O subprocurador-geral da República junto ao Tribunal de Contas da União (TCU), Lucas Furtado, solicitou nesta semana (19) que a área técnica do TCU abra investigação sobre o orçamento secreto, esquema montado pelo governo Bolsonaro para subornar parlamentares.

Segundo o esquema revelado pelo Estadão, o governo operou secretamente um orçamento paralelo de R$ 3 bilhões para favorecer aliados políticos com compras fraudulentas e superfaturadas, em troca de apoio no Congresso Nacional. Boa parte dos recursos – cerca de R$ 2 bilhões – foi repassada para empresas privadas na compra de tratores e equipamentos agrícolas com sobrepreço de até 259% acima dos valores de referência fixados pelo próprio governo. O Estadão revelou 101 ofícios que expõem essas negociações e que não estão públicos.

A área técnica do TCU inicialmente irá concentrar seus esforços para apurar a forma como o Ministério do Desenvolvimento Regional e a Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (Codevasf) usaram R$ 2 bilhões das emendas de relator-geral do Orçamento de 2020 em contratos com empresas privadas.

“O capítulo que se inicia agora é a identificação das empresas beneficiárias de contratos para fornecimento de equipamentos com recursos oriundos do chamado ‘orçamento paralelo’ (…), empresas essas que supostamente estariam incorrendo em possíveis fraudes e superfaturamentos”, diz um trecho do texto da representação assinada pelo subprocurador-geral da República.

Segundo Lucas Furtado ainda, chamam a atenção às justificativas usadas por alguns deputados e senadores para manter sob sigilo a participação nos acordos para destinação das verbas.

“Diante de tão rígido e alegado sigilo com que é tratado o tema (…), não resta outra alternativa senão o aumento no rigor, na urgência e na profundidade das investigações, cabendo aos órgãos que têm por missão velar pelo bom e regular uso dos recursos públicos, envidar todos os esforços para esclarecer os fatos e circunstâncias”, escreve o procurador, citando as reportagens do Estadão.

Nesta semana, uma nova reportagem do Estadão mostrou como o atual ministro da Casa Civil, o general da reserva do Exército Luiz Eduardo Ramos, participou diretamente da criação do orçamento secreto, quando era o então ministro-chefe da Secretaria de Governo da Presidência da República. Segundo o jornal, Eduardo Ramos foi o responsável por resgatar o mecanismo das emendas de relator-geral, marcadas no Orçamento com o código identificador de resultado primário RP 9 – modalidade de emenda proposta inicialmente no relatório da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2020, que a possibilidade do parlamentar decidir, sem ninguém saber, o destino da verba. A RP 9 foi vetada por Bolsonaro na época, com o argumento de que o mecanismo contraria o “interesse público”. No entanto, a RP 9 foi reintroduzida no projeto por Ramos.

O ministro assinou a exposição de motivos que acompanha o projeto de lei que criou a emenda chamada RP9. O texto deixa claro que foi o ministro quem propôs o projeto, demonstrou o Estadão. “Diante do exposto, submeto a sua consideração o anexo Projeto de Lei que ‘Altera a Lei no. 13.898, de 11 de novembro de 2019, que dispõe sobre as diretrizes para a elaboração e a execução da Lei Orçamentária em 2020 e dá outras providências”, escreveu o general ao presidente Bolsonaro.

Também na última quarta, o ministro do TCU, Raimundo Carreiro, apresentou comunicado na sessão para determinar que a área técnica do TCU atue junto ao governo federal para garantir a “devida transparência da totalidade dos recursos alocados via emendas parlamentares”. Dados apresentados por Carreiro apontam que o total das dotações de emendas parlamentares de execução obrigatória aprovadas na lei orçamentária cresceu 212% de 2016 a 2021.

Em 2020, as dotações corresponderam a 34% do total de despesas discricionárias. Em 2021, 27,5%. “O controle efetivo sobre a aplicação desses recursos requer uma visão ampla do conjunto das emendas e de sua destinação, que ajude a elucidar alguns padrões e antecipar riscos, permitindo uma atuação ágil para prevenir desvios e irregularidades, ou até mesmo lacunas normativas”, pontuou o ministro em seu comunicado.