Centenas de marinheiros a bordo do porta-aviões USS Theodore Roosevelt aplaudiram calorosamente no sábado (4) o capitão Brett Crozier quando ele desembarcou do navio pela última vez, após ser afastado do comando pela Marinha, por ter alertado sobre um surto de coronavírus a bordo e demandado a imediata transferência da maioria da tripulação para hotéis em Guam, para que ficassem em quarentena.

O video obtido pela CNN mostra uma grande multidão reunida para se despedir de Crozier, batendo palmas e cantando seu nome. 155 testaram positivo para a Covid-19, segundo o Pentágono.

Uma multidão de marinheiros saudou o capitão do porta-aviões afastado

Ao anunciar sua remoção, o secretário interino da Marinha, Thomas Modly, havia chamado o alerta de Crozier de “mau julgamento”.

Na carta que enviou aos altos mandos da Marinha, Crozier defendia seu plano de salvaguardar a tripulação e propunha que dez por cento dos marinheiros continuassem a bordo – “como um risco necessário” – para higienizar e proteger o navio enquanto ancorado. Guam é uma colônia dos EUA no Pacífico.

O plano agora imposto por Modly fará com que continuem a bordo o dobro do mínimo de tripulantes que Crozier apontara como necessários para manter o porta-aviões em segurança e operacional.

Na semana passada, o Pentágono confirmou que três marinheiros no Roosevelt haviam testado positivo, número que subiu para 25 dois dias depois, para pelo menos 70 na terça-feira e ultrapassou os 100 na quinta-feira. Ao que tudo indica, o contágio ocorreu durante uma escala em Da Nang, no Vietnã.

Na segunda-feira, um oficial de defesa dos EUA disse à CNN que um segundo porta-aviões dos EUA, o USS Ronald Reagan, estava também enfrentando um “punhado” de casos positivos.

O afastamento de Crozier veio logo depois de enviar memorando advertindo a Marinha de que era inadiável uma ação para salvaguardar a tripulação do navio.

“Não estamos em guerra. Os marinheiros não precisam morrer. Se não agirmos agora, estamos falhando em cuidar adequadamente do nosso bem mais confiável – nossos marinheiros”, dizia o alerta de Crozier.

Com o surto aumentando rapidamente, Crozier apelou ao comando da Marinha. “Remover a maioria do pessoal de um porta-aviões nuclear dos EUA e isolá-lo por duas semanas pode parecer uma medida extraordinária”, disse em seu memorando, mas é “um risco necessário”.

Como observou, era impossível, a bordo de um navio de guerra, manter as normas de distanciamento social exigidas em um caso de coronavírus. O que conduz à conclusão lógica de que o surto, se não enfrentado, iria se espalhar a bordo como fogo na pradaria seca.

O capitão também ressaltara que essa linha de ação era a que permitiria que mais rapidamente o porta-aviões e os aviões embarcados voltassem ao serviço, garantindo a “saúde e segurança” dos marinheiros.

O memorando vazou através do “San Francisco Chronicle”, e o secretário Modly ficou furibundo, acusando o capitão de ter criado “uma tempestade de fogo” ao divulgar amplamente, a 20 a 30 altos mandos da Marinha, sua carta. Embora haja acrescentado que não estava sugerindo que foi Crozier quem vazou o documento.

Os resultados iniciais de uma investigação preliminar da Marinha sobre as ações de Crozier devem ser entregues na segunda-feira, de acordo com um comunicado da Marinha.

O afastamento de Crozier levou um grupo de senadores democratas a escrever ao inspetor-geral interino do Pentágono, Glenn Fine, solicitando “uma investigação formal” sobre a resposta da Marinha aos relatórios do surto de covid-19 a bordo do USS Theodore Roosevelt e a decisão de retirar o capitão do comando do porta-aviões.

Eles também pediram a Fine que investigasse, dado o potencial para futuros surtos de covid-19 em outros navios e submarinos, se a Marinha “está implementando todas as medidas preventivas e práticas recomendadas apropriadas para proteger a segurança de nossa frota”.

No sábado, o presidente Trump saiu em defesa da decisão do Pentágono: “A carta era uma carta de cinco páginas de um capitão, e a carta estava em todo lugar. Isso não é apropriado”.

Trump acrescentou ter achado “terrível o que ele fez – escrever uma carta, quero dizer que isso não é uma aula de literatura, este é o capitão de um navio enorme que é movido a energia nuclear. E ele não deveria estar falando desse jeito. Ele poderia ligar e perguntar e sugerir”.

Trump ainda tentou jogar a culpa do surto sobre Crozier. “Ele parou no Vietnã, muitas pessoas saíram do barco, voltaram e tiveram infecções. E eu pensei que era inapropriado para o capitão de um navio … eu concordo 100% com a decisão deles”.

O provável candidato democrata à presidência, Joe Biden, considerou o afastamento do capitão do comando do USS Theodore Roosevelt como “quase criminoso”.

O ex-vice-presidente disse no “This Week” da ABC que o capitão Crozier “se levantou e disse o que tinha que ser dito” com seus marinheiros “em perigo” quando escreveu a carta.

“Acho que é quase criminosa a maneira como eles lidam com esse cara”, disse Biden. “Acho que ele deveria receber elogios em vez de ser demitido”, acrescentou.

De acordo com o New York Times, o próprio capitão Crozier testou positivo para o coronavírus.