Haitianos deportados dos EUA recuperam pertences jogados na pista do aeroporto de Porto Príncipe

No momento em que crescem as manifestações de repúdio ao racismo e à xenofobia praticados pelo governo dos Estados Unidos contra os imigrantes haitianos – incluindo o documentado mais recentemente nas imagens de haitianos sendo chicoteados em Del Rio, no Texas -, o presidente Joe Biden se viu forçado a uma declaração onde diz considerar aquilo “ultrajante” sem, no entanto, mudar a acelerada onda de deportações. Dois mil haitianos foram mandados de volta para Porto Príncipe somente na sexta-feira (24), em 17 voos de expulsão.

Para Paul O’Brien, diretor-executivo da Anistia Internacional dos Estados Unidos foi um dos que ergueu a voz contra a agressão: “A conduta horrível dos agentes da Alfândega e Proteção de Fronteiras (CBP), incluindo policiais atacando a cavalo multidões de requerentes de asilo haitianos, dispersando-os violentamente, insultando-os e forçando-os a fugir da segurança, é repreensível e enfatiza um problema mais profundo de racismo e sistêmico tratamento contra haitianos e outros imigrantes negros nos Estados Unidos e na fronteira sul”.

Após esta e outras manifestações, e questionado se sentia responsabilidade no “caos que está se desenrolando” na fronteira sul do seu país, Biden respondeu: “é claro que assumo a responsabilidade. Sou presidente”, acrescentando que era “horrível … ver as pessoas tratadas como foram: cavalos quase atropelando-as e pessoas sendo amarradas. É ultrajante”.

Diante de inúmeros veículos de imprensa, Biden prometeu que os agentes montados na beira do rio Bravo, na fronteira com o México, “vão pagar” e que uma investigação federal está em andamento. “Haverá consequências. É uma vergonha. Mas além de uma vergonha, é perigoso; está errado. Envia a mensagem errada ao redor do mundo. Envia a mensagem errada em casa. Simplesmente não é isso o que somos”, declarou o presidente, enquanto acionava a deportação massiva. Cerca de 13 mil haitianos estão prestes a ser enviados de volta para onde fugiram das aterradoras condições políticas, econômicas, sociais e sanitárias.

A Associated Press relatou que “um oficial estadunidense, com conhecimento direto da situação, disse que seis voos estavam programados para o Haiti na sexta-feira, com sete planejados para sábado e seis para domingo, embora isso estivesse sujeito a alterações. O oficial não estava autorizado a falar publicamente”.

O ex-candidato democrata à presidência de 2020, Julián Castro, declarou que estava “feliz em ver o presidente Biden falar abertamente sobre os maus-tratos aos requerentes de asilo haitianos”. “Mas o uso do Título 42 por seu governo para negar a eles o direito de fazer um pedido de asilo é uma questão muito maior. Queremos o fim do uso do Título 42”, acrescentou, referindo-se a uma política já aplicada pelo ex-presidente Donald Trump, para deportar pessoas rapidamente alegando razões saúde pública, devido à pandemia de Covid-19. Julián Castro havia criticado o silêncio de Biden sobre os agentes do CBP como “desconcertante e decepcionante”.

Respondendo às declarações de Biden, o grupo de ajuda humanitária No More Deaths (Não mais mortes) disse que os agentes federais atacam os migrantes “todos os dias no deserto remoto, longe das câmeras” e que “o problema não são algumas maçãs podres, é um sistema podre”.

Com a repercussão do vexame, o enviado especial do governo dos EUA ao Haiti, Daniel Foote, renunciou numa carta em que que destacou as trágicas condições do país caribenho, que sofre sob o domínio de milícias, do assassinato do ex-presidente Jovenel Moïse em julho, seguido por um terremoto e uma violenta tempestade tropical.

Foote escreveu que não será associado à “decisão desumana e contraproducente de deportar milhares de refugiados haitianos e imigrantes ilegais para o Haiti, um país onde as autoridades americanas estão confinadas a complexos seguros por causa do perigo representado por gangues armadas”. Na sua avaliação, “a abordagem política do governo Biden para o Haiti continua profundamente falha, e minhas recomendações foram ignoradas e rejeitadas”.