Manuela D’Ávila fala em revogar teto dos gastos em entrevista à CMA
A pré-candidata do PCdoB à Presidência da República nas eleições deste ano, Manuela D’Ávila concedeu entrevista exclusiva à Agência CMA (informações de Mercado) e contou sobre a proposta de retomada de desenvolvimento do país. Adiantou que em 16 de abril vai lançar a síntese deste programa como um manifesto construído por várias mãos e que passa pelo tema de desenvolvimento nacional e áreas como políticas sociais, segurança etc, disse Manuela.
A revista frisou a promessa da pré-candidata comunista sobre reforma tributária progressiva, no âmbito econômico, e recuperar a capacidade de investimento do País. Ela fala também em revogar o teto dos gastos e revisar o fim da taxa de juros de longo prazo (TJLP), entre outras coisas.
“Se queremos a reinvenção do país, é tempo também de reinventar a política, de modo que as ideias transformadoras não fiquem sufocadas pela pouca exposição na TV e pelas velhas formas de marketing. Temos de utilizar instrumentos inovadores de diálogo que despertem nas pessoas a paixão pelo Brasil e reacendam o interesse pela participação política e social. Vivemos uma situação limite no Brasil e no mundo, uma enorme crise”, ressalta Manuela D’Ávila.
Leia abaixo a entrevista publicada com a pré-candidata do PCdoB à Presidência da República:
Agência CMA: Qual o seu plano de governo? Já tem nomes definidos para sua equipe?
Manuela D’Ávila: Nós estamos fazendo nosso plano de governo com a contribuição de diversas pessoas de várias áreas. Na sexta-feira, por exemplo, nós realizamos um seminário grande, sobre o desenvolvimento econômico, da indústria. (O tema) Passou por várias etapas, várias mesas… com um grupo de economistas e profissionais de outras áreas que têm relação com isso.
Nós temos um grupo muito grande que tem me ajudado a construir um programa de segurança também. É um grupo plural, bastante grande, com diversas pessoas que atuam em áreas distintas da segurança pública. Em 16 de abril, vamos lançar a síntese disso com um manifesto. Vai ser um manifesto que passa pelo tema de desenvolvimento nacional e áreas como políticas sociais, segurança etc.
CMA: O que você destacaria como o cerne de seu plano de governo?
Acho que o cerne não só do meu plano de governo, mas do próximo governo brasileiro será a retomada do crescimento econômico. Esse é um tema central para nós. Nós chamamos isso no PCdoB. Um projeto de desenvolvimento para o Brasil é um debate que é importante que seja feito.
Em torno do que vai se dar o debate nas próximas eleições do Brasil? Vai se dar em torno de um conjunto de ideias que dividam a maior parte do povo ou vai se dar buscando construir saídas reais para a crise que enfrentem temas como juros e o câmbio não servirem ao povo brasileiro. Para nós, o centro é o projeto de desenvolvimento que garanta a geração de emprego de qualidade, retomada da indústria e qual é a visão que os candidatos têm sobre o papel do Estado nesse projeto. Para nós, o papel do Estado é como condutor. Um papel central na condução disso.
Para garantir os direitos sociais e individuais, precisa retomar o crescimento da economia brasileira. Não existe como a gente enfrentar o tema da desigualdade entre mulheres e homens se a gente não retomar o crescimento no Brasil, por exemplo.
CMA: Parte desse desenvolvimento que você diz, principalmente segundo especialistas e membros da comunidade política, tem como elemento importante a redução do déficit previdenciário. A pauta da reforma da Previdência está inclusa nesse plano de desenvolvimento? Se sim, existe alguma alteração com relação ao texto elaborado pelo atual governo e qual seria a estratégia de diálogo com o Congresso em relação a este tema?
O debate sobre a Previdência pode ser feito pelo povo brasileiro diante de uma alteração da realidade que nós vivemos hoje. O Brasil tem uma das jornadas mais extensas de trabalho hoje. Com a reforma trabalhista, a tendência é que o trabalhador brasileiro trabalhe ainda mais e isso descontando o que são as longas jornadas de locomoção das trabalhadoras e trabalhadores dentro dos grandes centros urbanos.
Então, essa reforma que o Temer apresenta diante do que é a realidade real, e não essa realidade imaginada comparada com países europeus, do trabalhador brasileiro, é inadmissível.
Diante dessa realidade, essa reforma da Previdência é impensável. Nós podemos pensar, por exemplo, em debater com a sociedade, redução de jornada e aí, eventualmente, alteração no tempo de contribuição. Agora diante desse quadro de crise, com reforma trabalhista vigendo, com jornada intermitente de trabalho, sem os trabalhadores sequer garantirem as contribuições para a Previdência, aprovar essa reforma é acabar com a Previdência, o que faz parte mesmo desse projeto de governo de Temer e de seus comuns.
O objetivo real disso é a entrega da Previdência para o sistema financeiro. A combinação é nefasta, entende? Pensar no fim dos direitos trabalhistas com essa reforma junto é acabar com a perspectiva que sobra para eles se aposentarem mesmo.
CMA: Qual seria a estratégia de diálogo com o Congresso dentro de sua proposta de governo?
Mesmo nesse Congresso atual, Temer não conseguiu aprovar a reforma dele. Em que contexto eu serei eleita presidente da República? Apenas num contexto de ampla mobilização popular em torno de um projeto diferente do de Temer para o País. Nesse contexto, o Congresso também terá impactos, também sofrerá alterações. Eu acredito muito que a governabilidade se dá a partir do projeto.
Veja bem, esse mesmo Congresso, que foi Congresso de impeachment, da reforma trabalhista, foi o mesmo que garantiu a ampliação de investimento orçamentário para o ensino superior, que aprovou o fundo soberano para a educação, que garantiu a ampliação de (recursos do) Produto Interno Bruto (PIB) para a educação. Quando entende bem o projeto, também conseguimos realizar votações num sentido mais democrático e mais comprometido com o povo.
CMA: No seu governo haverá espaço para diálogo com a oposição?
Os meus acordos para governar serão programáticos. O meu programa é organizar uma frente ampla dos que produzem, dos que são interessados no trabalho produtivo. Chega de governos que ou são diretamente indicados por quem vive da especulação, ou não resistiram aos apelos desses.
Empresários produtivos e trabalhadores são ampla maioria na população – e a ampla maioria é interessada no desenvolvimento econômico e social, na geração de empregos de qualidade, na melhoria da educação e da saúde, no incentivo à inovação. Essa maioria me dará os votos no Congresso.
Se queremos a reinvenção do país, é tempo também de reinventar a política, de modo que as ideias transformadoras não fiquem sufocadas pela pouca exposição na TV e pelas velhas formas de marketing. Temos de utilizar instrumentos inovadores de diálogo que despertem nas pessoas a paixão pelo Brasil e reacendam o interesse pela participação política e social. Vivemos uma situação limite no Brasil e no mundo, uma enorme crise.
CMA: Ainda no aspecto econômico, qual seria seu plano para diminuir o déficit nas contas públicas?
O centro do nosso programa é retomar a capacidade do Estado numa reforma tributária progressiva. Então, de um lado, eu vejo que a reforma tributária tem esse sentido e, de outro lado, que a gente precisa compreender os investimentos públicos em políticas públicas e sociais que têm como
centro diminuição de desigualdade, como elementos de incremento da economia e, portanto, da diminuição do déficit.
Temos uma visão muito mecanicista de como superar o tema do déficit, olhando apenas para o ajuste de contas e não para a perspectiva de que é possível cobrar menos impostos dos que trabalham mais, dos mais pobres, e mais impostos sobre juros de dividendo, sobre as grandes estruturas, coisas que o Brasil não tributa e que as outras economias tributam, como é o caso da Inglaterra.
CMA: Nesse contexto, para essas estratégias orçamentárias, seu plano está levando em conta o atual teto de gastos?
Uma das propostas da nossa candidatura é o referendo revogatório da Emenda Constitucional 95 (que institui o teto de gastos). Só um governo que não é eleito, como o atual brasileiro, pode submeter a população como a nossa, que não tem políticas sociais suficientes, um país como o nosso, em que metade das mulheres quando têm filhos não conseguem voltar para os seus trabalhos, são demitidas, sobretudo pela ausência de estrutura do Estado, como são as escolas de educação infantil, as escolas de tempo integral (a isso). Somente um governo que não tem compromisso nenhum com o povo, pode achar que no Brasil é justo a Emenda Constitucional 95.
CMA: Como você avalia a flexibilização da regra de ouro e o que seria necessário para essa regra não ser descumprida?
O setor público brasileiro continua sofrendo com a recessão e, mais grave do que tudo, o governo segue agindo para aprofundá-la. Ao mesmo tempo em que as receitas tributárias se contraem – menos produção corresponde a menor renda e consequentemente a menor pagamento de tributos -, o governo insiste em cortar despesas públicas, especialmente aquelas chamadas de discricionárias, por exemplo, os investimentos públicos.
A solução de fundo é reduzir o volume dos juros pagos pela dívida, e criar condições com uma reforma tributária de recuperar a capacidade de investimento do Estado. Devemos debater na campanha eleitoral, a revisão da regra de ouro, de nossa constituição.
No entanto, se este governo, que carece de legitimidade, querer dar um cavalo de pau e realizar de forma improvisada uma revisão desta regra, isso poderá agravar a desestabilização financeira do país. Nós do PCdoB temos compromisso com o equilíbrio das contas públicas. Não há como um governo ser consequente em promover o desenvolvimento sem uma política fiscal equilibrada. Isto é possível de ser realizado sem cortar em investimentos sociais, aliás o Maranhão é um ótimo exemplo disto.
CMA: Em seu plano, qual a preocupação com relação à inflação?
Nossa política monetária não terá foco apenas em conter a inflação, mas também na geração de empregos, em outros pressupostos da economia. Será salutar para o nosso Banco Central desenvolver este duplo mandato. É algo que ocorre em vários países, como por exemplo, nos Estados Unidos onde o Federal Reserve (Fed, o banco central norte-americano), controla tanto a inflação como o nível de empregos. Por mais que a economia registre crescimento econômico positivo em 2017 e 2018, este crescimento não será sustentado, haja vista esses problemas estruturais que impedem o crescimento econômico sustentado de longo prazo na economia brasileira.
CMA: A atual política de juros é sustentável?
A redução da taxa Selic promovida pelo Banco Central vem sendo aparente. A queda abrupta da inflação foi realizada por uma forte recessão causada pelo próprio BC. O que o BC vem fazendo é reduzir a taxa nominal da Selic, a taxa real (taxa nominal descontada da inflação) continua ficando em torno de 4%, é muito alta quando comparada com os demais países.
Reduzir a taxa nominal como vem acontecendo, não é uma opção do BC. Ele vem sendo obrigado a fazer para recuperar a atrapalhada em que meteu o país em 2016, com seu arrocho monetário. O BC não pode parar de reduzir a taxa Selic de imediato, vem sendo pressionado para manter a queda, pois, do contrário, o juro real dos investidores cairá.
E mesmo assim não se mexeu na taxa que as instituições financeiras cobram no cartão de crédito e no cheque especial. A taxa média do cheque especial ficou em 324,7% ao ano no mês passado, 1,7 ponto percentual acima do verificado em dezembro do ano passado (323% ao ano). Já os juros médios das operações com cartão de crédito caíram e ficaram em 327,9% ao ano em janeiro. Em dezembro, estavam em 334,6% ao ano. Não se pode dizer que estamos em uma recuperação real. A recuperação que a dupla Temer e Meirelles alardeia não está assegurada. Os dados não são estáveis, é possível que a economia permaneça ainda estagnada.
CMA: Na sua opinião, o papel do BNDES precisa ser redefinido?
Vamos recuperar o BNDES como instrumento da política de desenvolvimento do Estado brasileiro. Uma das primeiras medidas que queremos adotar é a revisão do fim da taxa de juros de longo prazo (TJLP), a criação da Taxa de Longo Prazo (TLP) e a política de desidratação do “funding” do banco.
O setor privado já demonstrou que não tem interesse em financiar projetos de infraestrutura, pois são investimentos de longo prazo e de risco. O país necessita de um instrumento para realizar estes objetivos. A saída da crise é a criação de oportunidades de investimento.
Nos opomos aos intentos de criminalizar os funcionários do BNDES, bem como da reputação do banco. São quadros do serviço público brasileiro de grande valor, e que tem com seu empenho ajudado o país no seu desafio de superar suas disparidades.
CMA: Os últimos anos foram de turbulência no que diz respeito às denúncias de corrupção. Como você vê isso?
A corrupção é um problema gravíssimo e precisa ser combatida. Meu governo vai valorizar a transparência para diminuir os riscos de desvios, criaremos novos mecanismos de controle e garantiremos a participação social por meio de tecnologia de ponta que assegure ao cidadão a fiscalização
cotidiana da administração pública. Isso é importante para que haja melhoria da gestão e bom uso dos recursos orçamentários.
Se a população tiver meios de participar das decisões do governo, será um passo largo para a mudança cultural que julgo necessária. Por isso, defendo a criação do orçamento participativo nacional.
Por um lado, o Brasil avançou bastante nos últimos anos ao criar, no âmbito institucional, diversos mecanismos de transparência governamental nas três esferas de governo. Temos Controladorias, Ouvidorias, Corregedorias e outras instâncias que asseguram aos cidadãos o acesso às contas públicas e
aos gastos dos governos.
Por outro lado, a participação social na formulação de políticas públicas e na definição de prioridades orçamentárias ainda é limitada, o que afasta a sociedade do real controle sobre as ações governamentais e dos demais poderes da República. Eu defendo a ideia de um governo com “paredes de vidro”, com a combinação dessas duas pontas para que ocorra a transparência que a população deseja.
CMA: Como vê o decreto assinado por Temer, que institui a intervenção federal no RJ?
Defendo também que a segurança pública seja encarada como assunto central do governo federal, em conjunto com governadores e prefeitos dos grandes centros urbanos, num pacto para o desenvolvimento e a paz.
Defendo uma política pública nessa área que abarque a criação de um fundo nacional de segurança pública, adoção de piso salarial nacional para os policiais militares e civis, investimento em inteligência, reaparelhamento tecnológico e de gestão das polícias, constituição de uma autoridade nacional específica para esta gestão, implantação de corregedorias – onde não há – que fiscalize o trabalho das polícias para separar os bons dos maus agentes e estruturação de ouvidorias para garantir legitimidade às polícias perante a coletividade.
Também quero debater com a sociedade o problema de as nossas polícias não fazerem o ciclo completo da atuação policial – prevenção, repressão e investigações dos crimes -, como ocorre em quase todos os países.
CMA: Como você vê a troca de farpas entre os três Poderes? O que fazer para apaziguar a relação, sobretudo com o Judiciário?
Respeito à autonomia dos Poderes. As eleições devem servir para que o Brasil enfrente sua crise econômica e política.
CMA: Temer já falou publicamente em candidatar-se à reeleição e Meirelles é outro possível candidato. Como você vê a entrada desses dois nomes na corrida?
Acho que Meirelles, Temer, todos representam um projeto comum.