“O Ministério da Saúde é do Lula, foi escolhido por mim e ficará até quando eu quiser”, disse presidente Foto: Fabio Rodrigues-Pozzebom/ Agência Brasil

A ministra da Saúde, Nísia Trindade, tem sido alvo de uma nova série de ataques provenientes de diversas frentes, desde a sua gestão na Fiocruz até críticas de parlamentares, acusações da base governista, ataques bolsonaristas, “fogo amigo” e alegações de suposto favorecimento a prefeituras. Ainda no início do governo, o Centrão já havia pressionado para ampliar seu espaço na Esplanada, em meio às negociações para a entrada de PP e Republicanos na base de sustentação, e passou a exigir o cargo de Nísia. A ministra, no entanto, recebeu apoio público de Lula.

Essa nova onda de ataques é interpretada como um fenômeno multifacetado, com objetivos como o de afastar o controle técnico do Ministério, com preparação política e alinhado com a diretriz que o próprio presidente Luís Inácio Lula da Silva tem dado, reduzindo, assim, o protagonismo da Pasta na reconstrução do Estado, segundo gestores consultados.

O Ministério da Saúde passou por uma reformulação e recomposição consideráveis, buscando conciliar a retomada da liderança com um protagonismo político mais ativo. Trata-se de uma pasta que vai consolidando um perfil técnico de políticas de estado permanentes, que incomoda quem quer instrumentalizá-la para interesses próprios. O primeiro ano da gestão já testemunhou um aumento substancial nos recursos destinados à saúde, com cerca de R$ 30 bilhões a mais em comparação ao ano anterior, que cresce mais R$ 44 bi, em 2024.

Orçamento aberto

A crítica mais recente diz respeito a dificuldade para liberação de emendas parlamentares. Teria aumentado a burocracia para os municípios receberem esses recursos. Uma das principais alterações foi a exigência de aprovação prévia pela Comissão Intergestores Bipartite, composta por gestores do Estado e dos municípios. Em maio, quando as primeiras regras foram estabelecidas para os recursos dessa cota parlamentar, a priorização dos projetos com aprovação nas comissões bipartites era prevista, mas não havia a necessidade de certificação para a transferência.

A questão central, segundo fontes consultadas, reside na transição do orçamento secreto para uma execução discricionária do Ministério da Saúde, o que gerou desconforto em alguns setores políticos. A distribuição mais direta e transparente dos recursos desagradou grupos que, historicamente, disputam o controle da pasta desde a transição do governo Lula. A própria disponibilidade superior de orçamento, permite um acesso dos municípios a recursos incomparável com o período bolsonarista, com muita mais agilidade.

A estratégia adotada pelos opositores parece ser a criação de factoides e campanhas baseadas em fake news para desestabilizar a ministra e sua gestão. Exemplos recentes incluem a polêmica em torno da compra de testes rápidos e alegações infundadas sobre a atuação do Ministério da Saúde em relação à Fundação Osvaldo Cruz (Fiocruz), dirigida anteriormente pela ministra Nísia.

No entanto, a imprensa deixa de dizer que a compra foi feita pelo governo anterior, e que, inclusive, o preço foi reajustado. No final, o processo de contas foi encerrado e houve conhecimento de que não houve nenhum tipo de sobrepreço na compra dos testes e que são testes que foram utilizados no enfrentamento da pandemia. Este é um dos ataques que são jogados, agora, sobre os ombros do atual Ministério da Saúde.

Uma das denúncias deste comportamento dos opositores, instrumentalizando a imprensa, veio de Gleisi Hoffmann (PR), deputada e presidenta nacional do Partido dos Trabalhadores (PT), que expressou sua solidariedade à ministra Nísia, por ser “alvo de intrigas e notícias falsas plantadas na imprensa contra sua gestão”. Hoffmann rebateu uma matéria recente da Folha de S.Paulo, que criticava as mudanças no processo de transferência de recursos.

Segundo a deputada, ao contrário do que foi veiculado, a ministra agilizou a transferência de verbas para estados e municípios, resultando em um aumento de quase R$ 5 bilhões no final do ano. “Por trás disso, obviamente, estão grupos políticos ávidos por abocanhar o Ministério da Saúde”, diz a dirigente petista.

O senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) também criticou o anonimato e covardia das críticas. “Por que a competência, a seriedade e o comprometimento da ministra Nísia Trindade com o povo brasileiro e com nosso projeto de reconstrução do país têm causado tanto incômodo? Às críticas anônimas e covardes à sua gestão, a ministra responde com resultados e entregas”, diz ele, acrescentando o anúncio mais recente que o Ministério da Saúde publicou portaria para retomar obras inacabadas e paralisadas, no âmbito do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento), envolvendo hospitais, UBS, equipamentos e centros de reabilitação.

Como estes, inúmeros outros parlamentares e políticos expressaram sua solidariedade à ministra nas redes sociais.

Objetivos divergentes

Mas estes ataques nem sempre expressam uma convergência de objetivos entre os diferentes atores. Embora existam temas relacionados a realidades regionais e locais que impulsionam ataques específicos, não se pode considerar todos os ataques como parte de uma única estratégia coordenada. No entanto, é evidente que diversos atores têm manifestado publicamente o interesse em desestabilizar a gestão do Ministério da Saúde e, possivelmente, substituir a atual direção por uma mais alinhada às suas expectativas.

Críticas de que os hospitais federais, particularmente no Rio de Janeiro, estariam sendo relegados por uma suposta inoperância do Ministério tem sido respondida com o esclarecimento de que , desde o início de 2023, foram reabertos 390 leitos dos 593 que se encontravam bloqueados nas seis unidades. Além disso, foram iniciadas e inauguradas obras como o Hospital Dia, do Hospital Federal do Andaraí, e a Casa Mãe, e do terceiro andar do Hospital Federal de Bonsucesso.

A retomada da atividade desses hospitais está em andamento, e decisões importantes estão sendo tomadas para reintegrá-los aos complexos de garantia de acesso em cada estado. Alguns dos hospitais mencionados em reportagens, recebem apoio do Ministério da Saúde, mas não são de gestão da pasta.

As estruturas hospitalares são complexas e demandam tempo para reformulação e tomada de decisões significativas. Contrariando a ideia de inoperância, o Ministério responde que as ações estão ocorrendo e que é necessário compreender a temporalidade necessária para efetivar mudanças nesse setor.

A deputada do Rio de Janeiro, Jandira Feghali (PCdoB), é uma das que defendem a liderança da ministra Nísia Trindade, pelo modo assertivo que tem enfrentado um processo de reconstrução após quatro diferentes ministros no governo anterior, que negava a ciência e desestruturava a própria pasta. Jandira pontuou importantes avanços do Ministério, apesar de um ano ser pouco para atender todas as demandas.

“Um ano é pouco para responder a todas as demandas, mas muito já foi entregue à população, recursos foram repostos e estão sendo gastos com critérios técnicos, transparentes, honestos e com muito diálogo com Estados e Municípios”, afirma no X. 

Para ela, destacam-se o aumento em quase seis vezes do número de equipes da Saúde da Família, a reformulação do programa Mais Médicos, que beneficiou 86 milhões de brasileiros, e a ampliação de recursos para a média e alta complexidade, além das campanhas de vacinação. A gestão também promoveu a recuperação do Departamento de Saúde Mental e reintroduziu o Ministério na agenda de tecnologia e inovação. 

O recado da deputada Jandira sobre os ataques coordenados contra a ministra foi no sentido de criticar seus objetivos mesquinhos. “Neste momento precisamos nos unir em defesa do SUS e deixar a ministra e sua equipe trabalharem para aumentar a boa e competente atuação do Ministério da Saúde e do governo Lula. Certamente, as tentativas de desestabilização não almejam a melhoria da saúde no país, mas interesses menores e distantes da prioridade do nosso povo”, afirma.

Cabo Frio e a “ilação absurda”

Também tratando da onda de ataques, o deputado federal Lindbergh Farias (PT-RJ) também defende a ministra de um tipo de ataque baixo, por associar elementos que não estão relacionados. Segundo Farias, os motivos habituais envolvem a cobiça pelo ministério e a destacada atuação da ministra como defensora incansável do Sistema Único de Saúde (SUS). Mas ele se pronuncia sobre uma acusação específica relacionada ao seu mandato e à liberação de recursos para Cabo Frio.

A acusação em questão gira em torno de uma suposta relação entre a liberação de recursos para a cidade e a nomeação do filho da ministra como secretário de Cultura. No entanto, o deputado ressalta que o cerne da questão não é a nomeação do filho da ministra, mas sim a luta por recursos para a saúde em Cabo Frio. 

“Ser secretário de Cultura não é nenhum prêmio, pelo contrário, é um enorme desafio que espero que seja exitoso. Mas, o fato não é esse. A verdade é que essa luta para aumentar os recursos da média e alta complexidade em Cabo Frio é antiga e eu participei desde o início”, diz o deputado no X.

Lindbergh explica que essa batalha foi iniciada pelo prefeito José Bonifácio (PDT), que fundamentou os pedidos com argumentos técnicos sólidos, considerando o papel de Cabo Frio como cidade polo que atende pacientes das cidades vizinhas. Mesmo após a morte de José Bonifácio e a posse da prefeita Magdala Furtado (PL), o deputado continuou sua luta por recursos, realizando reuniões no Ministério da Saúde para beneficiar Cabo Frio e a região dos lagos.

O deputado esclarece que a decisão de liberação dos recursos foi comunicada à prefeita em dezembro. Ele ressalta que, embora tenha sido uma vitória parcial, pois não foi possível incorporar esses valores ao teto de média e alta complexidade de forma permanente, ainda representa um avanço significativo para a cidade.

O deputado também aponta a ironia de alguns parlamentares de oposição questionarem essa liberação de recursos para Cabo Frio, enquanto se omitem diante de valores muito maiores destinados a municípios do Rio de Janeiro administrados por bolsonaristas, o que reflete o republicanismo do Governo Lula. Ele menciona que São Gonçalo e Duque de Caxias receberam quantias expressivas, com parte desses recursos incorporados anualmente aos tetos de média e alta complexidade.

“São Gonçalo recebeu R$ 164 milhões, sendo que R$ 110 mi foram incorporados ao teto, ou seja, serão recebidos todo ano. Duque de Caxias recebeu R$ 210 mi e R$ 114 mi foram incorporados. A oposição se cala porque é cínica. Nós temos que falar. Lula liberou esses recursos, independente dos prefeitos, porque São Gonçalo é a segunda maior cidade do estado do Rio, Duque de Caxias é a terceira e Lula tem compromisso com o povo que mora e vive nessas cidades”, afirma.

O Ministério da Saúde enfrenta um desafio duplo: não apenas consolidar os avanços já conquistados, mas também enfrentar a instrumentalização política que tenta transformar o Sistema Único de Saúde (SUS) em um campo de disputas pragmáticas e fisiológicas, contrárias ao objetivo de unir e reconstruir o país.

Apesar da complexidade e das tentativas de desestabilização, a ministra Nísia Trindade busca manter o foco na missão de transformar o SUS em um espaço de união e reconstrução nacional, conforme orientação do presidente Lula. O desafio reside em superar obstáculos políticos e garantir que o sistema de saúde do país contribua efetivamente para a recuperação e fortalecimento da nação.