Apesar das declarações, os números da violência policial em São Paulo, dispararam durante a quarentena. Para especialistas, o cenário indica, na verdade, uma escalada da violência policial em São Paulo, principalmente nas periferias, durante a quarentena.
Dados oficiais da Secretaria da Segurança Pública (SSP) mostram que São Paulo registrou 119 casos de “mortes decorrentes de intervenção policial” em abril. Na prática, uma pessoa morta por um policial a cada 6 horas. O levantamento agrupa as ocorrências envolvendo as Polícias Militar e Civil. Em comparação com o mesmo período do ano passado, o índice subiu 52,5% e atingiu o mais patamar mais alto para o quadrimestre desde o início da série histórica, em 2001.
Em contrapartida, os 13 indicadores de produtividade policial, listados no site da SSP, pioraram no mesmo período. Para prisões em flagrante, por exemplo, a queda foi de 21,7%, reduzindo de 10.912, em abril de 2019, para 8.545, neste ano. No total de prisões, incluindo mandados judiciais, o recuo foi de 16.434 para 10.080, ou 38,6%.
As polícias também apreenderam menos armas de fogo (22%) e recuperaram menos veículos (43,6%) durante a quarentena. Por sua vez, o número de atendimentos a ocorrências de tráfico de entorpecentes caiu 16,4%, passando de 4.082 para 3.410 no mês de abril, enquanto a quantidade total de inquérito policiais reduziu 26%, de 33.333 para 24.657.
“Naturalmente, se esperava que a produtividade das polícias cairia durante o período da quarentena, até por causa do próprio isolamento social e da queda do número de crimes”, diz o pesquisador Ivan Marques membro do Fórum Brasileiro de Segurança Pública. “Agora, causa bastante espanto que, mesmo com o Estado praticamente paralisado, a polícia tenha conseguido aumentar os índice de letalidade. Isso não é normal em uma sociedade que está ‘trancada’.”
Casos como o de Igor, em 2 de abril, estão se tornando cada vez mais comuns. Segundo familiares, os PMs disseram que receberam uma denúncia sobre um suspeito armado e que o jovem saiu correndo da padaria ao ver os policiais. Encurralado em uma viela, teria tentado atirar nos agentes, mas acabou baleado.
A família contesta a versão. “Meu filho foi atingido por trás”, relata Ana Paula Oliveira Rocha, de 44 anos, mãe de Igor, que na ocasião se recuperava da covid-19, mas saiu de casa a tempo de ver o corpo, já sem vida, do filho ser posto na maca da ambulância. “Teve testemunha que viu tudo: ele estava só com celular e o dinheiro da padaria. Morreu segurando a bermuda que estava folgada. Eu mesma tinha dado um ponto antes de ele sair de casa, não havia arma nenhuma”, contou Ana Paula, em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo.
De acordo com a mãe, Igor foi ameaçado por um policial dois meses antes de morrer por ser ex-interno da Fundação Casa. O jovem foi detido, em 2019, após tentar roubar um carro junto com três amigos. Ele ficou seis meses na unidade no Jabaquara, também na zona sul da capital, de onde saiu em dezembro.
“Meu filho errou, pagou pelo que fez e não estava mais errando. Estava feliz porque começou a fazer curso, ia trabalhar em seis meses, aí vem uma pessoa e tira a vida dele?”, diz a mãe. “Minha vida acabou. Se fosse filho de rico, o policial estaria preso. Como a gente é da periferia, ficam enrolando, achando que vamos cansar. Eu não vou cansar até receber Justiça”.