Infraestrutura de distribuição de gás natural

A primeira-ministra alemã, Angela Merkel, rejeitou as sugestões de que o aumento do preço do gás na Europa se deve à política russa e apontou que o problema está na própria abordagem da União Europeia. Ela ressaltou que a Rússia nunca se recusou a entregar gás e cumpre escrupulosamente suas obrigações contratuais.

“É por isso que devemos fazer a pergunta: foi pedido gás suficiente ou o preço alto no momento talvez seja a razão para não pedir tanto?”, questionou Merkel, de acordo com o Financial Times de Londres.

Nas últimas semanas, o preço do gás natural na União Europeia foi à estratosfera, enquanto aumentou o temor sobre a escassez de gás diante do inverno que se aproxima, na medida em que os estoques estão baixos.

Na quarta-feira, os preços do gás natural na Europa voltaram a disparar, com os futuros se aproximando de US$ 2.000 por 1.000 metros cúbicos na quarta-feira – quase três vezes o seu custo em setembro -, antes de cair.

O porta-voz do Kremlin, Dmitry Peskov, reiterou que “Moscou não é de forma alguma culpada pela situação do mercado de gás na Europa, isso é inconcebível. A Rússia cumpriu, está cumprindo e cumprirá todas as obrigações assumidas nos contratos existentes de maneira consistente e completa”. Ele observou que a alta nos preços do gás se deve a uma variedade de fatores, e “apenas amadores” podem culpar a Rússia pela situação.

Em parte, o problema é decorrente da opção europeia para privilegiar nos últimos anos a comercialização do gás natural no mercado à vista [mais sujeito a oscilações pela especulação], em detrimento dos contratos de longo prazo, de até 25 anos, que a Rússia prefere e são muito mais estáveis e previsíveis.

Questão também abordada pelo presidente russo, que se reuniu na véspera com o vice-primeiro-ministro, Alexander Novak, para orientá-lo a trabalhar para apoiar a Europa na questão da energia.

Putin atribuiu a culpa da atual crise de oferta no mercado de gás da Europa aos formuladores de políticas de energia da União Europeia que favorecem os contratos de curto prazo com os fornecedores, sugerindo que a redução dos acordos de fornecimento de longo prazo e a dependência das trocas de gás provou ser um “erro óbvio”.

“De um modo geral, o comércio de gás na bolsa … não é muito eficaz, porque traz muitos riscos, pois o gás não é relógio, roupa íntima nem gravata, nem carro, nem óleo, que pode ser criado e armazenado em qualquer lugar, inclusive em petroleiros em antecipação a uma determinada situação do mercado”, assinalou Putin.

“O gás não é comercializado dessa forma, não pode ser armazenado desta forma “, acrescentou. O que também se aplica – explicou – ao gás natural liquefeito (GNL), já que os estoques precisam ser criados, comprimidos, carregados em navios-tanques, entregues e descomprimidos.

“É bem sabido que o mercado global de energia não tolera confusão e reviravoltas. Os planos de investimento nesta área são de longo prazo”, apontou.

“Portanto, ações duras e precipitadas podem levar a (e a julgar pela situação atual do mercado já conduziu a) desequilíbrios graves do tipo que agora assistimos no mercado europeu da energia, onde vários fatores desfavoráveis se desenvolveram em simultâneo este ano”, sublinhou o presidente russo.

Para Putin, o inverno excepcionalmente frio de 2020-2021 foi um dos fatores materiais responsáveis pela drenagem das reservas europeias de gás. A que se somou a dependência excessiva de energia verde, como a energia eólica, que acabou se mostrando problemática, apontou.

Outro fator destacado foi que “o equilíbrio energético da Europa mudou significativamente na última década”, com muitos países nas regiões rejeitando o carvão e a energia nuclear em favor da energia eólica, “que depende do clima.”

Demanda

Há ainda recuperação gradual do planeta da crise econômica relacionada à pandemia no ano passado, de que a crescente demanda global por energia é um sinal.

Segundo Putin, a empresa já entregou 15% a mais de combustível azul para a região nos primeiros nove meses de 2021 do que no mesmo período do ano passado e a gigante russa Gazprom poderá bater um novo recorde no fornecimento de gás para a Europa este ano, ultrapassando o recorde de 2018.

Putin enfatizou que “a Rússia sempre foi e continua a ser um fornecedor confiável de gás para consumidores em todo o mundo, tanto na Ásia quanto na Europa. A Rússia sempre cumpre integralmente todas as suas obrigações e gostaria de enfatizar a palavra ‘todas’”.

Ele rebateu as críticas de que a Rússia não estaria ajudando a Europa a superar a superar a atual crise de energia e estaria ‘retendo abastecimento’. “Não houve um único caso na história em que a Gazprom se recusou a aumentar o fornecimento aos seus consumidores. Mesmo em 2020, quando o total de entregas para a Europa diminuiu em relação a 2019, fornecemos 4,7 bilhões de metros cúbicos adicionais de gás para a Alemanha – totalizando 112,9%”, destacou.

Putin também apontou que a pegada de emissões de gases de efeito estufa das entregas de gás russo para a Europa usando oleodutos recém-construídos foi reduzida em 5,6 vezes em comparação com a infraestrutura mais antiga e permite que os suprimentos sejam bombeados a uma pressão mais alta.

Sem falar que os atrasos na construção do gasoduto Nord Stream 2 e, uma vez que foi concluído, a agilização de sua entrada em operação, são de responsabilidade, respectivamente, de Washington, que pressiona com sanções para impor seu mais caro gás de fracking, e das próprias autoridades de energia europeias, que inclusive decidiram estender ao novo gasoduto que vai direto da Rússia até à Alemanha a exigência de que a Gazprom só use metade da capacidade do gasoduto que construiu, como se fosse possível no caso que outra, que não uma empresa russa, fizesse tal fornecimento.

Fake news

No mês passado, um funcionário do Departamento de Estado dos EUA acusou a Rússia de entregar uma quantidade “inexplicavelmente baixa” de energia para a região “em comparação com os anos anteriores e com o que eles têm capacidade para fazer”. Alegação usada imediatamente para solicitar que o aumento do fornecimento fosse feito “via Ucrânia”.

Quanto a isso, Putin descartou tais especulações, ressaltando que a Gazprom aumentou as entregas de gás via Ucrânia em 8% durante os primeiros nove meses deste ano, e vai exceder suas obrigações contratuais de entrega nessa área em pelo menos 40 bilhões de metros cúbicos de gás por ano antes que 2021 acabe. Isso, embora em comparação com outras rotas não seja lucrativo para a Gazprom entregar suprimentos para a Europa via Ucrânia.

A Rússia responde por cerca de 41 % do abastecimento de gás da Europa, com a Noruega, Argélia e Qatar contribuindo com 16%, 8% e 5%, respectivamente.

Putin também achou pertinente a proposta da Gazprom para entrar na bolsa de futuros, para estabilizar os preços. “Vocês propuseram aumentar a oferta de gás no mercado, na bolsa, para conter a demanda especulativa e a turbulência na Europa. Isso pode ser feito … na bolsa de valores de São Petersburgo ”, declarou.

A notícia de que a estatal russa do gás iria agir logo chegou aos especuladores e o preço caiu para 22% menor que o preço de fechamento da véspera. Conforme a Intercontinental Exchange (ICE), o preço dos contratos futuros de gás de novembro no índice TTF holandês começou a ser negociado a quase US $ 1.260 por mil metros cúbicos na quinta-feira, então saltou brevemente para US $ 1.370 às 6h13 GMT e mais tarde mostrou um declínio estável. Por volta das 8h GMT, o preço caiu para US $ 973 por mil metros cúbicos.