“Não à extradição de Assange”, exige porta-voz do Tribunal Belmarsh
O jornalista e escritor Robert Koehler, pelo portal Common Dreams, destacou a exigência pelo ‘Tribunal Belmarsh’ que o fundador do WikiLeaks e denunciante dos crimes de guerra dos EUA no Iraque e Afeganistão, Julian Assange, não seja extraditado aos EUA, o que poderá ser definido até quinta-feira (28) por dois juízes britânicos.
Como ele destacou, o Tribunal está inspirado no tribunal de 1966 organizado por Bertrand Russell e Jean-Paul Sartre para responsabilizar os EUA por suas ações no Vietnã, e coloca Washington “em julgamento por seus crimes de guerra do século 21”.
Sai Trump, entra Biden, e para os EUA, Assange continua sendo uma ameaça às guerras sem fim do Pentágono, e, para Washington, precisa ser silenciado.
Koehler registra que “a oferta do Pentágono de ‘dinheiro de condolências’ para os familiares das 10 pessoas (sete delas crianças) que foram mortas no derradeiro ataque de drone dos EUA no Afeganistão – originalmente declarado justo e necessário – tem uma conexão preocupante com os atuais esforços do governo para colocar as mãos no fundador do WikiLeaks, Assange, e puni-lo por expor a inconveniente verdade da guerra”.
“Você sabe, as coisas ‘classificadas’ – como tripulantes do helicóptero Apache rindo depois de matar um bando de homens em uma rua em Bagdá em 2007 (‘Oh sim, olhe para aqueles bastardos mortos’) e, em seguida, rindo mais um pouco depois de matar aqueles que começaram a recolher os corpos, no processo também ferindo várias crianças que estavam na van que acabaram de explodir. Isso não é coisa que o público americano precise saber!”, sublinha Koehler, sobre o “Assassinato Colateral”, o vídeo do próprio Pentágono, exposto pelo WikiLeaks, e que resumiu exemplarmente as dezenas de milhares de páginas de documentos da guerra.
Na época do lançamento desse vídeo, em 2010, destaca Koehler, o então secretário de Defesa Robert Gates lamentou o fato de que o público estava “vendo um fragmento da guerra contra o terrorismo ‘fora de contexto’”.
Como o colunista escreveu mais tarde: “O Departamento de Defesa deve ter controle total sobre o contexto; no front doméstico, a guerra é 100% relações públicas. O papel do público é ser espectador, consumidor de notícias orquestradas; eles podem assistir a bombas inteligentes sendo lançadas do alto e ouvir que isso os está protegendo do terrorismo e espalhando a democracia. Esse é o contexto.”
Assim, o crime de Assange foi ter colaborado com denunciantes “para expor dados ocultos e perturbar esse contexto. Ao longo de uma década, o WikiLeaks publicou cerca de 10 milhões de documentos secretos, mais do que o resto da mídia mundial combinada”, revelou vídeo da Internacional Progressista, organização que lançou o Tribunal Belmarsh.
Abstração da Guerra
“O desespero do governo para extraditar, julgar e essencialmente se livrar de Assange é profundamente compreensível. Ele é uma ameaça à própria guerra – isto é, à abstração da guerra, ou seja, ‘defesa nacional’, que reivindica um trilhão de dólares por ano em financiamento inquestionável (e sempre crescente) e permanece na consciência pública como justa do jeito que as coisas são”, denuncia o jornalista norte-americano.
É como ele sublinha: “ao penetrar nas realidades da guerra e retirá-la de seu contexto público cuidadosamente orquestrado, ao divulgar seus horrores cruéis, [Assange] se tornou um perigo para o status quo político do país”.
Tanto é verdade, que: “Em 2017,” o Yahoo! New s relatou um mês atrás, “quando Julian Assange começou seu quinto ano trancado na embaixada do Equador em Londres, a CIA planejou sequestrar o fundador do WikiLeaks , estimulando um acalorado debate entre funcionários do governo Trump sobre a legalidade e praticidade de tal operação”.
“Opções” para assassinar
Koehler reproduz o depoimento de ex-oficial da contraespionagem ao Yahoo! News: “alguns altos funcionários da CIA e do governo Trump até discutiram a morte de Assange, chegando ao ponto de solicitar ‘esboços’ ou ‘opções’ de como assassiná-lo”. As discussões sobre o sequestro ou assassinato de Assange ocorreram “nos escalões mais altos” do governo Trump, afirmou. “Parecia não haver limites”,
O colunista da Common Dreams ressalta como o desastre conhecido como Guerra do Vietnã levou a algo chamado de “Síndrome do Vietnã”, uma repulsa pública pela própria guerra. Que inconveniente para o governo, que ainda estava engajado na Guerra Fria com os comunistas, mas só podia travar guerras por procuração, por exemplo, na Nicarágua, onde os contras tinham que fazer o trabalho sujo, ele observa.
“Por Deus, acabamos com a síndrome do Vietnã de uma vez por todas”, diria finalmente Bush Pai, em 1991, ao lançar a Primeira Guerra do Golfo no Iraque.
“Os EUA finalmente estavam livres para militarizar novamente sua propaganda, ou seja, para difundir a democracia pelo mundo com a ajuda de bombas e balas”, enfatizou Koehler. Como a União Soviética havia entrado em colapso e a Guerra Fria havia acabado, “um novo inimigo precisava ser encontrado, mas isso não era problema. Uma década depois, Bush Jr. lançou a Guerra ao Terror e as guerras intermináveis do século 21 começaram”.
Graças à coragem de Assange, o Pentágono fracassou em manter seu “controle sobre o contexto”. Ao desafiar todas as restrições à verdade e expor as realidades cruas dessas guerras – as mentiras, o inferno – Assange traria de volta à vida as estatísticas da guerra.
“Pelo menos 801.000 pessoas foram mortas pela violência de guerra direta no Iraque, Afeganistão, Síria, Iêmen e Paquistão”, segundo o Projeto Custos da Guerra da Universidade Brown. “O número de pessoas que ficaram feridas ou adoeceram em decorrência dos conflitos é muito maior, assim como o número de civis que morreram indiretamente em consequência da destruição de hospitais e infraestrutura e da contaminação ambiental, entre outros problemas de guerras relacionados.”
E: “Milhões de pessoas que vivem nas zonas de guerra também foram deslocadas pela guerra. As guerras pós-11 de setembro nos EUA deslocaram à força pelo menos 38 milhões de pessoas no Afeganistão, Iraque, Paquistão, Iêmen, Somália, Filipinas, Líbia e Síria. Este número excede o total de deslocados por todas as guerras desde 1900, exceto a Segunda Guerra Mundial.”
O governo dos EUA pediu desculpas por 10 dessas mortes, e apenas – apenas! – porque o incidente foi investigado e chegou ao conhecimento do público, conclui Koehler.