

 A alegada preocupação com a situação fiscal não pode ser utilizada como  justificativa. Sequer há motivos técnicos para justificar tais alegações no  campo fiscal. De fato, em função da recessão e dos gastos com o auxílio e  das demais medidas emergenciais, a dívida bruta do governo geral passou  de 74,6% do PIB em janeiro de 2020 para 89,3% do PIB em dezembro do  ano passado. Porém, este aumento não é um caso isolado e restrito ao  Brasil: é um fenômeno mundial. 

 Neste momento, é muito mais importante pensarmos em salvar vidas que  sanar imediatamente a dívida do setor público. Reiteramos que a situação  fiscal brasileira é sustentável e existe “espaço fiscal” para um aumento do  investimento público, mesmo porque a evidência empírica disponível mostra que não existe nenhum número mágico para a relação dívida  pública/PIB a partir do qual o mercado se recusa a financiar o governo. Vários países, muitos dos quais sem moeda própria, como, por exemplo, a  Itália e a Espanha, já ultrapassaram o patamar de 100% de relação dívida  pública/PIB e continuam se financiando normalmente com taxas de juros  reais muito baixas. 

Nossa proposta

 Como regra geral, sugerimos a extensão IMEDIATA E INCONDICIONAL do  auxílio emergencial com valor compatível com a subsistência das famílias  e até a significativa melhoria dos indicadores relativos ao controle da  pandemia e à evolução da vacinação.

Valor: Propomos um valor inicial de R$ 600 (seiscentos reais), por ser esta quantia compatível com o da cesta básica e, portanto, o minimamente necessário à subsistência das famílias.

Prazo: No que concerne o prazo, propomos que este auxílio valha até o  final do ano fiscal, ou seja, 31 de dezembro de 2021, podendo ser  renovado caso o índice de transmissão (RT) permaneça acima de 0.9,  quando a população trabalhadora, especialmente a mais vulnerável, poderá retornar ao mercado de trabalho com um risco de contaminação significativamente menor. Caso o auxílio venha a ser renovado do prazo ao final deste primeiro período, será fundamental se considerar um valor reajustado que garanta seu objetivo fundamental de permitir a  sobrevivência das famílias que o recebem.

 Regra de transição: Recomendamos que, uma vez extinto o auxílio,  haja uma regra de transição para os meses seguintes. Sugerimos que, nesta transição, o valor do auxílio seja reduzido em R$ 50 por mês subsequente sempre que o índice RT continue em queda.

 Financiamento: Preferimos que o auxílio emergencial não seja  financiado através da venda de títulos públicos ao mercado, para evitar o  aumento da dívida pública mantida por agentes privados. Na maioria dos  países, o mecanismo utilizado tem sido a venda de títulos pelo Tesouro ao  Banco Central. Se for uma solução politicamente complicada, por requerer  mudança constitucional, há alternativas, como a contabilização específica da contribuição dessa despesa para o aumento da dívida pública. Mas  reiteramos que a primeira alternativa de financiamento, se passível de ser  negociada e votada, seria melhor.

 A renovação do auxílio emergencial é urgente, e salvará vidas. Mas, como  descrevemos em documento anterior (Direitos Já!: Sugestão de Agenda  Econômica Mínima), é insuficiente para tirar a economia brasileira do  quadro de estagnação vivenciado ao longo da década passada: o Brasil  necessita urgentemente de uma agenda alternativa de recuperação  econômica.

Direitos Já! Fórum pela democracia”