O Ministério da Educação (MEC) contratou uma empresa para fornecer kits escolares a
estudantes que, de acordo com a Polícia Federal (PF), está envolvida em uma esquema que
desviou R$ 134,2 milhões da verba pública da saúde e da educação no estado da Paraíba.
Mesmo informados sobre a investigação contra a empresa, representantes do Fundo Nacional
de Desenvolvimento da Educação (FNDE), órgão vinculado ao ministério, responsáveis pela
contratação, decidiram manter o negócio.
Os kits são fornecidos pela empresa Brink Mobil, que possui um histórico de suspeitas de
irregularidades como desvio de dinheiro e corrupção no fornecimento de material escolar a
prefeituras e governos estaduais. Em dezembro de 2018, ela foi denunciada no Conselho
Administrativo de Defesa Econômica (Cade) por formação de cartel em licitações públicas,
acusada de fraudar licitações para compra de uniformes, mochilas e materiais escolares em
quatro Estados entre 2007 e 2012.
O ministro da Educação, Abraham Weintraub, fez uma série de vídeos sobre os kits escolares
vendidos pela Brink nesta semana. Nas filmagens, divulgadas pelas redes sociais, o ministro
pede a seus seguidores que pressionem prefeitos a buscarem ajuda de deputados federais a
fim de conseguir mais recursos para comprar o produto em seu município.
“Eu preciso da ajuda de vocês. Vocês têm que pedir para o prefeito de vocês se cadastrar no
FNDE, com a Karine (Silva dos Santos, atual presidente do fundo). Pedir para o seu deputado
destinar as emendas parlamentares para a gente poder mandar para todas as crianças do
Brasil”, afirma o ministro. Uma das postagens foi reproduzida na conta do presidente Jair
Bolsonaro no Instagram.
O contrato com a Brink, que pode chegar a R$ 406 milhões, foi assinado em novembro de
2019, quando a Operação Calvário, da PF, já estava em curso. A empresa é acusada de pagar
ao menos R$ 1,8 milhão em propina para obter contratos no governo de Ricardo Coutinho, na
Paraíba.
Segundo o jornal Estado de São Paulo o então presidente do FNDE, Rodrigo Sérgio Dias, foi
informado sobre as investigações da Polícia Federal envolvendo a empresa. Na ocasião, Dias
chegou a procurar o Cade para saber se haveria algum impedimento legal em contratar a
empresa. Em resposta, o conselho disse não ter competência para informar sobre eventuais
restrições, mas deu detalhes do processo em curso no órgão.
Na época de sua exoneração, Dias afirmou, em nota, que os responsáveis pela contratação da
Brink eram diretores indicados ao FNDE por Weintraub. “Eram pessoas de sua confiança.
Reforço que todo o processo ocorreu antes da minha posse”, disse o ex-presidente do órgão.
A modalidade de contratação é a chamada ata de preços, em que outras empresas também
são habilitadas a fornecer o produto. Funciona assim: o ministério faz o processo de licitação,
recebe as propostas e declara quais delas – e por qual preço – cada uma pode vender. Um
prefeito ou um governador interessado em comprar o mesmo kit para suas escolas não
precisa, então, abrir um novo certame, bastando apenas aderir à ata de preços da pasta para

fazer a contratação e receber o material. A Brink foi a primeira colocada na licitação e,
portanto, ficará com a maior parcela da distribuição de lotes. A estimativa do MEC é de que a
quantia que a empresa receberá poderá ultrapassar os R$ 406 milhões, a depender da procura
dos kits por parte das prefeituras. Segundo Weintraub, R$ 3,1 milhões já foram distribuídos.
PRISÃO
O dono da Brink Mobil, Valdemar Ábila, chegou a ser preso no fim do ano passado na segunda
fase da Operação Calvário, da Polícia Federal. No mesmo dia, os policiais também detiveram o
ex-governador Ricardo Coutinho. Os dois foram denunciados em dezembro pelo Ministério
Público da Paraíba, ao lado de outras 33 pessoas, que incluem agentes públicos, empresários e
operadores financeiros. Não houve condenação. A empresa do ramo educacional é acusada de
pagar propina correspondente a até 30% dos contratos que obtinha com o governo paraibano.
REINCIDÊNCIA
Esta não é a primeira vez que a empresa se envolve em suspeitas de irregularidades. O próprio
FNDE já havia contratado a Brink Mobil para fornecer material escolar para a prefeitura de
Madalena, no Ceará, em 2012. Segundo um relatório de auditoria da Controladoria-Geral da
União, de 2015, obtido pelo Estado, auditores do órgão visitaram as escolas do município e
não encontraram equipamentos. No relatório, o órgão de controle concluiu que “a aplicação
dos recursos federais não está adequada” e exigiram “providências de regularização por parte
dos gestores federais”.
Em nota, o Ministério da Educação (MEC) afirmou que o processo para a compra dos kits
respeitou a legislação em todas as fases. Segundo a pasta, na fase de habilitação, a empresa
Brink Mobil estava em condição regular e não tinha impedimentos legais para participar do
certame.
“Esclarecemos, ainda, que a empresa apresentou os atestados de capacidade técnica exigidos
no edital. Todos os processos licitatórios do FNDE são precedidos de pesquisa de mercado,
conforme prevê a legislação pertinente”, informou o ministério no comunicado.
Nos kits escolares comprados pelo Ministério da Educação, os estudantes encontram materiais
de uso diário, como lápis, caneta, borracha e cadernos.